quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

“A Guerra do Futebol”, de Ryszard Kapuscinski – o golpe de 19/06/1965; sobre Tahar Zbiri e Houari Boumédiène; de boatos e versões sobre o paradeiro de Ben Bella após a invasão à Villa Joly

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/12/a-guerra-do-futebol-de-ryszard_30.html antes de ler esta postagem:

O golpe contra Ben Bella tinha tudo para dar certo... Ele vivia sozinho na Villa Joly e, além dos hábitos simples que nutria, pode-se dizer que se tratava de um “tipo distraído”...
O comandante dos insurgentes, Houari Boumédiène, e o ministro Bouteflika, bem-articulados golpistas eram vizinhos de Ben Bella... O local onde o golpe havia sido tramado também ficava na região... Além do quartel-general havia os alojamentos militares...
No momento da troca da guarda, às duas da manhã, homens comandados por Tahar Zbiri (chefe do Estado-maior do Exército Popular da Argélia) tomaram o posto diante da casa do presidente. Com isso o golpe propriamente dito teve início.
(...)
Ben Bella e os personagens golpistas citados haviam participado ativamente da luta de independência...
É importante que se saiba que Zbiri, por exemplo, tinha sido comandante guerrilheiro na região da capital (Villa I)... Ficara conhecido por seu destemor e capacidade militar extraordinária.
Após a independência, os homens mais próximos a Boumédiène foram elevados a uma condição de preeminência... Esse não foi o caso de Zbiri, que ficou à margem da elite militar...
De acordo com Kapuscinski, era provável que Ben Bella desconfiasse que Boumédiène um dia lhe passasse a “rasteira”... Talvez por isso tenha escolhido Zbiri para chefe do Estado-maior... Talvez esperasse que ele o defendesse dos ataques ao seu comando.
Todavia Zbiri não só revelou-se golpista de primeira linha como comandou pessoalmente os oficiais que entraram na Villa Joly no dia 19 de junho... Na ocasião, o pessoal do Estado-maior trajava os “uniformes de campanha” e portava armas automáticas... A ocupação da Avenue Franklin Roosevelt dava conta de que o golpe seria mesmo bem sucedido... Tudo foi acertado para que Boumédiène* ocupasse o poder, o que de fato ocorreu.

                                                           * O golpe contra Ben Bella levou Boumédiène imediatamente à presidência do país. Seu mandato se iniciou no dia do golpe em 1965 e terminou em 27 de dezembro de 1978, data de seu falecimento.

Se Ben Bella tinha planos para o outrora companheiro de luta pela independência, tudo se esvaía no instante mesmo em que ele o enxergara no comando dos que empunhavam metralhadoras apontadas em sua direção. 
(...)
É claro o registro anterior tem muito de especulação de Kapuscinski... Mas é certo que ele mesmo possuía informações que obteve no contato com Ben Bella e seu staff num passado recente... Também há que se destacar que os episódios ocorridos na Argélia repercutiram imediatamente... Dessa forma, apesar de não terem ocorrido “pronunciamentos oficiais” imediatamente após o golpe, podemos dizer que “no calor da hora” muitas informações e versões puderam ser analisadas.
Ele mesmo esclarece que havia muitas contradições e especulações... Mas foi a partir delas que construiu um “panorama crítico” (suas conclusões, aliás, podem ser confrontadas com os episódios que marcaram os últimos cinquenta anos no país).
Imediatamente após o golpe algumas versões foram mais difundidas... Dizia-se Ben Bella tinha sido assassinado... Outros garantiam que ele estava ferido com gravidade ou muito adoentado. Muita gente acreditava que ele tinha sido preso e que havia sido encaminhado para um navio nas proximidades de Argel... Também podia estar sendo mantido prisioneiro no Saara...
Como podemos observar não foram poucas as hipóteses levantadas sobre o paradeiro de Ben Bella após a sua queda...
Aos poucos passaram a admitir que talvez ele fosse mantido na Villa Joly, o “local ideal” para os homens de Boumédiène mantê-lo sob vigilância...
Depois de algum tempo divulgaram a “versão oficial” que “dava conta” de que Ben Bella estava vivo, em território argelino e “bem tratado”.
Leia: A Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto 

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