terça-feira, 26 de maio de 2020

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – ideias de Hobbes e Locke e sua penetração entre os norte-americanos de fins do XVII e primeira metade do XVIII; Grotius e Locke, entendimentos diferentes em relação aos direitos e a questão do escravismo; Willian Blackstone e a ideia de que apenas os britânicos conservaram os direitos em sua cultura; de Boston, o advogado James Otis defendia que os colonos tinham o mesmo status jurídico dos britânicos; o acirramento em torno da defesa da emancipação política e a difusão das ideias de Burlamaqui, Grotius, Pufendorf e Locke entre os norte-americanos

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/05/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_23.html antes de ler esta postagem:

O texto faz referência aos dois mais conhecidos pensadores ingleses do século XVII e prossegue nas reflexões acerca das teorias do Direito (a versão particular e a versão universalista).
Obviamente os dois teóricos ingleses são Thomas Hobbes e John Locke, cujos textos eram divulgados na América do Norte e conhecidos dos estudiosos locais. É bem provável que as ideias de Locke tenham sido mais debatidas e divulgadas entre os colonos do que entre os britânicos da metrópole. Por sua vez, os princípios pregados por Hobbes foram bem menos impactantes para os norte-americanos porque ele preconizava “que os direitos naturais tinham de se render a uma autoridade absoluta a fim de impedir a “guerra de todos contra todos”.
(...)
Enquanto Grotius relacionava os direitos naturais “à vida, ao corpo, à liberdade e à honra”, John Locke os vinculava à “vida, liberdade e propriedade”. Notamos que Grotius suscitava questões contrárias à escravidão, ao passo que Locke, por dar ênfase à propriedade, não se opunha à mesma. Ele não só justificava a escravidão como propôs que todo homem livre de Carolina tivesse “poder e autoridade absolutos sobre seus escravos”. Segundo Locke, uma lei específica podia ser elaborada para garantir tal direito.
Apesar da grande circulação das ideias de Hobbes e Locke entre os ingleses (e por extensão aos americanos), a primeira metade do século XVIII foi marcada por produções textuais e discussões em torno dos direitos particulares, mais especificamente dos “ingleses nascidos livres”.
Durante a década de 1750 o jurista britânico Willian Blackstone refletiu sobre os motivos de os ingleses se aterem mais aos direitos particulares do que aos universais:

                   “Estas (liberdades naturais) eram outrora, quer por herança quer por aquisição, os direitos de toda a humanidade; mas, estando agora na maioria dos outros países do mundo mais ou menos degradados e destruídos, pode-se dizer que no presente eles continuam a ser, de um modo peculiar e enfático, os direitos do povo da Inglaterra”.

De acordo com Blackstone, os direitos haviam sido universais. Todavia apenas os seus conterrâneos ingleses, por serem “superiores” aos demais povos, conseguiam mantê-los.
(...)
A partir de 1760 nota-se que os que se debruçavam sobre a temática dos direitos começaram a colocar os “direitos universais” na pauta das discussões e reflexões.
Em 1764, o ativista político e advogado em Boston, James Otis, defendeu os direitos naturais dos colonos ao cravar que “a natureza colocou todos eles num estado de igualdade e liberdade perfeita”. Sem exclui-los dos direitos e obrigações como cidadãos do império britânico:

                   “Todo súdito britânico nascido no continente da América, ou em qualquer outro dos domínios britânicos, está autorizado pela lei de Deus e da Natureza, pela lei comum e pela lei do Parlamento (...) a usufruir de todos os direitos naturais, essenciais, inerentes e inseparáveis de nossos colegas súditos na Grã-Bretanha”.

Doze anos separam essas considerações (que colocavam os norte-americanos em pé de igualdade com os súditos ingleses) das ideias sobre os “direitos inalienáveis de todos os homens” que impulsionaram a independência de 1776.
Podemos dizer que as incompatibilidades entre as colônias e a Inglaterra levaram os norte-americanos a considerar que apenas as garantias dos “direitos dos ingleses nascidos livres” eram insuficientes para se estabelecer o país emancipado que passaram a almejar. Se houvesse uma acomodação em torno desses tais direitos, o máximo que obteriam seria “uma reforma, e não a independência”.
Fica evidente que a temática dos direitos universais embasava mais adequadamente a pretensão de emancipação política. Tanto é assim que as eleições norte-americanas das referidas décadas tiveram debates marcados por citações mais diretas de Burlamaqui, Grotius, Pufendorf e Locke.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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