Os três jornalistas hospedados no “Residence Equateur”, hotel em Stanleyville, foram despertados no início da manhã... Gritos pavorosos vindos da rua soaram como assombrações de pesadelo do qual queremos nos libertar a qualquer custo.
(...)
No
dia anterior souberam do brutal assassinato de Patrice Lumumba... A noite havia
sido muito agitada e as ruas se tornaram palco de violências.

Também
o “Equateur” foi invadido... Os tiras arrombaram as portas dos quartos e
começaram a arrancar europeus de seus interiores... Os brancos sofriam
espancamentos e eram conduzidos para um caminhão estacionado ali perto.
Estava
claro que os gendarmes tinham resolvido fazer justiça com as próprias mãos
perseguindo opositores políticos e brancos... Para eles, aquela “raça” era
culpada pela morte de Lumumba.
Kapuscinski
e os amigos jornalistas tchecos trataram de se vestir... Ao menos não seriam
capturados de pijama... Todavia estavam apavorados, pois pressentiam que o pior
estava para acontecer...
O
polonês achou espantoso notar a grande quantidade de pessoas que eram retiradas
do hotel marcado por rara movimentação... Apurou os ouvidos e assim teve noção
dos passos de botas militares percorrendo o corredor... Portas se abriam...
Ouviam-se gritos, pancadaria e corpos sendo arrastados.
(...)
Mas
aconteceu que os soldados não chegaram ao quarto onde Kapuscinski e Duszan
estavam... É que a porta do cômodo não dava para o corredor, mas para um
terraço no fundo da construção...
Aos
poucos o silêncio voltou a reinar no “Equateur”... Jarda, que utilizava outro
quarto, chegou com um rádio sintonizando a emissora local.
Os três ouviram que o governo insistia para que os
brancos deixassem a cidade imediatamente... Informaram que a frágil
administração não tinha como controlar “certos grupos militares”.
(...)
Kapuscinski e os
companheiros seguiram para o hall na esperança de obterem informações sobre a
situação... Não cogitavam deixar o país, pois não eram meros turistas... Faziam
questão de exercer o seu ofício.
Mas aconteceu que não
encontraram ninguém na recepção, gerência ou nas áreas comuns aos hóspedes...
Não havia o que
fazer...
Nem
mesmo podiam matar a sede...
Sentaram-se bem em frente à
porta de entrada, junto a umas mesinhas... Estavam em péssimas condições também
porque já fazia muito tempo que vinham se alimentando mal... Diariamente
dividiam cinco salsichas holandesas, e a isso se resumia sua refeição... O
estoque de latas estava no fim...
Enfraquecidos,
desesperançados, assustados e esfomeados, só podiam esperar...
(...)
Um veículo militar
estacionou em frente ao hotel... Jovens tipos fardados desceram armados com
metralhadoras e seguiram para o hall.
Kapuscinski não teve dúvida
de que aqueles tipos formavam um “esquadrão de extermínio”... Eles se
aproximaram encostando os canos das armas em suas cabeças.
Na sequência, o militar que parecia chefiar o
grupo se aproximou apressadamente... O polonês confessa que naquele momento
nada esperava além de seu trágico fim... Não conseguia mensurar o peso de seu
corpo, que parecia enrijecido e contar uma tonelada.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto