segunda-feira, 18 de janeiro de 2021

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – mulheres não eram incluídas nas categorias das “minorias perseguidas”; sociedades machistas e a falsa ideia de impossibilidade de autonomia e voz política das mulheres; Condorcet e sua pauta humanista; referências a “categorias sociais” nos archives parlamentaires; fragmentos de editorial de Condorcet em defesa dos direitos às mulheres

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/01/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_15.html antes de ler esta postagem:

Não havia movimentação em torno da “questão das mulheres”... Lynn Hunt aponta que isso ocorria porque, apesar de oprimidas, elas não eram vistas como “minoria perseguida”. Protestantes e judeus, por exemplo, sofriam pressões para mudarem suas convicções religiosas. Isso não ocorria com as mulheres, ninguém pretendia que mudassem de “identidade”, até porque os socialmente bem colocados não admitiam críticas à estrutura.
É bem verdade que havia quem comparasse a sorte das mulheres à dos escravizados, mas normalmente essa analogia não tinha qualquer fim sedicioso. Além disso, devemos considerar que, diferentemente dos escravos, as mulheres possuíam alguns direitos.
A sociedade posicionava a mulher na qualidade de dependente dos homens (pais e maridos)... Defendia-se que  o sexo feminino não tinha condições morais ou intelectuais de exercer plena autonomia, daí a necessidade da “vigilância constante de supostas autoridades de todos os tipos”.
Não é correto dizer que “as mulheres eram incapazes” como vários segmentos queriam fazer crer. Do que foi exposto anteriormente, conclui-se que as limitações impostas são reveladoras do receio da sociedade machista de que elas exercessem a autonomia.
As mulheres se organizavam e se mobilizavam politicamente. A demonstração mais contundente foi sua atuação nos protestos conta o alto preço do pão “antes e durante a Revolução Francesa”. Apesar disso, ainda de acordo com a autora, não se pode dizer que elas constituíssem “uma categoria política claramente separada e distinguível antes da Revolução”.
(...)
Marie Jean Antoine Nicolas de Caritat, o Marquês de Condorcet, destacou-se por defender o direito das mulheres durante a Revolução Francesa. No decorrer da década de 1780 ele atuou ativamente pelas causas humanistas... Em 1781 redigiu panfleto em que defendia a abolição dos escravos. Foi autor também de uma lista de reivindicações que atendiam camponeses, protestantes, a “justiça criminal”, o livre comércio e a “vacinação contra a varíola”. Como se vê, os “direitos das mulheres” ainda não constavam de sua pauta.
Consta que um pequeno número de mulheres votou “por procuração” nas eleições para a formação dos Estados Gerais... Alguns poucos representantes se dispuseram a discutir sobre direitos às viúvas que fossem proprietárias. Achavam que uma legislação especial poderia garantir-lhes o direito de voto. Ou seja, para eles, “potencialmente”, uma parte das mulheres poderia obter direito à cidadania. Mas durante a Assembleia Nacional, desde a sua formação até a aprovação da Constituição de 1791, essa temática não foi oficialmente discutida.
Lynn Hunt cita os “Archives Parlamentaires” e esclarece que “mulheres” é termo que aparece em apenas dois casos... Num deles, mulheres bretãs solicitavam “autorização” para “fazer um juramento cívico”; em outro, mulheres da capital enviavam um discurso. A título de comparação, “judeus” aparece em pelo menos dezessete citações...
Como as postagens até aqui ressaltaram, ao final de 1789 vários deputados se mostraram dispostos a tratar de casos de “atores, carrascos, protestantes, judeus, negros livres e até homens pobres” e incluí-los na lista de cidadãos.
Como podemos notar, as “categorias” anteriormente citadas passaram por um processo de “conceptibilidade”. Ou seja, tornou-se “concebível” discutir e aprovar direitos a elas (essas categorias) ao passo que “direitos iguais para a classe feminina” continuaram improváveis e “inimagináveis”. Homens, e mulheres também, continuaram contrários à ideia de “direitos para todos (e todas)”.
(...)
Condorcet chamou a atenção dos franceses quando, no começo do segundo semestre de 1790, publicou um editorial em jornal considerando a defesa da extensão dos direitos às mulheres. O livro destaca pequenos trechos:

                   “Sobre a admissão das mulheres aos direitos da cidadania” (...) “os direitos dos homens resultam apenas do fato de que eles são seres sensíveis, capazes de adquirir ideias morais e de raciocinar sobre essas ideias.” (...) “como as mulheres têm as mesmas qualidades, elas têm necessariamente direitos iguais”.

                   “Ou nenhum indivíduo na humanidade tem direitos verdadeiros, ou todos têm os mesmos; e quem vota contra o direito de outro, qualquer que seja a sua religião, cor ou sexo, abjurou a partir desse momento os seus próprios direitos”.

Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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