terça-feira, 5 de janeiro de 2021

“Deus lhe pague”, peça de Joracy Camargo – esclarecendo o importante trabalho do secretário; registros sobre os que compareceram às celebrações noturna da igreja e a disponibilidade de cada um à doação; o velho mendigo havia sido operário comprometido com a produção e um projeto de vida; o início da dramatização da visita do patrão à casa de Juca

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/08/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_6.html antes de ler esta postagem:

O velho mendigo explicou que precisou contratar um secretário, um tipo esperto e sempre antenado aos acontecimentos da cidade e que se encarregava de ler os jornais. Dessa forma não lhe escapavam as principais datas e eventos mais importantes e concorridos da gente abastada. Deixou escapar que passava horas em sua biblioteca entretido com leituras de Upton Sinclair, Karl Marx e outros autores. Muitas vezes seu passatempo predileto era interrompido pelo zeloso secretário com suas relevantes informações e observações a respeito do perfil dos potenciais doadores de esmolas.
Barata observou que o companheiro era mesmo bem organizado... Este puxou um papel e pôs-se a ler as anotações do secretário a respeito dos que compareceram às celebrações noturnas da igreja: “234 pessoas de luto, sendo 183 senhoras”... Observou que a maioria estava há pouco tempo enlutada e que isso sempre proporcionava boas coletas. Prosseguiu com a leitura e informou que na igreja estavam ainda “86 solteironas; 18 comerciantes desesperados e prestes a falir; 96 noivos e namorados com as respectivas”... Emendou que as solteironas eram normalmente generosas com os mendigos, era só uma questão de saber pedir com “certo sorriso de bondade e malícia nos lábios”.
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Não havia como não concordar que o tal secretário parecia ser também psicólogo... A respeito dos comerciantes à beira da falência, o velho informou que eles sempre doavam esmolas por “medo da miséria”... Já os namorados costumavam dar maiores quantias (dois mil réis) do que os noivos (dez tostões). Para termos uma ideia, “um tostão” equivalia a cem réis, portanto, na conta do mendigo, os namorados eram duas vezes mais generosos do que os noivos... Talvez porque tivessem ainda que garantir um noivado promissor... Já os “pecadores em geral” davam apenas alguns níqueis aos miseráveis mendigos.
O homem teve ainda de explicar que não nasceu mendigo como Barata parecia estar concluindo... Ele disse que havia sido um trabalhador comum e que pelejava demais para sobreviver. Enquanto foi operário dedicou-se ao máximo e sujeitou-se às normas estabelecidas pelo patrão, todavia alimentou sonhos... Fez planos que se mostraram promissores e que provavelmente o levariam a uma vida de prosperidade material... Mas aconteceu que o prejudicaram. Acrescentou que sua maior tragédia havia ocorrido há vinte e cinco anos, e que estava disposto a contar tudo ao companheiro.
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Como se pode notar até aqui, o texto da peça traz várias falas que foram reproduzidas em “Dios se lo pague”, o filme. Na sequência veremos que o mendigo narrará a ao Barata a história sobre o seu entrevero com o patrão, que lhe roubou o projeto do espetacular invento.
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No palco, o cenário onde estão os dois mendigos é escurecido ao mesmo tempo em que em outro plano a iluminação passa a destacar a humilde casa do trabalhador de vinte e cinco anos atrás...
No cômodo estava Maria, a companheira de Juca (este é o nome do velho mendigo; Yuca, nos registro sobre “Dios se lo pague”)... O relógio aponta as oito horas da noite, quando um senhor (o patrão) bate à porta. O tipo tem ares importantes e Maria que se dedicava aos afazeres do dia-a-dia foi surpreendida pela visita. Logo que atendeu ao distinto senhor pôs-se a limpar as mãos no avental. O mesmo avental foi passado numa cadeira que Maria ofereceu para a visita.
Maria sequer perguntou quem era o tipo... Para ela, o fato de vestir-se bem indicava que se tratava de alguém importante. Não sabia se era educado perguntar, pois não conhecia os hábitos dos ricos. Ele fez algumas observações sobre a atitude de Maria e emendou que a educação é uma só, e que hábitos de ricos e pobres são os mesmos.
Obviamente o patrão viu que Maria era bem ingênua... Ela destacou que entre os pobres costuma-se cumprimentar com um aperto de mão. Ele estendeu a mão e cumprimentou-a com um “boa noite”.
Depois de se certificar com o próprio homem, Maria se sentiu à vontade para perguntar quem ele era. O tipo respondeu que era o diretor das fábricas onde o marido dela trabalhava. Ela não escondeu o seu encantamento e insistiu para que ele se sentasse.
Leia: “Deus lhe pague”. Ediouro.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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