quinta-feira, 21 de maio de 2020

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – intenções das declarações de 1776 e de 1789; fragmento da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão sem qualquer referência ao rei; declaração de direitos para a posteridade; os direitos existiam no passado, não foram criados pelos declarantes, mas foram desrespeitados pelos governos; os novos governos deviam ser justificados pela garantia dos direitos universais; duas versões da linguagem dos direitos entre os norte-americanos no decorrer do século XVIII

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/05/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma.html antes de ler esta postagem:

A Declaração de 1776 não deixa dúvidas... O caráter diplomático e cuidadoso não vedava a sua principal motivação, ou seja, “as colônias estavam se declarando um Estado separado e igual e se apoderando de sua própria soberania”.
Somos levados a refletir também sobre a condição dos representantes franceses de 1789. Certamente eles ainda não se encontravam em condições ou prontos para rechaçar a soberania do monarca. Apesar disso, como informado anteriormente, estiveram bem perto de o fazê-lo, já que omitiram qualquer citação que fizesse referência ao rei na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão”:

                   “Os representantes do povo francês, reunidos em Assembleia Nacional e considerando que a ignorância, a negligência ou o menosprezo dos direitos do homem são as únicas causas dos males públicos e da corrupção governamental, resolveram apresentar numa declaração (a autora enfatiza o termo) solene os direitos naturais, inalienáveis e sagrados do homem”.

Vê-se que a Assembleia deixou claro que não desejava apresentar discursos ou projetos de leis sobre questões determinadas. Cravou que sua pretensão era maior, ou seja, havia redigido “para a posteridade que os direitos não fluíam de um acordo entre o governante e os cidadãos”... De modo algum eles resultavam de “petições ao monarca” ou se efetivariam a partir de “uma carta concedida por ele”.
(...)
Tanto no caso norte-americano como no caso dos franceses, os declarantes apresentavam-se como confirmadores de direitos que há muito existiam e que não podiam ser questionados por nenhum poder estabelecido. Colocando-se nesses termos, provocavam “uma revolução na soberania e criavam uma base inteiramente nova para o governo”.
A Declaração norte-americana acusava o rei Jorge III de ter desrespeitados os “direitos preexistentes dos colonos”. Isso justificava o rompimento e o estabelecimento de um governo independente:

                   “Sempre que qualquer Forma de Governo se torne destrutiva desses fins (assegurar os direitos), é Direito do Povo alterá-la ou aboli-la, e instituir novo Governo”.

Os representantes franceses afirmaram que os direitos haviam sido “ignorados, negligenciados ou desprezados”... Obviamente a sentença os exime de qualquer pretensão em relação à criação dos direitos, mas ressaltaram que a partir da Declaração os direitos deveriam “constituir o fundamento do governo”. Salienta-se que os direitos já existiam, mas eles não eram respeitados ou garantidos pelo governo no passado. Os deputados franceses colocavam-se como “defensores dos direitos” e inauguravam um novo juízo político: a partir de então, os governos seriam “justificados pela sua garantia dos direitos universais”.

(...)

A princípio, os norte-americanos não admitiram intenções de separarem os territórios coloniais do poder inglês. Pelo menos durante a década de 1760 não havia quem imaginasse que a reivindicação dos direitos os levasse a um “território tão novo”. Os mais cultos mudaram sua sensibilidade e debateram a respeito da tortura e dos cruéis castigos judiciais... Mas aconteceu que as circunstâncias políticas os levaram a uma noção de direitos mais radical.
Lynn Hunt esclarece que durante o século XVIII havia entre os norte-americanos “duas versões da linguagem dos direitos". Uma delas dizia respeito aos direitos de um povo e suas tradições em particular (versão particular; tradição nacional). A outra versão era universalista e dizia respeito aos “direitos do homem em geral”.
Os norte-americanos faziam uso de uma dessas linguagens, e eventualmente de ambas, de acordo com a circunstância. Mas sobre isso trataremos na próxima postagem relacionada ao livro.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas