Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/09/1984-de-george-orwell-o-pesadelo-da.html?zx=d24fc447690b6b1d antes
de ler esta postagem:
Júlia e Winston deram prosseguimento à vida de
trabalho no Ministério da Verdade... Não podiam falhar em suas atividades ou
demonstrar esmorecimento, por isso aplicaram-se no trabalho voluntário e contribuíram
para a organização da “Semana do Ódio”. Desse modo não despertaram qualquer desconfiança
e, apesar das dificuldades, encontraram-se no quarto sobre a loja de antiguidades
com frequência maior do que podiam esperar.
(...)
Syme, o tipo que trabalhava
na nova edição do “Dicionário de Novilíngua” desapareceu... Winston havia
previsto que isso poderia mesmo ocorrer. Certo dia o homem faltou ao trabalho e
alguns boatos sobre sua ausência foram ouvidos aqui e ali. Ele não apareceu
também no dia seguinte, porém nada mais se falou a seu respeito...
Pelo terceiro dia consecutivo, Syme deixou de comparecer ao trabalho.
Então Winston resolveu conferir o mural informativo do vestiário e percebeu que
uma nota do “Comitê de Xadrez”, do qual o camarada fazia parte, continuava no
mesmo espaço de sempre, porém uma leitura atenta possibilitou notar que seu
nome já não constava. Obviamente isso significava que ele “deixara de existir”,
ou melhor, “nunca existira”.
(...)
Não fosse pelo ar
condicionado, os trabalhadores do Departamento de Registro teriam problemas
mais sérios. Ali não havia janelas e a atmosfera era das mais sufocantes.
Para piorar, os dias eram
de um calor intenso... Apesar disso, os transeuntes abarrotavam as calçadas e
as estações de metrô, onde predominavam as aglomerações e o mau cheiro.
Por causa dos preparativos
da “Semana do Ódio”, o trabalho mais que dobrara nos três Ministérios. Dos
eventos faziam parte “passeatas, comícios, paradas militares, conferências,
exposições de bonecos de cera, sessões cinematográficas, programas de
teletela”. Tudo isso demandava a aplicação do pessoal. Além disso, “era preciso
montar palanques, fazer efígies, inventar lemas, escrever canções, circular
boatos, falsificar fotos”.
No Departamento de Ficção,
onde Júlia trabalhava, interromperam o trabalho com as novelas para elaborar
material panfletário com conteúdo repleto de “atrocidades”. No caso de Winston,
além das tarefas habituais que cumpria, os preparativos para a festividade
exigiam uma análise mais apurada de edições antigas do “Times”, sobretudo de
certas temáticas que precisavam ser “embelezadas e otimizadas” para que fossem
citadas nos discursos das autoridades.
(...)
As noites eram de
movimentação maior do que de costume e pelas ruas se espalhavam jovens proles
desocupados. A agitação noturna da cidade tornava-se ainda maior por causa das
bombas-foguete que provocavam estrondo e destruição. Os bombardeios haviam
aumentado significativamente e sobre eles faziam-se especulações sombrias.
(...)
Com a chegada da “Semana do Ódio”, o Partido fez circular uma trilha
sonora comemorativa da qual se destacava a “Canção do Ódio” que, marcada por
“ritmo selvagem” e veiculada a exaustão pelas teletelas, caíra no gosto da
gente do proletariado. Para Winston a cacofonia nada tinha de música e lembrava
o latido de cães acompanhados pelo rufar de tambores.
Arruaceiros entoavam a canção durante a noite pelas ruas sem se esquecerem
de “Foi apenas uma fantasia desesperada”, que era a cantiga mais popular. Ao
ouvi-la, Winston se lembrava da vizinha da loja de antiguidades ao estender
fraudas no varal. Também chegava aos seus ouvidos a cantoria selvagem dos
filhos de Parsons “a qualquer hora do dia ou da noite”.
Nos diversos condomínios e bairros havia muito
trabalho durante as noites por causa da “Semana do Ódio”. Na Mansão Vitória não
era diferente, e Parsons prometia um evento arrasador, garantindo que o prédio
ostentaria cerca de quatrocentos metros de fita bordada. Winston se envolvia em
diferentes tarefas, já que havia grupos que cuidavam de enfeitar a rua,
costuravam bandeiras, pintavam faixas e cartazes, esticavam fios pelos
telhados...
Parsons sentia-se extasiado
nas ocasiões festivas... Sua alegria era imensa e as muitas atividades em meio
ao intenso calor serviam de pretexto para vestir-se como incansável
adolescente:
“Andava
por toda parte, empurrando, puxando, serrando, martelando, improvisando,
alegrando todo mundo, incitando os camaradas com exortações e soltando, de cada
dobra do corpo, uma nuvem inesgotável de cheiro acre de suor”.
(...)
Uma
das novidades daqueles dias foi um novo painel que não trazia qualquer legenda,
além da figura imensa de um guerreiro eurasiano com aparência mongoloide aterrorizante.
A imagem parecia destacar-se da gravura e avançar com enormes botas e
metralhadora para cima dos que a olhavam. A peça que media quatro metros podia
ser vista em vários pontos e em maior quantidade do que os cartazes do Grande
Irmão.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2021/09/1984-de-george-orwell-bombas-foguete.html
Leia: “1984”. Companhia Editora Nacional.
Um
abraço,
Prof.Gilberto