segunda-feira, 12 de março de 2012

"Corações Sujos", de Fernando Morais - presídio da ilha Anchieta - Parte II

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com/2012/03/coracoes-sujos-de-fernando-morais_10.html antes de ler esta postagem:

Fusatoshi Yamauchi e Masao Honke faziam a manutenção geral dos barcos da polícia e da usina que gerava a energia consumida na ilha. Yamauchi conquistou a confiança das autoridades e tornou-se piloto autorizado a fazer as compras necessárias à colônia penal em Ubatuba. Em suas idas à cidade conheceu uma jovem professora que se dispôs a ajudar os companheiros de Yamauchi a se corresponderem com os familiares... Ele tinha mesmo prestígio em meio à administração, tanto é que era requisitado também para transportar autoridades policiais ou judiciárias até o presídio... E fazia isso armado para que não pairassem suspeitas de que era um preso que assumia a tarefa.
Também o pai de Fusatoshi, Kenjiro Yamauchi, merece destaque... Ele havia experimentado dias de muito sofrimento. Sua casa em Tupã passou por uma varredura minuciosa... Investigadores quebraram discos com canções japonesas e levaram todo dinheiro que encontraram. Antes de ser transferido para a ilha Anchieta, ele foi encaminhado para interrogatórios em São Paulo e foi forçado pelo colaborador da polícia, Paulo Yoshizaku Morita, a fazer o vergonhoso fumie sobre fotografia do imperador. Na prisão, Yamauchi tornara-se um senhor reflexivo, que dava conselhos aos demais sobre o crescimento espiritual nos momentos de dor... Ele perdoara Morita e aqueles que o perseguiram e humilharam. Também Morita tinha seus escrúpulos de consciência e pediu perdão pelos procedimentos que adotara ao permanecer do lado das autoridades policiais contra os compatriotas.
Tatsuo Watanabe, o tokkotai que participou da execução do coronel Jinsaku Wakiyama, transformara-se radicalmente no presídio. Ele vivia dias de farmacêutico requisitado, inclusive para fazer o parto de moradoras da vila de pescadores... Entre os hábitos dos sentenciados estavam a fotografia e o nikki (diário) escrito na forma de haicus. Daí podermos concluir que a documentação referente aos cotidianos japoneses na ilha Anchieta ser farta. Sabemos, graças a isso, que o lazer era garantido pelos torneios de sumô...
O presídio acabou marcando a vida de cada um deles. Alguns, como foi o caso do fotógrafo Noriyoshi Sakamoto, viveram dias de realização pessoal. Este Sakamoto tornou-se ajudante-de-ordens de um capitão e garçom do refeitório... Foi durante seus afazeres que encontrou aquela que viria a ser sua esposa, uma jovem que visitava o pai prisioneiro.
Causou surpresa o fato de Satoru Yamamoto ter manifestado ao capitão Enoque Martins a autoria do atentado que vitimou Ikuta Mizobe (o primeiro assassinato cometido pela Shindo; ver http://aulasprofgilberto.blogspot.com/2012/01/coracoes-sujos-de-fernando-morais_26.html). Ele manifestou estar deprimido com tantas prisões e torturas pela polícia na tentativa de descobrir, sem sucesso, o verdadeiro assassino... Em depoimento à televisão japonesa anos mais tarde, cumprindo pena pelo crime, Yamamoto se considerava perdoado porque a própria esposa de Mizobe o perdoara.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2012/03/coracoes-sujos-de-fernando-morais_16.html
Leia: Corações Sujos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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