sexta-feira, 8 de março de 2013

“Decamerão”, de Giovanni Boccaccio – Segunda novela do primeiro dia – contada por Neífile – a história dos dois amigos, Giannotto e Abraão; suas conversas sobre religião; Giannotto e sua insistência em converter o judeu; viagem a Roma e a constatação da decadência moral dos clérigos; o surpreendente final da história

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/decamerao-de-giovanni-boccaccio_5.html antes de ler esta postagem:

A narrativa de Pânfilo foi ouvida com atenção, provocou risos em alguns momentos, e foi comentada por todos...
A segunda novela do dia coube a Neífile, que era quem se encontrava sentada ao lado de Pânfilo. Ela iniciou falando sobre os ensinamentos percebidos na novela anterior... Salientou que a bondade divina é caracterizada por perdoar os nossos pecados, ainda que nos afastemos dos preceitos religiosos... Disse que sua narrativa demonstraria o quanto a benevolência do criador é grande (apesar de notarmos as falhas das autoridades religiosas na Terra, esses que deveriam representá-Lo em nosso meio e testemunhar com palavras e obras)... Neífile destacou que os de seu grupo, sem esperar atitudes exemplares dos clérigos, deveriam permanecer firmes na fé e redobrar o ânimo.
Ela prosseguiu contando sobre um comerciante de tecidos, Giannotto di Civigni, de Paris... Era amigo de um comerciante judeu chamado Abraão... Os dois costumavam debater a respeito das coisas da religião, e cada um defendia a própria como ideal... Giannotto argumentava que o Judaísmo “apresentava muitas falhas”, enquanto que a “religião de Cristo” prosperava, crescia... De tal forma o Judaísmo declinava que, em sua opinião, desapareceria.
Abraão disse ao amigo que, enquanto vivesse, desejava permanecer em sua fé... Mas notava que a dedicação do outro em sua “cruzada pela sua conversão” era digna de consideração e elogios.
Tanto Giannotto insistiu que Abraão revelou-lhe o interesse de visitar Roma para conhecer os costumes do papa e dos cardeais... Deixou claro que, se notasse naquelas autoridades o mesmo empenho do amigo, iria se converter... Caso contrário continuaria judeu...
O que podia ser uma notícia para empolgar o espírito do devotado cristão, acabou causando-lhe um profundo desânimo... Giannotto concluiu que havia perdido todo o seu trabalho. Imaginava que o judeu já estava praticamente convertido, mas o outro saiu com essa ideia de visitar Roma! Então decidiu que precisava demovê-lo de seu intento porque era certo que, ao entrar em contato com a corte do Vaticano, saberia da vida desregrada de muitos clérigos, da “vida celerada e imunda dos sacerdotes”... Não há irreverência do autor nessas últimas palavras (várias crônicas deploravam a corrupção na sede do catolicismo; em nota, o livro cita Petrarca).
Não havia dúvida, se Abraão já fosse batizado e visitasse Roma, desejaria voltar a ser judeu... Então Giannottto argumentou com o amigo que aquela viagem seria cansativa e dispendiosa... Disse que a ida a Roma era desnecessária... Podia ser batizado ali mesmo na França... Numa outra ocasião ele próprio o acompanharia... Mas o resoluto Abraão confirmou que a condição para a sua conversão era a viagem para uma vivência mais próxima das autoridades eclesiais. Giannotto lamentou, mas desejou que o amigo fosse feliz em sua viagem... No íntimo tinha certeza de que suas preocupações se confirmariam.
O judeu chegou ao seu destino e foi recebido pelos correligionários israelitas... Sem revelar suas intenções, permaneceu a observar o cotidiano e as atitudes do papa, dos cardeais, religiosos diversos e da corte como um todo... Concluiu que todos ali cometiam o pecado da luxúria... Atos de sodomia eram praticados sem constrangimento... Prostitutas e afeminados circulavam livremente e exerciam sua influência... Não foram poucas as vezes que notou os religiosos católicos comendo e bebendo desmedidamente... Viu que muitos eram avarentos e negociavam sem escrúpulos objetos sagrados...
É claro que tudo o que viu desagradou imensamente o nosso Abraão, um tipo sóbrio, modesto, comedido... Então, considerando que já vira o suficiente, resolveu retornar para Paris... É claro que o amigo cristão o aguardava ansiosamente... Abraão confirmou-lhe que não vira nada que se relacionasse a santidade ou devoção entre as pessoas do clero... Falou que, em vez de ambientes devotados a Deus, viu pessoas cometendo os piores atos, que só podiam agradar ao diabo... Concluiu que, em vez de os líderes católicos sustentarem a religião de Cristo, pareciam fazer de tudo para eliminá-la...
Surpreendentemente, Abraão completou suas impressões dizendo que acreditava que o contrário deveria ocorrer... Quer dizer, apesar de toda má conduta da corte papal, em sua opinião a Igreja se expandiria, sua religião cresceria e se tornaria mais “luminosa e brilhante”...
Giannotto ficava cada vez mais impressionado com o amigo... O clímax de sua revelação foi afirmar que considerou que o sustentáculo da igreja romana só podia ser o Espírito Santo e, assim sendo, possui a doutrina da religião “mais certa e santa”... Abraão assegurou-lhe que pretendia seguir com ele até uma igreja para se batizar naquele momento mesmo.
Giannotto ficou maravilhado... Sentiu-se o cristão mais feliz do mundo, e seguiu com o amigo para a igreja Nossa Senhora de Paris... Solicitou o batismo aos padres, conduziu Abraão à pia batismal e deu-lhe o nome de João... O tempo que se seguiu foi de doutrinação na fé... Passou o resto de sua vida como homem bondoso e digno.
Neífile deu por encerrada a sua novela, que foi muito louvada por todos.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/decamerao-de-giovanni-boccaccio_11.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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