sexta-feira, 10 de julho de 2020

“Rei do Congo – A mentira que virou folclore”, de José Ramos Tinhorão – embaixadores congoleses batizados e acomodados em Portugal durante um ano para aprender a língua e artigos da fé católica; fragmentos diversos de Rui de Pina: solicitações do manicongo ao rei português; peste, mortes de Gonçalo de Sousa e de dois africanos a caminho do Congo; recepção alegre e longa marcha até o “rei” do Congo; Rui de Sousa e os muitos presentes do rei de Portugal ao manicongo

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2020/06/rei-do-congo-mentira-que-virou-folclore_29.html antes de ler esta postagem:

Para Tinhorão, o conflito político que D. João II travou com a nobreza explica o fato de o governo manter discrição e certo silêncio sobre o avanço das relações entre Portugal e a região africana abaixo do Equador.
E mesmo sobre Diogo Cão, reconhecido por suas realizações a partir das expedições de 1482-1483 e 1485 à costa africana e ao Congo, não se tem mais notícias depois de 1486, ano em que retornou a seu país com a embaixada africana e a carta do manicongo ao rei... Somente três anos depois é que se noticiará na cidade de Beja sobre o recebimento da embaixada do “rei do Congo” por D. João II.
Como se sabe, depois houve a retomada dos esforços para se estabelecer contato mais efetivo com as terras do reino africano... Pero de Évora e Gonçalo Eanes chegaram a Tombuctu em 1487... Na mesma época ocorreram as viagens de Pero da Covilhã e Afonso de Paiva, além das expedições pelo grande rio.
(...)
Rui de Pina registra que D. João providenciou o batismo da gente africana que chegou a Beja, e deu orientações para “que ficassem no seu reino durante todo o ano de 1490, de maneira que durante aquela temporada aprendessem a língua vulgar do seu reino e principalmente bem os artigos da fé católica”...
Em relação a essa última orientação, ainda de acordo com Rui de Pina, consta que o aprendizado dos africanos foi satisfatório, pois “todas aquelas coisas os tais compreenderam bem e com empenho de maneira que não partiram ignorantes”.
A embaixada retornou à África em dezembro de 1490 em frota comandada por Gonçalo de Sousa, que foi enviado ao manicongo como embaixador português... Seus navios levavam ainda o solicitado pelo “rei” africano na carta de 1486:

                   “artesãos, mestres de pedraria e de carpintaria, trabalhadores da terra, burros e pastores, de maneira que o rei pudesse mandar construir templos e outras coisas e palácios”.

Como podemos notar, D. João II fez de tudo para que seu reino cristão conseguisse a simpatia e aliança do manicongo e sua área de controle não influenciada pela religião muçulmana e mercadores árabes.
(...)
O livro dá conta de que logo que deixaram Lisboa, alguns dos que embarcaram contraíram peste e acabaram morrendo a caminho do Cabo Verde. Entre as vítimas da peste estava o próprio Gonçalo de Sousa, que foi substituído por Rui de Sousa, seu sobrinho. Dois africanos que faziam parte da embaixada também faleceram, um deles pertencia ao clã do manicongo, chamava-se Caçuta, mas foi batizado em Portugal e recebeu o nome de João da Silva. O outro africano que morreu de peste também fazia parte da embaixada e havia recebido o batismo de religiosos portugueses. Sobre este último não há maiores detalhes.
Apenas no final de março de 1491 é que os navios de Rui de Sousa chegaram ao rio Padrão, no Congo. Rui de Pina informa que os nativos ficaram felizes ao reverem os de sua gente que retornavam e tocaram “timbales e outros variados instrumentos como é costume deles”. No início do mês seguinte, os portugueses batizaram o chefe local, deram-lhe o nome de Manuel, e o seu filho também recebeu o batismo... Na sequência dirigiram-se por terra à área onde vivia o manicongo, o reconhecido chefe superior de toda aquela localidade.
Os “presentes e pesos” enviados pelo rei de Portugal foram carregados por duzentos negros pelo percurso de 150 milhas em mata... O longo trajeto foi vencido em 23 dias.
(...)
O manicongo era costumeiramente visto sentado numa grande cadeira... Ele recepcionou a comitiva e concedeu alguns dias de descanso aos homens.
Depois Rui de Sousa foi recebido oficialmente e pôde entregar “todos os ornamentos e as coisas eclesiásticas”... Além disso, apresentou-lhe aqueles que chegavam especificamente para cuidar dos ofícios solicitados.
A partir dos registros de Rui de Pina, somos informados de que depois o manicongo recebeu ainda mais do embaixador Rui de Sousa que:

                   “ofereceu um cavalo belíssimo, enfeitado com seu freio e sela, depois vestidos tecidos com ouro e seda e de diferentes cores e panos de púrpura e caudas de cavalos muito bem tecidas, e, finalmente, ofereceu-lhe muito liberalmente os navios com toda a gente e todas as outras coisas do rei de Portugal, e todas essas coisas causaram ao rei e a todos os seus tão incrível gáudio que muitas vezes se levantou do estrado abraçando o orador (o próprio Rui de Sousa) e o levantou da terra, já que naquele momento pensava ser o mais feliz príncipe do mundo...”.

Leia: Rei do Congo. Editora 34.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas