O movimento de Marcus Mosiah Garvey se estendia por uma rede de mais de 40 países... Desde 1918 ele publicava o periódico Negro World e militava contra o preconceito e a discriminação dos negros... Também ele era jamaicano e entendia que os negros deviam integrar nações que lhes eram próprias, sendo assim, a África seria o destino de todos os que estavam, por causa da diáspora, afastados dela... Não era por acaso que o lema da Associação Universal para o Progresso Negro era “Um Deus! Uma aspiração! Um Destino”.
(...)
É claro que Miro jamais ouvira falar do movimento de Garvey, tampouco
podia entender como é que algum negro pudesse se interessar em transferir-se da
América para a África... Ficou espantado ao saber que pelo menos três viagens
haviam sido promovidas pelo movimento, e que centenas de afrodescendentes
decidiram (literalmente) embarcar no projeto.
Para ele, era espantoso que
nos Estados Unidos existisse um movimento com aquelas características... Miro
se recordou da ocasião em que o mascate Salim quis apresentar-lhe o jornal da
Frente Negra... Apesar de ter se recusado a folheá-lo, tinha certeza de que a
entidade brasileira não podia ser comparada ao movimento de Garvey.
(...)
As coisas tinham mudado muito... A amarga experiência
vivida por Miro em Marilândia Paulista fizera com que ele passasse a rejeitar a
ideia de que o nosso país fosse um paraíso onde a “democracia racial” garantia
convivência pacífica entre negros e brancos. Era certo que ele estava arrependido
por ter vivido alienado até então.
(...)
De certo modo a história de fuga de John Washington se parecia um pouco
com a sua... Washington explicou que um dos marinheiros que estava no bar de
Stela havia lhe “alugado” o uniforme, e foi assim que ele conseguiu se
disfarçar e se intrometer em meio aos demais depois de permanecer por algum
tempo escondido no porto de Boston enquanto os ativistas eram caçados pela
polícia...
Miro achou graça quando o rapaz disse que depois de
disfarçado não teve maiores problemas para deixar o país, já que para os oficiais
brancos “os negros são todos parecidos”.
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Na sequência dos acontecimentos vemos que a conversa interessantíssima
entre Miro e Washington foi interrompida porque os colegas do gringo exigiam
que ele levasse mais cervejas para a mesa...
Miro até foi convidado para se juntar aos bebedores, mas ele preferiu
permanecer junto ao balcão bem perto da bela Stela... Se ele perguntasse a ela
sobre essa sua opção, ouviria que era isso mesmo o que devia fazer.
Mais algum tempo se passou... Os marinheiros se embebedaram e se retiraram
depois das oito da noite... Miro sugeriu que Stela fechasse o estabelecimento,
até porque não havia mais fregueses. Ela concordou, e também topou a proposta
de subirem até os cômodos de cima para tomarem chá...
(...)
Mal cerraram a porta do boteco e se agarraram freneticamente... Nem é
preciso dizer como isso terminou. O casal subiu pela escada e se envolveu ardentemente...
Era a primeira vez que Miro se entregava com paixão a uma mulher... Não havia
como comparar as sensações que experimentou com Stela à relação tumultuada que
teve com Marcela em Marilândia.
Passado o frenesi, Stela
perguntou se Miro topava ficar com ela “para sempre”... Isso foi como que um “balde
de água fria”... Em vez de respostas, Miro só reflexões se passaram por sua
mente...
É claro que Stela era uma
mulher maravilhosa, e ele estava muito satisfeito por se identificar com ela,
uma negra como ele... Mas estava muito amargurado com a experiência do
casamento frustrado, e calculava que no final das contas apenas faria a bela
Stela sofrer...
Miro nada disse...
Beijou-a, retirou-se para um banho e depois começou a se vestir... Na verdade
ele também tinha medo de se apaixonar...
Ele se retirou sem encará-la de frente... Nem
notou que lágrimas molhavam a face da jovem amante.
Leia: A
Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto