Tertuliano estava satisfeito com a expedição que fizera ao sítio onde se encontraria com Antônio Claro...
Estava de bem consigo mesmo, pois se sentia em vantagem em relação ao outro.
De volta ao lar, de banho tomado, usando roupas limpas e bebericando um refresco de limão... O que mais poderia desejar?
Resolveu telefonar à mãe.
(...)
Dona Carolina o atendeu sem se queixar de qualquer
problema... Nada demais se passava com ela... Estava tudo bem “na forma do
costume”...
Salientou que estranhava o longo período sem notícias do filho...
Tertuliano pediu desculpas e acrescentou que tinha muitas coisas para resolver.
A mãe quis saber em que pé estavam os seus afazeres... Ele respondeu que tudo
se encaminhava e que em breve tudo estaria solucionado... Ela não precisava se
preocupar.
Dona Carolina respondeu que sossegaria quando pudessem
passar uns dias juntos... Tertuliano garantiu que logo teria condições de
viajar. A mulher quis saber como estava a relação com Maria...
O professor argumentou que a situação com a da Paz não era de fácil
explicação... Disse que gostava dela e que até precisava dela... Dona Carolina
salientou que muitos homens se casavam por razões menores. Mas para Tertuliano
sua relação com Maria só ocorrera por causa de sua solidão... Em certo momento
deparara-se com uma mulher simpática, e foi apenas isso.
Esse fato não representava motivação suficiente para que se arriscasse
novamente num casamento. Dona Carolina quis lembrá-lo de que ele amara a
esposa, então essa capacidade ele devia ter... Tertuliano argumentou que havia
se passado seis anos desde que romperam e nem lembrava mais dos sentimentos que
nutria pela esposa, talvez os dois tenham se equivocado em relação um ao outro.
Dona Carolina entendeu que o filho não quisesse que se repetisse com
Maria da Paz o mesmo que se sucedera com o seu primeiro casamento... Mas não
deixou de comentar que toda aquela prevenção pouco considerava as expectativas
da moça.
Tertuliano ouviu o que a mãe tinha a dizer... Ao final respondeu que “assim
é”... Dona Carolina mostrou-se intrigada com as duas palavras... Tanto é que
insistiu para que ele as repetisse... O rapaz não se conformou imediatamente
com a implicância... Mas de tanto ouvir que o modo como havia se pronunciado
despertara uma sensação estranha como um “piscar de lâmpada em meio à escuridão”,
disse novamente o “assim é”.
Dona Carolina sentenciou
não havia sido a mesma coisa... Tertuliano pediu para que ela parasse de
fantasiar... Emendou que as fantasias nos distanciam da “paz de espírito”...
Ela pediu para o filho não
se zangar... Mas é certo que aquilo só podia se relacionar a um pressentimento...
E Tertuliano ficava desassossegado em relação aos pressentimentos da mãe.
Afinal, qual filho reage de modo diferente?
Ela quis saber quando
a visitaria... Ele respondeu que logo chegaria o dia.
Dona Carolina adiantou que precisavam conversar... Tertuliano confirmou
que poderiam conversar sobre o que ela quisesse.
A mãe respondeu que só
queria ter uma conversa específica... Tertuliano quis saber qual... Dona
Carolina disse que ele sabia muito bem o que ela pretendia conversar. Queria
saber o que se passava com ele, e em tom de ameaça concluiu que não adiantava
aparecer com “histórias preparadas” ou truques... Esperava que o filho fosse
franco ao colocar as “cartas sobre a mesa”.
Tertuliano respondeu que não esconderia nada e
contaria tudo o que a mãe quisesse saber... Dona Carolina manifestou sua satisfação,
então o rapaz comentou que também esperava saber o que ela diria quando ele lhe
apresentasse “a primeira carta”.
A mãe argumentou que já tinha visto de tudo em sua vida... Nada a
surpreenderia... Tertuliano sentenciou que ela podia permanecer com aquela
ilusão até que começassem a falar.
Essas palavras despertaram mais curiosidade em dona
Carolina... Tertuliano dera a entender que era sério o que se passava com ele.
Mas não havia como adiantar o assunto pelo telefone... Ela teria de
esperar.
Despediram-se... Ela desejando que ele
aparecesse logo... Ele sustentando que em poucos dias isso ocorreria.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/10/o-homem-duplicado-de-jose-saramago_30.html
Leia: O
Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto