terça-feira, 19 de maio de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – a morte de Tonhão da Casa Verde; o padre Mathäus visitou a Mãe Catarina no dia da festa de Ogum; um alemão na umbanda

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com/2015/05/a-legiao-negra-luta-dos-afro_19.html antes de ler esta postagem:

Nem o capitão Trujilo nem o capelão Mathäus vivenciaram o ataque que o grupamento de Miro sofreu... Só depois que os inimigos haviam partido eles apareceram...
(...)
O padre estava devidamente fardado e paramentado com os panos religiosos... Não perdeu tempo e seguiu ”distribuindo extrema unção”... Um dos soldados tinha vísceras expostas, mas ainda respirava... O religioso manipulou o capacete do pobre coitado para ministrar o sacramento e ficou surpreso ao notar que era o Tonhão da Casa Verde. Mathäus entendeu que devia “caprichar” com os óleos e orações, já que aquele era um cristão errante.
Tonhão sabia que se aproximava do fim, mas ainda teve tempo de pedir um favor ao padre. Ele mostrou um envelope e uma pequena imagem de Ogum (São Jorge) e disse que pretendia devolvê-la à mãe porque havia feito essa promessa a ela... Era certo que ele mesmo não poderia cumprir o prometido, então deixava com o padre o pouco dinheiro que possuía e que podia ser utilizado para as despesas...
Mathäus sentenciou que, enfim, o rapaz que incorporava espíritos havia se convertido, pois estava claro que cultuava um santo mártir... Garantiu que não precisava se preocupar com suas despesas. E disse que encontraria o endereço (registrado no envelope) da residência na Casa Verde...
Depois dessas palavras, encomendou a alma do moribundo.
(...)
Esse episódio tem um final curioso...
É claro que anos mais tarde Tião ficou sabendo...
E é por isso que podia refletir sobre ele.

Embora dissesse que Tonhão não precisava se preocupar com suas despesas, Mathäus acabou embolsando todo o dinheiro que ele lhe entregou...
Um padre de Lorena apareceu para substitui-lo alguns dias depois dos acontecimentos narrados acima. Então o alemão seguiu para São Paulo e pôde visitar a mãe do soldado na Casa Verde.
O sacerdote ficou sabendo que Mãe Catarina D’Oxum estava na gira... Ele explicou a uma jovem de turbante branco e longa saia rodada o que havia ocorrido com Tonhão... Depois pediu que ela entregasse os objetos que o rapaz havia enviado à mãe... A moça chorou e disse que ele devia fazer a entrega pessoalmente depois que o guia da Mãe Catarina subisse...
Naquele dia se festejava Ogum, “o santo de cabeça do pai Tonhão”... Mathäus teve de se dirigir ao congá (altar).
Aconteceu que a atmosfera contagiou o religioso católico... Ele começou a perder os sentidos e sentiu que estava desmaiando... Na verdade, depois de soltar um forte grito e estremecer-se todo, ele incorporou Ogum... As pessoas presentes logo perceberam a transformação.
O tipo branquelo arrancou a batina preta e pediu que a envolvessem em panos vermelhos... Ele estava arrepiado e sua pele parecia queimar... Colocaram contas de cristal em seu pescoço e deram-lhe uma espada dourada e também o capacete que era de Tonhão.
Completamente transformado, começou a dar passes e conselhos aos presentes... Anunciou que Tonhão não retornaria, mas Ogum jamais os abandonaria.
(...)
E foi isso... O alemão Mathäus acabou se desenvolvendo na umbanda... Ele, que tanto criticava os cultos afros, dobrou-se à realidade que descobriu visitando a mãe de Tonhão...
Para ela, o filho seria para sempre o herói da família...
Para o padre, Pai Tonhão seria sempre um grande herói.
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas