domingo, 24 de maio de 2020

“Rei do Congo – A mentira que virou folclore”, de José Ramos Tinhorão – chegada do Cristianismo a terras do Oriente pela pregação de São Tomás; o Oriente assimila o nestorianismo; lideranças políticas asiáticas e suas cruzadas pelo Cristianismo; primeiras referências escritas sobre o Preste João em relato do bispo Otto de Freisingen; narrativa do historiador Abul Faraj sobre o batismo de um líder keraita que se tornara Preste João em 1150

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/05/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_22.html antes de ler esta postagem:

A expansão do cristianismo pelo Oriente pode ser explicada a partir da atuação missionária de São Tomás... Oriundo do grupo dos doze apóstolos de Cristo, ele chegou à Índia e difundiu a doutrina, o que teria proporcionado a organização de várias comunidades e igrejas cristãs em áreas do sul daquele país. A partir da região do Malabar, o movimento atingiu Malipur (nas periferias da atual Madras).
O autor sustenta que ao tempo da condenação do Nestorianismo pelo Concílio de Éfeso em 431, houve muito boa recepção dos princípios considerados heréticos entre os cristãos do Oriente. Para muitos ocidentais este fenômeno adquiriu aura mítica e isso os atraía. Principalmente a ideia de que nas longínquas regiões (as chamadas Índias) teria se formado um reino cristão. Sem dúvida isso passou a compor o imaginário a respeito dos povos e terras orientais.
Para termos uma noção do anteriormente exposto, durante o século VIII, e mais precisamente em 789, correram notícias sobre uma homenagem e existência de um monumento* em honra a Nestorius pelos lados do Grão Cataio (o nome pelo qual se referiam à China)...

                   * A respeito da estela, o autor esclarece em nota que ela só foi encontrada em 1625 e desde então fizeram algumas cópias que, levadas para o Ocidente, foram parar nas mãos de colecionadores e museus. Consta que a original se encontra no Museu Beilin (Stele Forest), Xi’an, na China.

Desde o século II os ocidentais tinham acesso a narrativas de conversões em massa ao Cristianismo no Oriente... Desde aquela época imaginavam-se reinos distantes e fiéis a um líder cristianizado. No início do século XI falava-se que na região predominante nestoriana da Tartária, o chefe Khan-Khan (do persa “Khãgãn”; senhor; soberano) liderava keraitas e kara-kitais no avanço pela Ásia central disposto a “promover a fé cristã” pelas armas e “empunhando cruzes alçadas”.
No ano de 1122 o papa Calisto II admitiu um bispo do Ceilão em sua corte em Roma. O religioso vinha de antiga cidade (Malabar; como o Ceilão era chamado) convertida ao Cristianismo à época das pregações de São Tomás. Segundo ele, muitos senhores indianos locais assumiam a doutrina há muitas gerações.
(...)
Por volta de 1145 o bispo Otto de Freisingen (“irmão do imperador germânico Conrado III”) redigiu uma acrônica na qual citava o “fabuloso Preste João”.
De acordo com os registros, o bispo alemão ouvira falar do Preste João quando estivera em Roma e, na corte papal, conversara com o bispo de Laudiceia (Latakia ou Laodiceia; Síria), certo Gabal (ou Jabal). Este lhe teria dito que João era “rei e padre”, cristão nestoriano, e que vivia em terras do Extremo Oriente, para além da Pérsia e Armênia. Defendendo a fé cristã, entrou em combate contra os reis Samiardos da Meia (planalto do irã) e da Pérsia. Vencedor, conquistou Ecbatana, sua capital.
Ainda segundo Otto de Freisingen, o bispo sírio lhe teria contado que após a vitória sobre os persas, o Preste João (que gostava de ser chamado de Presbítero João) decidiu prosseguir com sua “cruzada” até Jerusalém. Só não o fez porque não teve como ultrapassar as congeladas águas do rio Tigre.
Essa narrativa conquistou mentes e corações do início do século XII... Não demorou e os ocidentais passaram a mitificar o Preste João. Na mesma época, o historiador Abul Faraj divulgava que, na região das montanhas da Pérsia, um líder turco de origem keraita se convertera e aceitara o batismo cristão celebrado por um religioso nestoriano que lhe fora enviado desde Merv (capital turco-seljúcida). As informações de Faraj davam conta de que o episódio se sucedera em 1150 e que o batizado passara a se chamar Preste João.
(...)
Muito mais se propagou sobre o Preste João durante o século XII.
Para a próxima postagem reservamos as considerações sobre uma carta de 1165 atribuída ao próprio Preste João. Muitas cópias manuscritas foram produzidas do documento que atiçou ainda mais a ansiedade dos europeus em torno da figura mítica.
Leia: Rei do Congo. Editora 34.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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