quarta-feira, 23 de março de 2016

“A Guerra do Futebol”, de Ryszard Kapuscinski – barreiras e incêndios na estrada rumo a Lagos; um pouco sobre os iorubas; UPGA x NNDP; tendências separatistas contra imposições do “governo central” nigeriano

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/03/a-guerra-do-futebol-de-ryszard_20.html antes de ler esta postagem:

Kapuscinski deixou Daomé para trás...
Ele refletiu sobre os países pelos quais passara no último mês (novembro). Registrou uma síntese dramática a respeito... Constatou que em quatro deles vigorava o Estado de Sítio... O quadro político era desanimador: presidentes haviam sofrido atentados ou tinham sido definitivamente depostos; militares intervinham e pressionavam lideranças civis que temiam sair de casa; dezenas de mortos em conflitos; quantidade exorbitante de presos políticos.
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A estrada que o levaria a Lagos estava repleta de barreiras e tropas que exigiam identificação e documentos variados.
Desde outubro de 1965 a Nigéria vinha sofrendo com uma guerra civil sem que houvesse expectativa de que algum dia terminaria... Mortes e incêndios de casas tinham se tornado eventos comuns no país, sobretudo em sua porção ocidental.
O seu caminho seria “pontilhado” por restos de veículos destruídos pelo fogo.
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A Nigéria respirava uma atmosfera de tensão e pólvora...
É preciso destacar que neste ponto Kapuscinski ainda não entra em maiores detalhes a respeito da organização política nigeriana dos primeiros anos após a sua independência... Por causa disso, os temas que seguem nesta postagem podem parecer confusos.
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Quinhentos e vinte quilômetros de estrada percorrida estavam controlados por soldados... O veículo que conduziu o polonês foi parado por 21 blitzes para revistas e indagações.
Em janeiro de 1966 o autor estava devidamente estabelecido em Lagos como correspondente de guerra... Sua missão exigia que ele se deslocasse aos locais de confronto...
Aos poucos ele deu conta de que as ruas da capital eram vigiadas permanentemente... E isso não era por acaso, já que os automóveis e outros veículos utilitários poderiam transportar secretamente armas de fogo em seus bagageiros ou em inocentes sacas de grãos.
Mas essa sensação de vigilância desaparecia conforme o correspondente se aproximava das áreas limítrofes de Lagos.
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Na direção das planícies que abriam caminho para o sudoeste do país, Kapuscinski esperava adentrar as terras iorubas, povo “cheio de deuses e de reis”...
A divindade ioruba mais importante é o deus Oduduwa, que habita para “muito além do sol”... Mas os reis estão espalhados pelas proximidades... Cada cidade ioruba tinha o seu rei...
“Nenhum outro país tem tantos reis” como os iorubas... E eles se orgulham por isso.
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Para termos uma ideia do que era o conflito que assolava o país, devemos levar em consideração alguns episódios políticos ocorridos em 1962, quando os iorubas se dividiram em duas agremiações políticas: uma majoritária, UPGA (United Progressive Grand Alliance); e outra minoritária, NNDP (Nigerian National Democratic Party).
O governo central entendia que os iorubas tinham tendências separatistas. Então fez de tudo para que o partido majoritário não assumisse o poder na província. Evidentemente se considerava que um partido frágil no comando da área ioruba tornaria a secessão menos provável.
Está claro que a UPGA fazia oposição ao governo central... A maioria dos iorubas se engajou em protestos e se mostrou disposta a lutar contra as manobras governistas. As eleições que ocorreram no segundo semestre de 1965 revelaram que a UPGA dificilmente seria derrotada. Mas aconteceu que o governo não levou em consideração o resultado das urnas e quis impor o NNDP.
Ocorreram protestos que desencadearam a desobediência civil... Os iorubas decidiram estabelecer um governo próprio e simplesmente desrespeitaram a decisão do governo central.
Leia: A Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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