terça-feira, 26 de maio de 2020

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – particularismo e universalismo se alternaram e se mesclaram no processo de luta pela independência norte-americana; fragmento de Burlamaqui a respeito da natureza do homem e das definições do direito natural; convenções estaduais anteriores ao 4/julho e as intenções emancipatórias; o exemplo da Constituição da Virgínia; importância do momento revolucionário para a discussão e declaração dos direitos

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/05/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_26.html antes de ler esta postagem:

Os debates políticos entre os norte-americanos que decidiam os rumos da nação nos anos 1760-1770 passaram a levar mais em consideração a ideia dos “direitos da humanidade”.
Além de as temáticas aprofundadas por Grotius, Pufendorf e Locke aparecerem com maior frequência nas publicações políticas, as estantes das bibliotecas públicas e privadas recebiam os livros de Burlamaqui em grandes quantidades. Talvez não seja por acaso que em 1774, quando o governo britânico começou a colapsar, os norte-americanos passassem a considerar que estivessem vivenciando situação diretamente relacionada a “estado de natureza” que conheciam das páginas de Burlamaqui:

                   “A ideia do Direito, e ainda mais a da lei natural, estão manifestadamente relacionadas com a natureza do homem. É portanto dessa própria natureza do homem, da sua constituição e da sua condição que devemos deduzir os princípio dessa ciência”.

O jurista suíço referia-se à “natureza do homem em geral”... Burlamaqui morreu em 1748 e, portanto, não tratou da condição dos colonos norte-americanos ou de suas inquietações em relação à Constituição inglesa. Sua temática se relacionava à “constituição e condição da humanidade universal”. Mas era exatamente a ideia universalista que permitia aos colonos imaginarem sua emancipação em relação à tradição e poder britânicos.
Ocorreram várias convenções estaduais antes da Declaração de 4/julho de 1776. Os colonos se articulavam regionalmente e projetavam substituir a autoridade britânica de governo por suas assembleias. Os delegados eleitos recebiam instruções para rascunhar Constituições que na prática indicavam a firme intenção de emancipação política. Essas “Constituições estaduais” normalmente “incluíam declarações de direitos”.
(...)
A título de exemplo, Lynn Hunt cita a Declaração de Direitos da Virgínia (12/6 de 1776) que já anunciava: “todos os homens são por natureza igualmente livres e independentes e têm certos direitos inerentes”. E esses direitos se definiam pela “fruição da vida e da liberdade, com os meios de adquirir e possuir propriedades e de buscar e obter felicidade e segurança”.
Essa mesma Constituição apontava vários outros direitos mais específicos (liberdade de imprensa; de opinião religiosa). O documento serviu de modelo para a Declaração de Independência e para a “Bill of Rights da Constituição dos Estados Unidos”.
De acordo com a autora, “os acontecimentos de 1774-6 fundiram temporariamente os pensamentos particularista e universalista sobre os direitos nas colônias insurgentes”. Quer dizer que eventualmente reagiam contra o governo britânico fazendo referências aos direitos que possuíam enquanto “súditos britânicos” e ao mesmo tempo reivindicavam o “direito universal” ao escancararem que apenas um governo legítimo poderia assegurar-lhes “seus direitos inalienáveis como homens iguais”.
Obviamente o “direito universal” anulava a expectativa particularista, pois atendia as demandas dos colonos em direção à independência política... A partir do embasamento teórico que haviam adquirido, sentiam-se comprometidos com a declaração dos direitos “como parte da transição de um estado de natureza de volta a um governo civil”... Ou ainda, deixariam a condição de submissão ao rei Jorge III para assumir a “nova política republicana”.
(...)
A resistência dos colonos à autoridade imperial levou-os a defender os direitos universalistas. Foi o momento revolucionário que criou as condições para que os direitos fossem declarados.
Lynn Hunt destaca que nem todos os atores concordavam sobre a necessidade de declararem os direitos ou sobre seus conteúdos fazerem parte da Declaração, mas lembra que “a independência abriu a porta para a declaração dos direitos”.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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