quarta-feira, 5 de janeiro de 2022

“1984”, de George Orwell - o “novo mundo” seria marcado por constantes perseguições políticas e massacre de sediciosos, os “rostos a serem pisados pelas botas do regime”; maior poder e despotismo, nenhuma tolerância; a atuação da “Fraternidade” e dos seguidores de Goldstein não cessarão; o aparelho de repressão seria sempre aperfeiçoado e atuante; O’Brien já lidava com Winston há sete anos e tinha a dizer que após a compreensão do que estava por vir, faltava a sua total integração ao “novo mundo” antes de ser executado; Winston refuta a ideia de imortalidade do Partido

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2022/01/1984-de-george-orwell-o-poder-se-exerce.html antes de ler esta postagem:

Falando a respeito do poder exercido pelo Partido e sobre o que se podia esperar do futuro, O’Brien voltou a se referir à alegoria que expôs anteriormente e repetiu que “o rosto sempre estará ali para ser pisado”. E, como não podia deixar de ser, este rosto seria o do “herege”, o ousado traidor que se dispusesse a se manifestar contra a sociedade. Tipos que, como Winston, seriam sempre “derrotados e humilhados”.
Disse ao rapaz que ele precisava saber que, ao cair nas mãos da repressão do Partido, os sediciosos sofreriam demais. Winston sabia isso por experiência própria e devia aceitar de uma vez por todas que o terror sobre os criminosos políticos pioraria sempre mais.
A espionagem promovida pelo Partido continuaria a se especializar. Desse modo, “os processos por traições, prisões, torturas, execuções e desaparecimentos” jamais deixariam de ocorrer. Este panorama completaria o mundo que estaria por vir, todo ele marcado pelo terror e triunfo, resultado da maior concentração de poder nas mãos do Partido: “e quanto mais poderoso, mais rígido o despotismo, maior a perseguição aos opositores e nula a tolerância”.
(...)
Algum desavisado poderia imaginar que conforme esse “estado de coisas” se configurasse não mais ocorreriam ações de agentes de Goldstein... O’Brien alertou que seria bem o contrário, e garantiu que elas seriam uma constante. Evidentemente seriam sempre derrotadas e ridicularizadas pelo regime, mas era certo que “sobreviveriam”. Não há como não observarmos que essa situação era das mais convenientes para o Partido. Tanto é que O’Brien deixou claro que “o drama que vinha representando com Winston”, que já durava sete anos (sete anos!), seria representado “inúmeras vezes, geração após geração, sempre em formas mais sutis”.
Isso significa que jamais deixariam de ocorrer as ações repressivas com os “ideocriminosos” completamente sujeitados aos mecanismos de tortura como os que Winston vinha sofrendo. Sempre haveria hereges supliciados por agentes como O’Brien, e eles seriam quebrados, gritariam desesperados até chegarem ao arrependimento completo, “salvos de si e rastejando aos pés dos torturadores por sua própria vontade”.
(...)
Um mundo sombrio se avizinhava... Tipos como Winston nada poderiam fazer para impedir:

                   “um mundo de vitória após vitória, de triunfo sobre triunfo sobre triunfo: infinda pressão, pressão, pressão sobre o nervo do poder”.

O’Brien fez questão de destacar essas palavras e na sequência dirigiu uma advertência ao preso político... Disse que pelo visto ele estava “percebendo” como seria o mundo dominado pelo IngSoc. Mas era certo que, “mais que compreender”, ele aceitaria, aclamaria e faria parte do “novo mundo”.
Winston esforçou-se física e mentalmente para conseguir falar. Arriscou exclamar que O’Brien e seus companheiros de Partido Interno não conseguiriam levar a cabo o projeto que acabava de ouvir. O que estava querendo dizer? O outro perguntou no mesmo instante e ele respondeu que a descrição toda só podia ser entendida enquanto um sonho improvável e impossível se realizar.
Ele teve de explicar melhor o seu juízo e falou que seria “impossível fundar uma civilização sobre o medo, ódio e crueldade”. Sua duração seria efêmera... A falta de vitalidade a levaria à extinção. É lógico que O’Brien não concordou e disse que o raciocínio do rapaz não passava de desbaratada tolice, e pelo visto levava em consideração a opinião “de que o ódio cansa mais que o amor” para atacar um projeto perfeito.
De qualquer modo, quis partir da premissa do debilitado detento e perguntou “que diferença faria” se realmente o ódio cansasse mais... Sugeriu que poderiam “acelerar o ritmo da vida humana” de modo a “gastá-la mais depressa” e, nesse caso, antecipar a senilidade para a idade de trinta anos. O’Brien perguntou se faria alguma diferença... O definhamento, a morte do indivíduo, em nada importava, já que “o Partido é imortal”.
Winston pensou que não devia ter dito nada... Como sempre ocorria, as palavras corretivas chegavam aos seus ouvidos como advertências que massacravam e o lembravam de que era impotente diante de seu algoz. Estava se arriscando, pois a alavanca do dispositivo podia ser movimentada a qualquer momento para provocar-lhe as dores dilacerantes.
Apesar disso, sentia que não devia se calar e, ainda que não conseguisse concatenar argumentos, resolveu dar uma resposta... Falou que também via pouca importância na defesa que O’Brien fez em relação ao enaltecimento da “imortalidade do Partido”. No fundo não sabia exatamente o que dizer, mas sentia que aquilo falharia de alguma maneira e então o modelo idealizado fatalmente seria derrotado.
Leia: “1984”. Companhia Editora Nacional.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas