quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

“Os Mandarins”, de Simone de Beauvoir – Samazelle e Lambert seguiram criticando a postura de Dubreuilh; para os moços importava salvar a independência de “L’Espoir”; o posicionamento de Lambert também se explicava por sua revolta com a morte do pai; sozinho, Henri pensa sobre o abalo de suas convicções em relação à URSS; o mal está em toda parte?

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/12/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir-o_11.html antes de ler esta postagem:

As reflexões de Henri acerca do depoimento de Peltov levou-o a certa angústia... É como se suas certezas em relação ao socialismo (enquanto alternativa para o estabelecimento da justiça entre os homens) tivessem sofrido um forte abalo... Ouviu a agitada discussão de Samazelle com Dubreuilh e, antes de se retirar, conseguiu sintetizar apenas que precisavam ter certeza de que as denúncias tinham um fundo de verdade...
(...)
Lambert e Samazelle seguiram com Henri... O primeiro disse que, em sua opinião, Dubreuilh só podia mesmo estar vendido, pois, do contrário, não pretenderia “abafar o caso”... Mas garantiu que dessa vez ele perderia a discussão... Samazelle disse que seria difícil isso ocorrer porque “o comitê o acompanha sempre”... Lambert disse que L’Espoir não tinha obrigação de obedecer ao SRL. Samazelle riu e respondeu que se tratava de uma questão mais grave, porém lembrou que se decidissem antecipar as denúncias ninguém poderia impedi-los.
Henri perguntou se o outro considerava que L’Espoir pudesse romper com o SRL... Para Samazelle, a ruptura era questão de uns dois meses, e ele desejava que L’Espoir sobrevivesse ao mesmo tempo que imaginava a extinção do SRL... O rapaz disse isso e despediu-se...
(...)
Henri permaneceu com Lambert no cais e disse que gostaria de saber dos propósitos de Samazelle... Lambert comentou que, se o que ele desejava era o retorno de L’Espoir à independência, dava-lhe razão...
Lambert não se esquecia da morte do pai, que para ele tratava-se de assassinato... Então, concluiu, era justo atacar os que se submetiam a Moscou (que restabelecia a escravidão ao mesmo tempo em que fundamentava os bandos que queriam fazer justiça com as próprias mãos ao perseguirem tipos como o senhor Lambert).
Henri lembrou a Lambert a sua promessa de permanecer fiel às convicções que os unira recentemente... O moço confirmou que assim seria, porém acrescentou que, se Dubreuilh persistisse com as manobras para “abafar o caso”, sairia do jornal e venderia suas cotas... Perron quis demovê-lo daquelas ideias dizendo que aquilo dava no mesmo que concordar com as opiniões preconcebidas do chefe... E devolveu aquele raciocínio afirmando que “deixar-se convencer sem provas” também significa manifestar opinião preconcebida...
Lambert não se conformava com a possibilidade de Henri concluir como totalmente inverídicas as informações e papéis apresentados por Peltov... Então perguntou se ele concordava que, “em sendo verdade”, deviam proclamar as denúncias... Evidentemente Henri respondeu que sim... O rapaz garantiu que partiria para a Alemanha e que lograria êxito em sua tarefa, pois não perderia tempo... Finalizou perguntando se gostaria que o deixasse em algum lugar...
(...)
Henri preferiu prosseguir caminhando... Poderia jantar com Paule...
Mas os depoimentos de Peltov não lhe saíam da cabeça... Aquilo havia sido um tremendo golpe... E certamente alguma coisa do que o dissidente dissera não era invenção... “Havia campos onde quinze milhões de trabalhadores estavam reduzidos à condição de subhomens”.
Isso à parte, Henri levava em consideração que foram esses campos que possibilitaram a derrota do nazismo... Persistia em seu pensamento a convicção de que a URSS representava “a única chance de um bilhão de subhomens deteriorando-se de fome na China e na Índia, a única chance de milhões de trabalhadores votados a um estado inumano”...
Essas reflexões pressionavam a consciência de Henri, que nunca imaginara a possibilidade de falha na via soviética... É claro que não era ingênuo a ponto de acreditar que não houvesse nenhum abuso da URSS. Ainda assim acreditava que “um dia o socialismo, o autêntico, aquele em que a justiça e a liberdade se reconciliassem, acabasse por triunfar na URSS e pela URSS”.
O abalo dessas “certezas” significaria uma existência política sem perspectivas... Ele mesmo constatava que a dúvida era-lhe um refúgio... Talvez fosse por covardia que não se aprofundasse nas análises das evidências... Ele que não se filiava ao comunismo, sofria por não posicionar-se “inteiramente a favor ou inteiramente contra”...
Afinal, o que havia de melhor (ou de menos agressivo) a se oferecer aos homens? Constatava o papel de relevância da URSS... Ou a revolução se faria por ela ou não se faria... Entretanto pesavam-lhe na consciência os fatos de o país ter substituído “um sistema de opressão por outro” e ter restabelecido a escravidão... O mal está em toda parte? Se assim é, não há saída possível! “Nem para a humanidade, nem para a gente”...
Henri sentou-se e “olhou estupidamente para a água que corria”.
(...)
É assim que a quinta parte de Os Mandarins chega ao fim... Em breve retomaremos o enredo, cujo foco passa a ser Anne e sua estadia nos Estados Unidos. Como sabemos, ela se deslocou para lá a fim de participar do Congresso de Psicanálise.
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas