Agora vemos uma paisagem marcada por “monumentos hostis” (Mirantes, cabanas e arames farpados)...
Diogo está com uma máscara daquelas utilizadas nos hospitais... O rapaz tinha o passo apressado, mas se deteve para observar “os monumentos, o povo e Peste”. Dirigiu-se ao coro e tece seus questionamentos.
(...)
Ele queria saber onde
estavam a Espanha e a Cádiz que conheciam... Aquele cenário só podia ser de outro
mundo... Não havia ambiente para a vida humana nessa nova realidade... Por que
todos emudeciam?
O coro respondeu que muito havia sido mudado. Outrora
havia um povo... Agora os viventes nada mais eram do que uma massa moldada pelo
sistema. Antes o povo era convidado; agora recebia convocações. Antes as
pessoas se relacionavam e trocavam pão e leite; agora eram “abastecidas”.
Podemos dizer que, simbolicamente, a vida se tornara automatizada e
regrada pelos papéis do regime de Peste... É o coro mesmo que afirma que “ninguém
pode nada por ninguém e que é preciso esperar”, cada um em seu lugar, na fila a
todos designada.
O povo não reagia... Os cidadãos não viam sentido nem
mesmo em gritar contra o estado de coisas... As belas mulheres de outrora (que faziam
seus esposos sofrerem de desejo) já não tinham “rostos de flor”.
(...)
Os membros do coro exclamam e pisoteiam...
A Espanha? Desapareceu!
O pisotear representa o sufocamento imposto pela administração de Peste.
O vento não sopra mais... As esperanças minguavam enquanto toda gente se
via mergulhada na asfixia.
(...)
A Peste pediu a Diogo que se
aproximasse...
Irradiações são ouvidas nas
proximidades... O ditador parecia convencido de que o jovem havia compreendido
que não podia se opor ao sistema.
O moço sentenciou que
todos ali eram inocentes... Peste soltou prolongada gargalhada. Será que o
corpulento governante entendia o que significa “inocência”?
Peste disse que não conhecia “inocência”. Diogo sugeriu que o ditador se
aproximasse para reconhecer que “o mais forte mata o mais fraco”.
Para Peste a proposta não
tinha cabimento... Manifestou que o mais forte ali era ele mesmo. Depois
ordenou a seus guardas que avançassem sobre o rapaz.
Diogo fugiu... Os guardas o seguiram enquanto Peste
anunciava que não podiam deixá-lo escapar... Os que fogem pertenciam ao
regime... Aquele insolente devia ser marcado!
(...)
A perseguição é dramatizada por gestos de mímica... Apitos e sirenes de
alarme enchem os ouvidos de todos.
(...)
É o coro que sintetiza o que se passava com Diogo,
conhecido de todos por sua inteligência e humanidade.
O rapaz sentia medo... Ele mesmo havia confessado... Corria apavorado...
O povo tinha atitude diferenciada e “prudente”... As pessoas se
sujeitaram ao poder estabelecido e estavam sendo “administradas”.
Resignação... Apenas isso... Os gritos estavam contidos. Eram os “gritos
dos corações separados”, aqueles que (no fundo) sabiam que os tinham apartado
do “mar sob o sol do meio-dia; do perfume da cana à tarde; dos braços frescos
das mulheres”.
Eis a condição imposta a todos: Passos vigiados e contados; horas e
atitudes regulamentadas... Listas e matrículas; muros e grades intermináveis...
Fuzis!
Timidamente o coro declarava
que os corações amargurados recusavam-se aceitar as imposições.
Recusavam também a fuga (de
Diogo) que presenciavam... Não há refúgio nas casas! O único refúgio é o mar!
Mas os muros
separavam mar e povo... Restava esperar (silenciosamente) que o vento voltasse
a soprar sobre a cidade e possibilitasse a respiração.
(...)
Peste insistia... Diogo devia ser marcado...
Também aqueles que faziam o coro, pois até o que não diziam podia ser ouvido
por ele... Suas bocas deviam se esmagadas... Deviam ser amordaçados até
aprenderem a pronunciar as palavras permitidas pelo regime, que eram as únicas
que podiam ser repetidas incessantemente por bons cidadãos...
ContinuaContinua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/10/estado-de-sitio-de-albert-camus-segundo_48.html
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Leia: Estado de Sítio. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto