sábado, 9 de janeiro de 2021

“Deus lhe pague”, peça de Joracy Camargo – o patrão explorou a ingenuidade de Maria e assim conseguiu sua cumplicidade e os segredos da invenção de Juca; uma ponta de preocupação a leva a questionar se agira corretamente; saber fingir e enganar em troca das promessas de uma vida repleta de prazeres materiais; Juca aparece no momento em que o salafrário patrão deixa sua casa

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/01/deus-lhe-pague-peca-de-joracy-camargo_7.html antes de ler esta postagem:

Como o patrão se concentrava-se nos papéis e não mais se dirigia à Maria, ela quebrou o silêncio perguntando-lhe se estava “lendo o segredo”. O tipo não negou, mas tratou de adiantar que era um “homem honrado”. Ela quis saber se ele lhe dava sua “palavra de honra”... Para confundi-la, respondeu que dava a sua palavra de que era honrado.
Na sequência ele devolveu-lhe o canudo de lata que, como sabemos, estava vazio... Devolveu também os papéis, cujas principais informações já sabia “de cabeça”.
(...)
Cinicamente, o patrão orientou-a a guardar tudo “direitinho e nunca mais mostrar a ninguém”. Maria lembrou que o marido sempre lhe dizia a mesma coisa ao sair de casa.
O embusteiro ainda teve a cara-de-pau de acrescentar que “por aí” há pessoas que não prestam. Disse também que ela não devia falar nada ao Juca sobre lhe ter mostrado o projeto.
Maria estava mesmo confusa e perguntou-lhe se achava que ela havia feito mal em mostrar-lhe os desenhos e o calhamaço de registros do marido... O tipo respondeu que não havia mal algum porque ele era “de confiança”. Ela sentiu-se aliviada ao mesmo tempo que implorou para que não contasse a ninguém sobre o que fizera.
O patrão sabia mentir e enganar bem, então fez um carinho no queixo da pobre mulher e garantiu que se algum dia o Juca brigasse com ela, certamente ela moraria num rico palácio e seria dona de belos vestidos e joias caríssimas, além de ter um automóvel exclusivo para os passeios que lhe aprouvesse.
De olhos arregalados, Maria quis saber se era verdade que ganharia mesmo tudo aquilo se Juca brigasse com ela. O salafrário não só confirmou como sentenciou que receberia muito mais. Ele mesmo lhe proporcionaria tudo o que desejasse!
(...)
O simplório raciocínio de Maria levou-a a concluir que não seria tão ruim se o marido se zangasse com ela. O patrão mal intencionado respondeu que era isso mesmo, todavia não era algo que ela podia provocar imediatamente. Explicou que era preciso saber fingir e tratar o Juca com muito carinho para que ele não desconfiasse de nada... A tola ainda perguntou se era daquela forma que as pessoas importantes costumam proceder.
O patrão adiantou-se a responder que não era daquele modo que as pessoas importantes agem, mas no momento o que interessava era obedecê-lo. E para isso, devia guardar os papéis e se comportar bem...
Foi isso que ela se pôs a fazer... Mostrou-se satisfeita porque imaginava mesmo que, seguindo os conselhos do cavalheiro, se tornaria importante...
(...)
O patrão decidiu se retirar, pois já não tinha o que fazer na humilde casa operária...
Aconteceu que quando chegou à porta topou com Juca em uniforme de operário.
O texto da dramatização esclarece que o Jovem Juca contava vinte e cinco anos quando esses episódios se deram em 1905... Portanto devemos concluir que o “tempo presente”, o do encontro dos mendigos na escadaria da igreja, ocorria em 1930... E que o velho mendigo contava cinquenta anos.
(...)
O patrão não esperava encontrá-lo, mas cumprimentou-o sem perder a pose. Juca respondeu ao “boa noite” e perguntou com o espanto o que significava aquela visita... O outro sorriu e respondeu que “quis ter a honra de ser o primeiro a abraçá-lo”.
Juca quis uma explicação e o patrão deu a entender que descobrira que seu empregado vinha trabalhando escondido até mais tarde. O jovem perguntou se aquilo era motivo de censura. Em tom de bajulação, o outro disse que sempre nutrira simpatia por ele.
O rapaz agradeceu... Aos poucos pôde perceber as intenções do patrão, que revelou já estar informado de que ele estava para se enriquecer em breve graças ao “invento do novo tear”.
Juca mostrou-se modesto ao manifestar que “a preguiça de operário cansado sugeriu-lhe um aparelhozinho”... Demonstrando que sabia mais do que dizia, o patrão sentenciou que o aparelhozinho faria o trabalho de cem homens.
Novamente espantado, Juca interrogou como o empresário podia saber daquele detalhe... Como que a justificar a informação e a minimizá-la, o tipo deu a entender que seu gerente já vinha lhe falando do invento.
Neste momento Maria retornou à sala. Nota-se claramente que se esforçava para demonstrar “ares de gente importante”.
Leia: “Deus lhe pague”. Ediouro.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas