terça-feira, 15 de novembro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – Tertuliano faz revelação parcial do estranho caso de “duplicação” do qual é parte; opiniões e instintos de mãe

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/11/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_15.html antes de ler esta postagem:

Voltemos ao Tertuliano...
Ele disse à mãe que descobrira certo tipo em tudo semelhante a ele próprio... Contou que havia se encontrado com o homem e que estava arrependido por isso... Explicou que diante do estranho chegou a duvidar da própria identidade. E emendou que nem mesmo dona Carolina seria capaz de identificar o filho entre os dois.
Dona Carolina garantiu que se a colocassem diante de dez semelhantes a ele certamente apontaria o verdadeiro Tertuliano. Era “instinto de mãe”. Conversaram um pouco sobre esse instinto... Dona Carolina acreditando que o pressentimento de mãe é dos mais intensos... Tertuliano o colocando em dúvida e questionando se há reciprocidade dos filhos em relação às mães.
Dona Carolina respondeu que não... E brincou que isso se dá porque “os filhos são todos uns ingratos”...
Ela quis saber se era esse o motivo de toda a sua preocupação... Tertuliano respondeu que ficara chocado com aquela história e que nos primeiros dias tivera uns pesadelos por causa dela. Por isso tornara-se obsessivo.
Mas então, como andavam as coisas depois de tudo? A mulher quis saber... Tertuliano disse que o Senso Comum o trouxera à razão... Disse que não tinha o menor sentido se aproximarem depois de tantos anos de existência sem se darem conta um do outro... Sequer poderiam ser amigos... A mãe completou que o mais provável seria se tornarem inimigos.
Tertuliano confessou que também pensara daquela forma... Mas garantiu que isso havia passado e sentia que tudo se tornara mera recordação, “um sonho mau que o tempo irá extinguindo pouco a pouco na memória”.
(...)
Tomarctus estava sempre por perto de dona Carolina... Tertuliano olhou-o e questionou sobre a reação do animal se diante dele se colocassem os dois “iguais”... Dona Carolina apostou que Tomarctus o reconheceria pelo cheiro... O professor respondeu que talvez fossem idênticos também neste quesito.
A mãe sentenciou que alguma diferença deveria haver... Arrematou que o filho não podia ter tanta certeza como fazia crer... Será que haviam se colocado nus diante de um espelho? Ela quis saber... Ele negou com um “evidentemente que não”...
(...)
Nem podemos dizer que ele mentiu porque, de fato, não havia um espelho no instante em que se colocaram pelados para compararem os traços mais íntimos.
(...)
Tomarctus espreguiçou-se e retirou-se do ambiente...
Dona Carolina quis saber se Tertuliano havia contado à Maria da Paz a respeito do sucedido com o tipo estranho e tão semelhante a ele...  A resposta foi negativa, e Tertuliano sustentou que com isso pretendia preservá-la de mais preocupações... Explicou também que, numa ocasião em que se mostrara apreensivo, havia lhe prometido entrar em detalhes com ela... Dona Carolina duvidou que isso ocorresse um dia... Ele respondeu que era melhor que as coisas permanecessem como haviam se acomodado.
Dona Carolina sentenciou que há determinadas situações em que o pior cenário é aquele em que somos tentados a deixar tudo como está... Tertuliano não concordou e disse que, de acordo com o seu pensamento, havia uma maior possibilidade de tudo ser esquecido.
A mãe provocou afirmando que se ele gostasse de Maria certamente teria contado tudo a ela... Tertuliano respondeu que gostava dela... Dona Carolina não objetou, mas alertou que ele não gostava o suficiente... E emendou que isso era um sinal de que talvez o rapaz estivesse confuso... Não se abria com a garota, então não teria como justificar os momentos que passavam juntos.
Ele entendeu que a mãe estava a defender uma rapariga que sequer conhecia... Dona Carolina respondeu que mesmo sem a ter visto sabia muito a respeito só pelo que lera nas cartas e ouvira nos telefonemas do filho.
O professor quis saber se isso já seria suficiente para concluir que Maria era o tipo ideal para ele. Dona Carolina provocou ao dizer que ele poderia questionar que suas palavras o colocassem como tipo ideal para a da Paz...
Ele respondeu com outra pergunta... A mãe acreditava nisso? Ela respondeu que talvez não fosse mesmo a pessoa certa para se casar com Maria... Neste ponto, o rapaz sentenciou que a solução seria colocar um termo à relação.
Dona Carolina nem concordou nem discordou... Ele continuou um tanto amargurado... Era preciso manter coerência... Se na opinião da velha, a garota era o tipo ideal para ele, mas ele não o era para ela, então não havia sentido em casarem.
De modo simplificado, dona Carolina respondeu que, no caso, ele parecia adormecido e, dessa forma, não teria como encontrar uma companheira com a qual pudesse despertar diariamente... Tertuliano disse que não andava a dormir, que não se tratava de um sonâmbulo e que tinha seus compromissos com o trabalho.
(...)
Dona Carolina ouviu as palavras do filho... Depois sentenciou que achava que desde o nascimento havia uma parte nele adormecida... Vaticinou que um dia seria obrigado a despertar violentamente...
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas