Então se acertaram!
Já era momento de se retirar... Os vencedores devem saber a ocasião mais apropriada... O tipo já se sentia tocando a mulher de Tertuliano. Apressou-se a deixar sobre a mesa as chaves de seu veículo e de sua casa... Também deixou os documentos pessoais... E mais! Por entender que Tertuliano tinha razão a respeito dos “pormenores” que as mulheres sempre reparam, deixou sua “aliança de casamento, um lenço com as suas iniciais, um pente de bolso”.
Trocaram informações a respeito de onde seus carros estavam estacionados... Ambos conheciam os veículos um do outro... Também Antônio Claro havia deixado o documento de seu carro no porta-luvas.
Tertuliano quis saber se ele não levaria a barba postiça com a qual havia chegado... Antônio respondeu que a barba ficaria... Afinal havia sido adquirida pelo professor...
Enfim estava pronto para se retirar... Partiria para o encontro com Maria perfeitamente identificado como Tertuliano, professor de História... Garantiu que retornaria na manhã seguinte com a mesma cara para recuperar suas roupas e demais pertences.
(...)
No derradeiro momento
Tertuliano e o “outro Tertuliano” se olharam mais uma vez.
O professor abriu a porta com todo cuidado... Não
queria despertar a vizinhança para uma visão assustadora.
O Máximo Afonso conduziu sua visita à área de saída... O “outro Tertuliano”
desceu a escadaria... O que um tinha a dizer ao outro fora dito... Era isso o
que pretendiam desde o encontro na casa de campo.
O fim da história parecia
se aproximar.
(...)
Tertuliano, o Máximo Afonso, fechou a porta que dava acesso aos “andares
inferiores”. Fez isso vagarosamente... Silenciosamente.
É Saramago quem diz que se Cassandra ali estivesse sentenciaria que “é precisamente
desta maneira que se baixa também a tampa de um caixão”.
Tertuliano estirou-se no sofá e fechou os olhos... Uma hora se passou...
Não dormiu... Parecia calcular o tempo de percurso de seu carro conduzido pelo
Antônio Claro... O tipo já devia estar na estrada com Maria.
Não havia como magoar-se
com ela... A imagem da amada se apagava em seus pensamentos... Pensou no
Antônio Claro, seu inimigo... Era certo que ele havia vencido a batalha... Mas
outra estava por começar.
A injustiça prevaleceria?
(...)
Conforme a tarde
caía, Tertuliano calculava o local onde seu veículo devia estar... Seguindo
pelo conhecido desvio, Antônio Claro evitava o povoado e poupava tempo. Logo
estaria diante de sua casa de campo.
(...)
Evidentemente o “outro Tertuliano” estava com as chaves do imóvel... Disse
à Maria que o proprietário era um antigo colega de escola. Não eram amigos que
trocavam confidências ou falavam de “assuntos particulares”, mas um confiava no
outro e por isso ele lhe emprestara a casa.
Antônio (“outro Tertuliano”)
disse que o proprietário não sabia que passariam a noite no local... Maria
estava encantada com tudo, principalmente com o comprometimento do amado em solidificar
cada vez mais a relação.
Ele a beijou e pediu para
aguardá-lo no veículo, pois queria conferir se estava tudo em ordem nos
interiores da casa... Evidentemente o tipo tratou de eliminar evidências que
podiam estragar seu plano... Entre essas, um quadro com o retrato dele com
Helena.
Ainda sentada no banco do passageiro, Maria
contemplou a paisagem do entardecer no campo (“o vale, a linha escura de
choupos e freixos que acompanha o leito do rio, os montes ao fundo, o sol que
quase já roça a lomba mais alta”)...
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/11/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_24.html
Leia: O
Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto