quinta-feira, 20 de setembro de 2012

“A Moreninha”, de Joaquim Manuel Macedo – Série Reencontro – os quatro estudantes de medicina se divertem numa “conferência” em que discutem soluções para o caso do entorpecimento de Paula; retóricas repletas de "besteirol"

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/09/a-moreninha-de-joaquim-manuel-macedo_1569.html antes de ler esta postagem:

Foi geral a correria dos convivas em direção ao local onde Carolina havia gritado... Mas não era a moça quem passava mal... Ela foi encontrada aos prantos sobre Paula, que estava estirada sobre o assoalho... Paula era uma escrava que vivia na casa de dona Ana há muitos anos, inclusive servia de ama a Carolina desde o seu nascimento... A Moreninha tinha por ela afeto filial... Ao ver a outra desfalecida se desesperou e lançou-se sobre ela.
Aconteceu que Paula estava em seus afazeres quando foi convidada pelo alemão, o senhor Keblerc, para bebericar das garrafas de vinho que ele estava esvaziando desde cedo. Keblerc tinha organismo acostumado à bebedeira, mas esse não era o caso de Paula... E foi assim que, depois de virar vários copos, acabou se embriagando e perdendo os sentidos. O alemão saiu da sala sem dar conta do estado dela, que acabou ficando sozinha, sem ninguém que a amparasse... Por acaso, Carolina foi a primeira a ver sua estimada criada completamente desacordada.
Recolheram a mulher a um quarto e ao redor da cama as pessoas davam os mais variados palpites sobre o que deveria ter ocorrido. Uma das senhoras sugeriu que Paula despertaria se ingerisse vinho. E não é que despejaram grande quantidade de vinho à boca da infeliz? É claro que o tratamento não surtiu os resultados esperados... Os quatro estudantes se reuniram e logo perceberam que o mal estar de Paula não passava de um pileque... Foi então que Filipe, sabendo que não se tratava de nada muito grave, sugeriu aos amigos se divertirem com a situação. Reuniriam todos e apresentariam uma conferência... Cada um deveria dizer as maiores asneiras que conseguisse sobre o que estava acontecendo com a paciente. Os três concordaram... Então Filipe pediu a atenção de todos.
Os rapazes fingiram examinar minuciosamente a entorpecida... Verificaram pulso, rosto, olhos, língua... Movimentaram-se dando a entender que adotavam todos os procedimentos de costume. Com aparência bastante séria, os quatro foram vistos ainda numa interlocução aos cochichos... Então, a alta voz, Filipe comunicou a todos que concluíra que a enfermidade de Paula não era novidade, mas exótica... Tratava-se de “baquites”... Seguiu dizendo: “Éteres espasmódicos e engendrados no alambique intestinal (...). Daí, passando à garganta, perturbam a quimificação da hematose e acabam produzindo uma proctorragia nas glândulas de Meyer”... E falou mais: “O tratamento que proponho (...) algumas gotas de éter sulfúrico numa taça do líquido fontâneo açucarado. Cozimento dos frutos do coffea arábica torrados...”... Esbanjando retórica, o moço só comunicou “besteirol”, mas convenceu as pessoas presentes... Esse não foi privilégio dele apenas.
Depois foi a vez de Fabrício... De modo dramático iniciou com um “Sangue! Sangue! Sangue!”... Repudiou a medicina sanguinária, a “estercorária“ (!), ”sudorária”... Protestou ainda um “Desde Hipócrates, o maior charlatão de seu tempo...”... O certo é que depois de outra saraivada de “besteirol” em que procurava justificar que não concordava com o tratamento proposto por Filipe, Fabrício “concluiu” com um “mas devo combater o tratamento por ele oferecido. Penso, isso sim, que apenas a trilionésima parte de um quarto de grão de nihilitas nihilitatis...” (nadica de nada?).
Tanta bobagem havia sido dita que pensamos que não restaria mais a ser falado por Leopoldo e Augusto... O primeiro propôs um tratamento através do sonambulismo, afirmando que o magnetismo curaria a “baquites”... Augusto foi o que mais falou... E tanto falou que cansou... Sugeriu também alguma coisa em que o magnetismo implicaria resultados favoráveis e que o “escalda pés” resolveria o problema da enferma.
O final desse episódio em que os rapazes se divertiram às custas dos convivas (que pouco entenderam de suas confusas palavras) é marcado pela decisão de Carolina de deixar sua ama aos cuidados daquele que, em sua opinião, manifestou maior conhecimento: Augusto... Este saiu do quarto refletindo sobre o que mais contraria um médico: a “saúde alheia”; um “mau enfermeiro”; “senhoras curandeiras”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/09/a-moreninha-de-joaquim-manuel-macedo_24.html
Leia: A Moreninha. Série Reencontro – Literatura. Editora Scipione.

Um abraço,
Prof.Gilberto

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