Talvez
seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/decamerao-de-giovanni-boccaccio_5.html antes de ler esta
postagem:
A narrativa de Pânfilo foi ouvida com atenção,
provocou risos em alguns momentos, e foi comentada por todos...
A segunda novela do dia
coube a Neífile, que era quem se encontrava sentada ao lado de Pânfilo. Ela
iniciou falando sobre os ensinamentos percebidos na novela anterior...
Salientou que a bondade divina é caracterizada por perdoar os nossos pecados,
ainda que nos afastemos dos preceitos religiosos... Disse que sua narrativa
demonstraria o quanto a benevolência do criador é grande (apesar de notarmos as
falhas das autoridades religiosas na Terra, esses que deveriam representá-Lo em
nosso meio e testemunhar com palavras e obras)... Neífile destacou que os de seu
grupo, sem esperar atitudes exemplares dos clérigos, deveriam permanecer firmes na fé e redobrar o ânimo.
Ela prosseguiu contando sobre um comerciante de tecidos, Giannotto di
Civigni, de Paris... Era amigo de um comerciante judeu chamado Abraão... Os
dois costumavam debater a respeito das coisas da religião, e cada um defendia a
própria como ideal... Giannotto argumentava que o Judaísmo “apresentava muitas
falhas”, enquanto que a “religião de Cristo” prosperava, crescia... De tal
forma o Judaísmo declinava que, em sua opinião, desapareceria.
Abraão disse ao amigo que,
enquanto vivesse, desejava permanecer em sua fé... Mas notava que a dedicação
do outro em sua “cruzada pela sua conversão” era digna de consideração e
elogios.
Tanto Giannotto insistiu
que Abraão revelou-lhe o interesse de visitar Roma para conhecer os costumes do
papa e dos cardeais... Deixou claro que, se notasse naquelas autoridades o
mesmo empenho do amigo, iria se converter... Caso contrário continuaria
judeu...
O que podia ser uma
notícia para empolgar o espírito do devotado cristão, acabou causando-lhe um
profundo desânimo... Giannotto concluiu que havia perdido todo o seu trabalho.
Imaginava que o judeu já estava praticamente convertido, mas o outro saiu com
essa ideia de visitar Roma! Então decidiu que precisava demovê-lo de seu
intento porque era certo que, ao entrar em contato com a corte do Vaticano,
saberia da vida desregrada de muitos clérigos, da “vida celerada e imunda dos
sacerdotes”... Não há irreverência do autor nessas últimas palavras (várias
crônicas deploravam a corrupção na sede do catolicismo; em nota, o livro cita
Petrarca).
Não havia dúvida, se Abraão
já fosse batizado e visitasse Roma, desejaria voltar a ser judeu... Então Giannottto argumentou
com o amigo que aquela viagem seria cansativa e dispendiosa... Disse que a ida
a Roma era desnecessária... Podia ser batizado ali mesmo na França... Numa
outra ocasião ele próprio o acompanharia... Mas o resoluto Abraão confirmou que
a condição para a sua conversão era a viagem para uma vivência mais próxima das
autoridades eclesiais. Giannotto lamentou, mas desejou que o amigo fosse feliz
em sua viagem... No íntimo tinha certeza de que suas preocupações se confirmariam.
O judeu chegou ao seu
destino e foi recebido pelos correligionários israelitas... Sem revelar suas intenções,
permaneceu a observar o cotidiano e as atitudes do papa, dos cardeais,
religiosos diversos e da corte como um todo... Concluiu que todos ali cometiam
o pecado da luxúria... Atos de sodomia eram praticados sem constrangimento...
Prostitutas e afeminados circulavam livremente e exerciam sua influência... Não
foram poucas as vezes que notou os religiosos católicos comendo e bebendo
desmedidamente... Viu que muitos eram avarentos e negociavam sem escrúpulos
objetos sagrados...
É claro que tudo o que viu
desagradou imensamente o nosso Abraão, um tipo sóbrio, modesto, comedido...
Então, considerando que já vira o suficiente, resolveu retornar para Paris... É
claro que o amigo cristão o aguardava ansiosamente... Abraão confirmou-lhe que
não vira nada que se relacionasse a santidade ou devoção entre as pessoas do
clero... Falou que, em vez de ambientes devotados a Deus, viu pessoas cometendo
os piores atos, que só podiam agradar ao diabo... Concluiu que, em vez de os
líderes católicos sustentarem a religião de Cristo, pareciam fazer de tudo para
eliminá-la...
Surpreendentemente,
Abraão completou suas impressões dizendo que acreditava que o contrário deveria
ocorrer... Quer dizer, apesar de toda má conduta da corte papal, em sua opinião
a Igreja se expandiria, sua religião cresceria e se tornaria mais “luminosa
e brilhante”...
Giannotto ficava cada vez
mais impressionado com o amigo... O clímax de sua revelação foi afirmar que
considerou que o sustentáculo da igreja romana só podia ser o Espírito Santo e,
assim sendo, possui a doutrina da religião “mais certa e santa”... Abraão
assegurou-lhe que pretendia seguir com ele até uma igreja para se batizar
naquele momento mesmo.
Giannotto ficou
maravilhado... Sentiu-se o cristão mais feliz do mundo, e seguiu com o amigo
para a igreja Nossa Senhora de Paris... Solicitou o batismo aos padres,
conduziu Abraão à pia batismal e deu-lhe o nome de João... O tempo que se
seguiu foi de doutrinação na fé... Passou o resto de sua vida como homem
bondoso e digno.
Neífile
deu por encerrada a sua novela, que foi muito louvada por todos.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/03/decamerao-de-giovanni-boccaccio_11.html
Leia: Decamerão. Editora Abril.
Um abraço,
Prof.Gilberto