Enquanto a noite se encerrava no casarão de d. Antônio, na instalação dos aventureiros ainda podiam ser ouvidas as vozes que tratavam da expedição... Trinta e seis estavam ao redor de uma grande mesa que não podia ser comparada à dos Mariz, porém há que se destacar que ali também havia fartura... Enquanto se refestelavam com carnes de caça, bebiam vinho de caju e de ananás... A embriaguez os animava, mas Loredano se destacava pelo silêncio...

Foi Martim Vaz quem notou que o escudeiro estava mais sério que o de costume... Gomes explicou que era obediente às ordens, e todos entenderam que era d. Antônio quem recomendava mais atenção na guarda do lugar... Bento Simões brincou, dizendo que estava farto de ter de atirar apenas em pacas e porcos-do-mato. Vasco Afonso quis saber, então, qual era a ação que os esperava... O outro respondeu que os índios proporcionariam aquela “folia”.
Este assunto despertou Loredano, que quis saber se Martim Vaz pensava que aquilo poderia ocorrer de fato. Este não deu resposta, mas brincou com o fato de a conversa a respeito de tiros e mortes ter despertado aquele que até então estivera amuado... A seriedade de Aires Gomes fez com que os tipos fossem se retirando cada um para o seu canto... Loredano fez um sinal a Rui Soeiro e a Bento Simões, e os três seguiram para o meio do terreiro... Ali, em meio à escuridão, o italiano disse-lhes apenas uma palavra: “amanhã”! Evidentemente os outros dois entenderam a mensagem, já que o deixaram no mesmo instante e seguiram seus rumos.
Depois disso, Loredano dirigiu-se à beira do precipício. Dali podia observar o quarto de Cecília... A moça tinha acabado de falar com Álvaro e, como sabemos, estivera ali pensando em Peri e na possibilidade de o amigo ter morrido, mas isso durou um breve tempo, pois o avistou em seu retorno à cabana...
Sabemos que Peri chegava depois de dois dias de ausência... Devemos saber também o quanto ele se dedicava aos caprichos de sua senhora. Ele também sentia muita falta dela, e o seu desejo naquele momento era o de vê-la o quanto antes... Sem que ela soubesse, lá estava o índio saltando de um galho a outro... E foi com extrema agilidade que ele posicionou-se numa folhagem de árvore, tornando-se camuflado por ela... Dali ele conseguiu contemplar a doce Cecília a examinar as encomendas que haviam chegado do Rio de Janeiro... Peri notou a felicidade de sua querida amiga... Entristecido pensou que os agrados que podia proporcionar-lhe eram aqueles que a natureza exuberante oferecia... Havia trazido a onça viva...
O pretendente Álvaro só tinha pensamento para a filha de d. Antônio e não se conformava com o desprezo manifestado por ela. O moço tomou a decisão de colocar a lembrança que trouxe para ela em uma bolsa de seda. E resolveu que correria o risco de deixar o seu presente na janela de Cecília ainda naquela noite.
Então, enquanto Cecília recolhia-se para o descanso de seu sono, notamos esses três homens, cada um num ponto da mata, a focarem a “janela frouxamente iluminada” e a pensar unicamente nela. Sem dúvida, o intento de Álvaro era dos mais arriscados.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/07/o-guarani-de-jose-de-alencar-em-meio.html
Leia: O guarani. Editora Ática
Um abraço,
Prof.Gilberto