sexta-feira, 25 de março de 2016

“A Guerra do Futebol”, de Ryszard Kapuscinski – estrada da morte; ultrajado e embebido em benzol, um “milagre” evitou que o correspondente fosse queimado vivo; terceira barreira, e Kapuscinski arriscou ultrapassá-la a toda velocidade; em Idoroko, o auxílio policial

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/03/a-guerra-do-futebol-de-ryszard_30.html antes de ler esta postagem:

No segundo bloqueio imposto pelos rebeldes da UPGA aos que viajavam pela estrada que adentrava os territórios iorubas, Kapuscinski teve certeza que eles não estavam para brincadeiras... Eles haviam acabado de barbarizar dois viajantes e o encharcaram com líquido inflamável. Pareceu-lhe que não teria como escapar dessa vez.
Para piorar a sua situação, um tipo que parecia ser o “chefe da operação” decidiu esmurrá-lo. A essa altura o medo dominava completamente a sua consciência... Como sobreviver àquele massacre?
O ritual prosseguiu com as pontas de facas sendo aproximadas de seus olhos e coração.
De repente, completamente embriagado, o líder dos rebeldes apoderou-se do dinheiro que estava sendo disputados pelos seus comandados... Ele começou a esbravejar “Power! UPGA must get power! We want power! UPGA is power!”, e pôs-se a rir escandalosamente...
Isso contagiou aos demais.
(...)
Foi como um milagre...
Liberaram Kapuscinski...
À sua volta as pessoas gritavam a sigla do partido e levantavam as mãos com o “V” da vitória.
Transtornado, o correspondente voltou a rodar pela estrada... Mas apenas uns poucos quilômetros mais à frente avistou nova barreira incendiária...
Sem dinheiro e cheirando a benzol, passou a almejar apenas não ter de sofrer novas agressões.
Pensou que a única saída seria passar a toda velocidade pelos rebeldes... O Peugeot poderia pegar fogo, mas talvez isso fosse melhor do que padecer nas mãos dos impiedosos e intolerantes ativistas da UPGA.
Acelerou alucinadamente... Já próximo à barreira, atingiu 140 km/h... Buzinou para anunciar que não pararia... Notou que os tipos levantavam suas facas e sinalizavam para que freasse... Mas ele estava decidido a passar de qualquer jeito.
(...)
O temor e o desejo de se manter vivo impediram que ele parasse.
O choque foi inevitável... O carro saltou e arrastou madeiras incandescentes sob o chassi.
Mas a barreira foi ultrapassada e, no ponto em que o veículo se posicionou, as garrafas com gasolina não podiam atingi-lo... A gritaria ficou para trás.
(...)
Para ter certeza de que estava livre, Kapuscinski percorreu mais um quilômetro a fim de certificar se o Peugeot ainda tinha condições de prosseguir rodando.
O aspecto do veículo era lastimável, mas ainda podia ser dirigido... O repórter é que se sentia esgotado fisicamente... Sentou-se na areia à beira do caminho e viu-se encharcado de suor e do líquido inflamável...
Sem saber onde estava, não conseguia reunir forças para reagir...
Foi tomado por tremendo enjoo, Mas sabia que não podia esperar que o socorressem... Sabia que o mais provável era ser encontrado por outros rebeldes.
Retornou ao carro e dirigiu até Idoroko, uma cidadezinha...
Avistou um posto policial, onde permitiram que se lavasse e descansasse um pouco. Kapuscinski explicou aos tiras que precisava retornar para Lagos, mas não tinha condições de viajar sozinho. Sensibilizado, o comandante local montou uma equipe para escoltá-lo.
Acontece que os policiais também tinham medo de passar pela estrada.
Enquanto foram providenciar um veículo na cidade, o polonês passou o seu tempo a folhear um exemplar do “Nigerian Tribune”, periódico que pertencia à UPGA e reproduzia matérias sobre as ações do partido.
O conteúdo causava arrepios.
Na próxima postagem conheceremos um breve recorte.
Leia: A Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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