domingo, 16 de outubro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – fim do período letivo; o colega de Matemática se mostra disposto ao diálogo durante as férias, o diretor garante que telefonará; jantar com Maria e conversa a respeito da carta da produtora; de desconfianças e exigências

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/10/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_15.html antes de ler esta postagem:

Saramago é provocador...
Dizer que Tertuliano evidenciava habilidades que serviam para o policial investigador e também para o meliante que busca aperfeiçoar a sua atuação no disfarce nos leva a pensar sobre o que se sucederá a ele até o final da história.
Vejamos o que ocorrerá.
(...)
Ao retornar para casa, Tertuliano deu fim às seis cópias do retrato que fizera no estabelecimento fotográfico... Fez isso com maestria (queimou-os no lava-louças e fez a água conduzir as cinzas para longe). Juntou o retrato aos demais papéis guardados no envelope enviado pela produtora de filmes... Todo esse material foi colocado atrás de um exemplar de “História da Revolução Industrial”... Ele mesmo nunca se dispôs a ler o livro... Talvez por isso tenha considerado o esconderijo na prateleira tão apropriado.
(...)
O período de aulas terminou... Os exames finais definiram os resultados dos alunos... Os profissionais da escola sentiram-se aliviados. Férias.
O colega de Matemática despediu-se de Tertuliano e disse que, se precisasse, podia telefonar-lhe a qualquer momento...
O diretor repetiu que tão logo retornasse das férias entraria em contato para saber sobre o desenvolvimento do projeto... Lembrou que naturalmente o professor poderia viajar para descansar, mas esperava que ele deixasse gravado na secretária eletrônica o número de telefone para contato.
(...)
Tertuliano convidou a da Paz para um jantar... Sabia que estava em falta com ela, precisava agradecer-lhe e também falar-lhe a respeito da resposta enviada pela produtora... É claro que inventaria qualquer enredo.
Maria demorou-se a chegar... Cumprimentaram-se conforme o costume das urbanidades que se notam entre os que não se encontram cotidianamente... Quem os visse não diria que formavam um casal de enamorados.
Foi a da Paz quem puxou o assunto da carta... Ela quis saber se a resposta da produtora correspondera às suas expectativas.
Tertuliano respondeu que sim... O monossílabo não era garantia de que o tema teria curta duração. É que a da Paz deu a entender que, por tudo o que ele havia dito a respeito da pesquisa, esperava que o demandado não coubesse num envelope de pouco volume.
Para ela estava claro que a carta não trazia muito mais do que uma folha de papel... Tertuliano quis saber como é que ela podia saber do conteúdo... Perguntou se tinha aberto a correspondência.
Como se vê, o diálogo começou mal... Maria o olhou silenciosamente... Depois respondeu que não abriu o envelope, e isso era algo que ele nem devia perguntar. Tertuliano pediu desculpas dizendo que aquilo era algo que deixou escapar sem pensar.
A da Paz explicou que podia desculpá-lo, já que era isso o que ele desejava... Mas acrescentou que não poderia esquecer que ele a considerara capaz de violar a carta que, apesar de ser remetida a ela, interessava unicamente a ele.
Tertuliano quis dizer que no fundo ela sabia que ele não pensava daquela forma... Ela usou das mesmas palavras para redarguir que “no fundo” ela sabia que ele nada sabia a respeito dela. Ele argumentou que, se assim era, como se explicava que tivesse pedido o favor justamente a ela?
A da Paz deixou claro que entendia que o seu nome havia sido usado por ele como se fosse uma “máscara” (palavra interessante, e muito bem colocada pelo autor).
Obviamente a afirmação deve ter abalado o Tertuliano... Ele emendou que havia explicado os motivos de não ter colocado o próprio nome na correspondência... Tudo bem, Maria concordou que havia assentido... Mas deixou claro que a partir daquele momento estaria à espera das informações contidas na carta. E arrematou que, embora não tivesse nenhum interesse pelo material, ele tinha o dever de lhe mostrar.
O professor argumentou que chegavam ao ponto em que era ela que demonstrava desconfianças em relação a ele... Ela concordou... Era isso mesmo... E acrescentou que tudo se resolveria a partir do momento em que ele mostrasse a folha de papel, e explicasse como tudo o que solicitava à produtora pôde caber num simples envelope.
Tertuliano respondeu que não lhe forneceram todos os dados... Maria disse que não tinha importância... Era só ele mostrar o que haviam lhe mandado.
(...)
Os pratos esfriavam à mesa...
Podia-se notar que lágrimas se formavam nos cantos dos olhos de Maria.
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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