segunda-feira, 18 de maio de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – o “soldado mudo” foi flagrado cantando enquanto se banhava; prisão e sonhos frustrados; massacre e improviso no Vale do Paraíba; Landão não podia entender Tião e Luvercy

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/05/a-legiao-negra-luta-dos-afro_17.html antes de ler esta postagem:

O batalhão comandado por Miro alcançou o Vale do Paraíba... Mas a empolgação de John Washington durou pouco...
Aconteceu que o “soldado mudo” foi flagrado cantando (uma música religiosa) enquanto se banhava em águas correntes da localidade de Lavrinhas, nas proximidades do município de Cruzeiro. Num primeiro momento, o tipo que estava de sentinela estranhou... Mas depois demonstrou firmeza ao denunciá-lo ao capitão Trujilo Marcondes Salgado.
Miro ainda tentou intervir e garantiu que o detido demonstrara bravura e merecia ser condecorado... Porém a infração cometida era crime que só podia ser julgado por corte marcial... É por isso que John foi encaminhado para Santos, onde aguardaria julgamento num presídio militar.
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O jamaicano John Washington foi obrigado a deixar o batalhão do amigo Miro... O seu vacilo (ao “soltar a voz” enquanto se banhava no córrego em Lavrinhas) resultou em sua prisão...
Podemos imaginar o quanto ele ficou decepcionado, pois desejava participar abnegadamente da luta dos irmãos negros... Era com sinceridade que pretendia o intercâmbio e aprendizado com as lideranças frentenegrinas e da Legião Negra, além de divulgar no Brasil as ideias dos movimentos dos quais participava... Ele sonhava com uma realidade mais digna para toda a gente negra, e entendia que só a luta organizada poderia promover as mudanças almejadas.
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Fora de combate, Washington não experimentou do sufoco imposto pelas tropas federais no Vale do Paraíba... A superioridade bélica dos inimigos provocava desmedido desespero... O sofrimento dos que eram atingidos por balaços e estilhaços arrasava o moral dos demais.
Faltava munição às tropas rebeldes... O improviso tornou-se alternativa que os comandantes não podiam recusar. Foi assim que surgiu, por exemplo, a ideia de distribuir matracas aos soldados... Manipuladas de modo ritmado, aquelas engenhocas simulavam o som do disparo de metralhadoras...
A propósito dessa iniciativa, é bom que se diga que ela não demorou a ser descoberta pelos federais que, após massacrar os inimigos, passaram a agitar as inofensivas matracas só para humilhar os derrotados.
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Depois da ofensiva massacrante das tropas getulistas às margens do Rio Paraíba do Sul, os sobreviventes do grupamento de Miro (em obediência às ordens do capitão Trujilo) tiveram de se deslocar para Queluz.
Trujilo queria fazer crer que os bombardeios e rajadas que ouviam eram ataques das rebeldes tropas amigas aos “macacos getulistas”...
A simplicidade de Tião não o impedia de perceber que o homem dizia aquelas coisas porque “sabia o que os comandados deviam saber”.
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Miro tentou a todo custo animar o seu pessoal, e ordenou que seguissem no rumo noroeste... Sua intenção era a de instalar o que restou de seus homens em local seguro, onde pudessem avistar a movimentação inimiga sem serem notados... Ele não tinha uma ordem específica... Dizia que todos deviam procurar sobreviver a qualquer custo.
Porém tornou-se muito difícil escapar da morte... O batalhão não sabia de onde partiam os ataques surpresa de metralhadoras e canhões... De onde vinham tantas rajadas e bombas?
De vez em quando um ou outro de seus soldados partia para atitudes desvairadas e atirava a esmo... Eventualmente, gritos vindos do lado inimigo indicavam que alguém (quem?) havia sido atingido... Isso era motivo de comemoração.
(...)
A condição em que se encontravam era de total banalização da vida... Tião pensava sobre isso e procurava, em vez de tentar atingir inimigos, proteger a si mesmo e aos companheiros.
Landão, o pai de Luvercy (que passou a acompanhá-los mais de perto depois que o jamaicano deixou o grupo), notou o comportamento de Tião e comentou que podia entender por que sua munição durava mais do que a dos outros.
Tião respondia que não tinha nada contra ninguém, nem mesmo contra aquelas tropas que atiravam contra eles... Seu Orlando via que a atitude do rapaz era a mesma de seu filho, e não podia entender aquele comportamento.
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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