Brogan falava apaixonadamente... Disse que mesmo que se não soubesse de histórias as inventaria só para ter o prazer de contá-las... Acrescentou que se encantava com o interesse de Anne por sua falação.
O tempo passou tão rápido que Anne nem notou o adiantado da hora... Por volta das oito da noite, ele a levou a um restaurante italiano, onde jantaram pizza... A francesa sentia-se muito à vontade com o recém-conhecido. A informalidade de Brogan a atraia... Já se sentia familiarizada com o rapaz que cuidava de si sem se preocupar com esnobismos.
(...)
Na sequência Brogan mostrou mais de Chicago...
Assim, entraram num bar onde mulheres ficavam nuas enquanto dançavam ao som de
músicas... Num cabaré frequentado por negros ouviram jazz... Em outro bar que
lembrava um albergue ouviram mais música, e o escritor parecia conhecer todos
os músicos e frequentadores do lugar... Anne mais se encantava na medida em que
ele convidava os tipos à mesa onde estavam e pedia para falarem.A noite se encerrava e os dois seguiam pelas ruas até o metrô... Iam de braços dados e Anne não tinha palavras para agradecer a “melhor noite” que tivera na América... Brogan garantiu que havia muita coisa que ela devia conhecer... De sua parte, Anne concordou que precisaria voltar... O rapaz cobrou um reencontro dizendo que nem pensava em nunca mais revê-la.
Ao chegarem ao táxi, Brogan despediu-se com um beijo no rosto...
(...)
Já no trem, ao deixar Chicago, Anne abriu o romance
que, de fato, foi remetido ao hotel... Sua consciência indicava que algo não
estava bem resolvido, então não conseguia desenvolver leitura alguma... Pensava
sobre as horas em que estivera com Brogan e considerava que havia sido muito
bom conhecê-lo... Mas o que não lhe saia do pensamento era a despedida, e censurou-se
por permanecer excitada pelo episódio... Advertia-se por considerar que o “quase beijo” na despedida a
transtornou como se ainda fosse uma jovenzinha. Por outro lado sua imaginação não
definia a ideia de retornar para uma relação mais séria porque nova despedida
seria inevitável... Concluiu que o melhor que tinha a fazer era colocar “um
ponto final nas despesas”.
(...)
Anne prosseguiu em sua trip
pelos Estados Unidos... Decidiu que não deveria se aproximar demais das
pessoas, principalmente das que a entediavam... Com aquelas que lhe eram
agradáveis pôde discutir e beber durante as noites sem se envolver
sentimentalmente... Assim passava desapercebidamente por tipos, que não lhe
pediam conselhos... E nem ela mesma tinha necessidade de orientações, pois só
seguia aos próprios caprichos.Certa noite se embriagou tomando daiquiri numa casa em Nova Orleans... Após a extravagância, pegou um avião rumo à Florida... Alugou um carro em Lynchburg e durante oito dias percorreu sem compromissos as estradas do estado da Virginia... Novamente em Nova York, aceitou o convite dos Davies para uma temporada numa casa de campo em Hartford.
(...)
Anne descreve a casa de madeira, os membros da família e suas manias... “Myriam
esculpia, a filha tomava lições de dança, o filho escrevia poemas herméticos”...
Em particular, trata da primeira noite... Nancy (a filha) fez Ane vestir um
vestido mexicano, além de soltar-lhe os cabelos... Philipp (o filho) a admirava
e a elogiou por parecer mais jovem do que em Nova York... Dançou com ela até
altas horas da noite.Os dias que se seguiram foram assim... Anne se fazia jovial para agradar o rapaz, que já contava trinta anos. Ela entendia bem por que o moço se aproximava... Além de ser francesa, sua idade correspondia à de Myriam quando ele ainda era um adolescente... Philipp organizava reuniões para festejá-la, além de “tocar canções de vaqueiro” e levá-la para passear pelas “velhas aldeias puritanas”.
Na véspera de sua partida, Anne permaneceu por várias horas bebendo uísque com ele... O rapaz lamentou não ter se aproximado mais dela em Nova York para sair e se divertir... Ela respondeu que em dez dias estaria de volta à cidade e então Philipp sugeriu que lhe telefonasse para um encontro.
Ainda ouviram alguns discos e, antes que Anne se recolhesse ao quarto, o moço foi se despedir à sua porta e perguntou se ela não gostaria de beijá-lo... Foram interrompidos por Myriam, que ao longe pediu que o filho deixasse a visita em paz, já que Anne viajaria bem cedo.
A noite foi longa para Anne... Ela permaneceu acordada por um bom tempo junto à janela aberta e respirando a atmosfera do luar... Cogitava sobre Myriam e a via dormindo ou atenta ao quarto do filho...
Nada demais ocorreu.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2014/05/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto