Com tantas postagens sobre os textos de Kapuscinski não há como não abrir espaço aqui para tratar de algumas questões polêmicas... Sobretudo as que o livro Kapuściński non-fiction tem suscitado.
(...)
É bom que se saiba que Kapuscinski não é unanimidade entre os analistas
de sua obra...
Uma biografia sua, Kapuściński non-fiction, foi lançada
pelo compatriota e também jornalista, Artur Domoslawski.
O livro ainda não saiu no Brasil... Mas já repercute.
Andam dizendo que Kapuscinski mentia, inventava personagens, era
ativista comunista colaborador dos serviços secretos da Polônia...
A polêmica é gigantesca também porque Kapuscinski, que
morreu em 2007, foi celebrado como “o jornalista do século XX”, inclusive fora
de seu país e do bloco socialista... A “biografia bombástica” está levando
muitos a reconsiderarem isso. Para alguns, a “revisão” coloca o autor de A Guerra do Futebol como exemplo do mau
jornalista...
Há quem tenha conhecido “o outro lado da História, a realidade africana
e da América Latina” a partir de textos de Kapuscinski... Não são poucos os que
passaram a chamar Domoslawski de traidor... Há processos contra ele na Polônia.
(...)
Os “pré-juízos” são tentadores e têm o poder de nos conduzir a
equívocos...

Em entrevista ao jornal português “Sol” e também ao site “Observador”,
Domoslawski deixa claro a sua intenção ao publicar a biografia e explica que,
no mínimo, precisamos contextualizar a época em que Kapuscinski atuou e levar
em consideração os limites impostos pelo regime comunista. Nesse sentido, a
biografia elucida o seu engajamento sem “demonizá-lo”.
Embora Artur Domoslawski
classifique a produção de Kapuscinski muito mais como Literatura, em nenhum
momento o considera “jornalista mentiroso”, como propagam por aí depois que a
biografia foi lançada. Os que assim procedem são, em sua maioria, desafetos de
longa data do biografado.
(acesse http://www.sol.pt/noticia/396698/artur-domoslawski--'n%C3%A3o-esperava-ser-tratado-como-um-traidor'#close e http://observador.pt/2015/05/13/artur-domoslawski-o-jornalismo-tem-uma-componente-de-traicao/ e tire suas conclusões).
(...)
Depois dessas
considerações, temos de refletir um pouco mais:

* Não vemos o autor com a
pretensão de produzir um relato totalmente baseado em documentação aceita como
“fonte primária”. Nos textos sobre Acra, a vida cotidiana de pessoas comuns é
narrada de modo informal... Vemos que “literatura e jornalismo” se misturam sem
prejudicar a reportagem.
* A citada polêmica e também a opinião de especialistas
que estão desqualificando Kapuscinski devem ser levadas em consideração... Mas será
correto colocá-las em preeminência desprezando os depoimentos do próprio Domoslawski?
(...)
Nossa sequência de registros sobre A
Guerra do Futebol reserva conteúdos muito interessantes (África do Sul e
Apartheid; Argélia e o processo de independência; América Latina...).
Eles não serão desprezados por conta da polêmica
aqui exposta. E não se trata de tomar partido por uma produção que estão
considerando “panfletária”! Trata-se de valorizar um conteúdo que não pode ser
desprezado... Pelo contrário! Ele possui riqueza de detalhes e “tem potencial”
para ser acrescentado a outros em estudos específicos... É por isso que deve
ser compartilhado.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto