quinta-feira, 1 de junho de 2017

“Minha Vida de Menina”, de Helena Morley – registros de 19 e 23 de maio de 1895; a respeito dos parentes e mais sobre os “desvios de comportamento”; uma lembrança sobre Mariquinha Bonecreira e a encomenda mal resolvida

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/05/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_27.html antes de ler esta postagem:

Helena escreveu sobre seus familiares por parte de mãe e por parte de pai em seus registros de 23 de maio de 1895.
Da parte de seu Alexandre, todos eram muito parecidos. Os modos de ser de seus irmãos eram muito semelhantes. Tanto é que Helena dizia que bastava conhecer um deles para sabermos como eram os demais. Eles eram “diferentes só na figura”.
O mesmo podia ser dito em relação às tias inglesas. Todavia Helena salienta que entre elas não havia tanta similaridade como entre os tios. Na verdade não havia muitos parentes por parte de pai, só mesmo os tios e tias.  Além de seu Alexandre, só o tio Mortimer tinha filhos.
A menina não podia dizer o mesmo sobre os irmãos e irmãs de dona Carolina. Dessa parte da família havia muitíssimos parentes, primos e primas. Alguns nem eram conhecidos pelos que viviam em Diamantina.
(...)
Um dos parentes de dona Carolina era muito inteligente e trabalhava como guarda-livros (contador; contabilista). Seu nome era Abílio.
Mas já fazia algum tempo que ele deixara o trabalho e se metera a beber. A embriaguez o transformara completamente. Dizia-se que ele  havia se tornado um relaxado.
Em vez de se reabilitar, afundava-se cada vez mais na condição de “desapontado em relação a tudo”. O tipo permanecia por muitas horas “sentado na pedreira da casa dele” sem nada dizer.
Diziam que ele ficou com “mania de francês” tão logo notou que a cidade estava se enchendo de estrangeiros que para lá afluíram em busca de lavras.
Muitas vezes chamavam-lhe a atenção para que deixasse a preguiça e fosse trabalhar. Mas Abílio respondia que não podia, pois era um “cidadão francês”.
Seu Alexandre explicava à Helena que a cachaça inutilizava “muitos rapazes inteligentes em Diamantina”.

(...)

Em seus registros de 19 de maio de 1895, Helena conta que folheou uma revista e que numa das páginas deparou-se com uma figura que lembrava a única boneca que tivera na vida.
Ela destaca que sempre que se preparava para escrever sobre o seu cotidiano, muitas lembranças da infância tomavam-lhe a memória. Pode ser que isso ocorresse porque aqueles haviam sido tempos em que tudo a impressionava.
Contemplou a figura da revista por algum tempo e recordou-se da boneca e de uma situação de desapontamento a ela relacionada.
Ela e Luisinha não tinham “brinquedos de loja”. Distraíam-se carregando as crianças menores de seus vizinhos. Eventualmente brincavam com “grandes bonecas grosseiras de pano” que elas mesmas faziam para “fingir de menino pequeno”.
(...)
Certa vez a dona Mariquinha, que era “bonecreira”, passou pela sua casa oferecendo bonecas de pano.
Helena devia ter uns seis ou sete anos... Dona Carolina se dispôs a comprar, mas as meninas não demonstraram interesse porque não teriam como vesti-las bem.
A bonecreira explicou que podia fazer umas maiores. Isso despertou o interesse de Helena, que foi logo pedindo para ela confeccionar uma “bem grande”, que pudesse ser carregada como se fosse um “menino de verdade”.
Depois de alguns dias, dona Mariquinha Bonecreira chegou com as bonecas, que eram apenas “pouco maiores” do que as demais. As meninas esperavam que o brinquedo tivesse uns cabelos bons para se passar o pente, mas a mulher fez as bonecas com uns coques de cabelos encaracolados.
Helena e Luisinha não gostaram do que viram. Esperavam outra coisa, pois durante aqueles dias vinham planejando várias brincadeiras e estavam prontas para fazer vestidos com os retalhos que haviam juntado.
Definitivamente não se divertiram com as bonecas que foram guardadas e esquecidas no armário.
(...)
Do alto de sua maturidade (ainda não completara os 15 anos), Helena entendia que as “crianças nunca sofrem” como os adultos pensam...
Aquelas pequenas decepções logo passavam.
E é por isso que ela podia dizer que sempre havia sido muito feliz.
Leia: Minha Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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