quarta-feira, 27 de maio de 2020

“Rei do Congo – A mentira que virou folclore”, de José Ramos Tinhorão – carta apócrifa atribuída ao Preste João endereçada ao imperador bizantino Manuel I Commenus; conteúdo carregado de maravilhas e revelador de autoridade imensurável; carta de Alexandre III ao Preste João; pregação de Jacques de Vitry incentivando cruzada a Jerusalém e referindo-se ao apoio das tropas do Preste João; atuação do terrível Gêngis Khan na Tartária confunde os cristãos do Ocidente

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/05/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_24.html antes de ler esta postagem:

As muitas notícias a respeito do avanço do Cristianismo pela Ásia, sobre a existência do reino do Preste João e a possibilidade de derrotar os muçulmanos animavam os europeus desde pelo menos a época das cruzadas... Em 1165 uma carta atribuída ao próprio “sacerdote e rei” teve estrondosa repercussão. Tempos depois descobriu-se que se tratava de uma missiva apócrifa, todavia não foram poucos os que se apoiaram no documento e alimentaram a esperança de selar definitivamente a aliança que reuniria soldados cristãos do ocidente aos de Preste João.
Tinhorão esclarece que perto de cem cópias manuscritas foram produzidas e que algumas delas podem ser encontradas ainda hoje em bibliotecas de Munique, Paris, Viena e Londres.
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O “Presbítero João, pelo poder e virtude de Deus e do Senhor Jesus Cristo, Rei dos Reis” (era assim que o autor da carta se apresentava) endereçou sua mensagem a Manuel I Commenus, imperador bizantino que mantinha boas relações com o papa de Roma, Alexandre III.
Entre os europeus, Commenus gozava de boa consideração já que havia aceitado, em 1147 que as tropas cruzadas de Conrado III (Alemanha) e de Luiz VII (França) passassem por terras bizantinas e seguissem em direção à Terra Santa.
O autor da carta não poupava adjetivos na descrição de seu reino repleto de “maravilhas”. Apresentava-se como grande líder decidido a partir com seu grandioso exército rumo à conquista do Santo Sepulcro em Jerusalém. Em tom grandiloquente, anunciava que exercia poder sobre 72 outros monarcas que estavam espalhados por todas as regiões das Índias. Isso significava basicamente que o Preste João declarava que exercia poder sobre o “resto do mundo conhecido” pelos europeus. A uma ordem sua mobilizavam-se cerca de “10 mil cavaleiros nobres e 100 mil combatentes a pé”.
Certamente os que tomassem conhecimento do conteúdo da carta só podiam se encantar com o poderio do Preste João. Algo fabuloso e digno de ser reconhecido como soberano. Os registros da mensagem dão conta de que “sete reis, sessenta duques e 365 condes serviam em seu palácio”... À sua direita acomodavam-se doze arcebispos, e à esquerda dois bispos. À entrada de sua fortaleza havia grande espelho que lhe permitia vigiar os domínios e saber com antecedência da aproximação de inimigos.
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De início, o conteúdo da carta do Preste João provocou muita desconfiança, pois a narrativa era mesmo exagerada. Todavia os europeus estavam desesperados com o expansionismo muçulmano que, além da Ásia e África, atingiu a Península Ibérica. Não demorou e a Igreja Católica decidiu pronunciar-se oficialmente a respeito.
Documentos manuscritos do século XII dão conta de que o papa Alexandre III, provavelmente depois de ouvir relatos de certo nestoriano Felipe (que era seu médico particular), decidiu escrever ao “carissimo in Christo filio Johanni, illustro et magnifico indorum regis”...
Corria o ano de 1177 e o papa encaminhara a carta “ao magnífico rei das Índias” pelo próprio Felipe. O pontífice esperava que a gente mais ilustre do Preste João recebesse o seu médico particular. Acreditava que este era um profundo conhecedor das áreas de além da Abissínia, território pelo qual peregrinara e que estava polvilhado de cristãos nestorianos. Alexandre III tinha razão para assim pensar, pois sabia das peregrinações de seu médico e a dos cristãos da Abissínia rumo a Jerusalém, “onde possuíam capela e altar junto ao Santo Sepulcro”.
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Como sabemos, essa crença no Preste João perdurou durante muitos anos. Conta-se que em 1217, Jacques de Vitry, então bispo de São João de Acre (território na Palestina dominado pelos cruzados), pregou uma Cruzada contra os muçulmanos que ocupavam Jerusalém e asseverou aos cristãos europeus que:

                   “Os cristãos do Oriente, tão distantes quanto a terra de Preste João, têm muitos reis, que, ao saberem que a Cruzada chegou, virão ao seu auxílio”.

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No ano de 1221 falava-se de um guerreiro cristão que, com seu poderoso exército, estava conseguindo derrotar os “infiéis”. Dizia-se que ele atuava na Tartária, região da Ásia frequentada por russos, mongóis e turcomanos... Muitos acreditavam que se tratava de um neto do Preste João e que se chamava David.
Nada disso. Aquele que supunham ser um herói da cristandade na verdade era “o terrível fundador do império mongol dos bárbaros Termujim”. Sua fama correu o mundo antigo, seu nome era Gêngis (Ginghiz ou Ienghis) Khan.
Leia: Rei do Congo. Editora 34.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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