Os alunos perceberam que a jovem substituta estava insegura, então passaram a provocá-la de diversas formas. Notaram suas reações e tiraram conclusões sobre o quanto ela era despreparada.
De repente um deles protestou com o seu linguajar da gente do interior que certo Joaquim o provocava com um “arfinete”. Helena contemporizou, disse que o Joaquim era bonzinho e que aquilo só podia ser “história” do que estava reclamando. Disse isso e quis que o acusado confirmasse que não era capaz de fazer maldades como aquela.
(...)
As crianças chamavam-na de “mestra”, e a todo momento a confundiam com
reclamações sobre situações que inventavam... Um disse que estava sendo “pinicado”
pelo Joãozinho; outro falou que o Joaquim era, sim, malvado...
A “mestra”
verificava os cadernos quando alguém protestou que o Chico devia fazer outra
lição, e não aquela que estava entregando (que era bem mais simples). Também falaram
de certa Elvira que, por pura preguiça, mentiu à “mestra” sobre a lição que
devia estudar.
Na sequência, um
grupo indisciplinado passou a aprontar algo repugnante... Um dos garotos
insistia que a “mestra” tinha de resolver a situação.
(...)
Helena
sabia que não tinha condições de resolver nada por ali.
Sua cabeça começou a
doer e parecia que ia estourar. Alguém disse que a Amélia estava falando “que a
escola se tornara um paraíso de Adão e Eva, e seria bom que a mestra Madge
continuasse doente por mais tempo”.
Pensando que poderia
chantageá-los, Helena disse que se eles se comportassem melhor ela poderia
continuar a lhes dar aulas.
Mas logo percebeu que
com aquelas crianças não teria trégua. Um dos alunos reclamou que Pedrinho
havia colocado o dedo no próprio nariz para depois agredi-lo enfiando o dedo
sujo em sua boca.
(...)
Era demais! O tormento não tinha fim!
De todos os lados vinham solicitações... “Mestra, olhe isto! Mestra,
olhe aquilo!”.
Um dos grandes se levantou e pediu licença...
Helena quis saber o que ele pretendia. Todos disseram que ele queria a “tabuinha”.
Ao mesmo tempo vários deles se levantaram e se dirigiram à mesa da professora.
Retiraram a “tabuinha” de uma das gavetas, um pedaço de madeira bem sujo... Um
deles disse que ela só podia autorizar a saída do garoto se ele levasse aquela “tabuinha”.
Helena entregou o
acessório ao garoto, que imediatamente deixou a sala de aula e partiu para o
quintal repleto de mato.
(...)
Não demorou e o menino soltou um grito dando a entender que havia uma
cobra no caminho para a “casinha” que servia de banheiro.
A algazarra foi
geral. Todos se retiraram da sala e foram direto ao encontro do rapaz. Para
tumultuar, cada um dizia uma coisa diferente, “a cobra está aqui!”, “ela entrou
ali!”...
Evidentemente Helena
sabia que eles só queriam fazer bagunça... Mas também não podia cometer vacilo
naquela situação.
Foi
difícil, mas todos acabaram retornando aos seus lugares na sala.
Ela retomou a correção dos cadernos e a bagunça voltou a tomar conta do
ambiente. A essa altura, Helena começou a pensar que aquele não era lugar onde
pudesse se realizar. Pensou em Siá Generosa e seu ofício de quitandeira.
Talvez
fosse melhor se tornar alguém como a Siá Generosa, dedicando-se aos serviços
das mulheres comuns que lavam roupas e lidam com forno e fogão.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/06/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_7.html
Leia: Minha
Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto