sexta-feira, 10 de abril de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – manifestação de 23 de maio de 1932; MMDC; patrões idealistas disponibilizavam também os seus empregados ao movimento

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/04/a-legiao-negra-luta-dos-afro_8.html antes de ler esta postagem:

Ao relatar o cotidiano de Maria, a empregada doméstica de uma mansão de Higienópolis (aquela que estava sempre de ouvidos atentos ao rádio, sua companhia inseparável), Faustino revela-nos os episódios que deflagraram a Revolução Constitucionalista.
Notamos que ela se preocupava cada vez mais com a repetida locução do noticiário que garantia que “o copo está cheio até a boca; falta uma gota para transbordar”... Maria sabia que o levantamento de São Paulo em armas contra o governo Vargas era apenas uma questão de tempo, pois bastava algum episódio significativo para justificar o pretexto de mobilização.
(...)
Faltava a gota d’água...
Manifestações já vinham ocorrendo pelo centro da cidade... Os participantes chegavam aos comícios inflamados pelos radialistas...
Os discursos ilustravam a indignação contra o governo Vargas, sua “vacilação” em relação aos encaminhamentos políticos para que uma nova Constituição fosse elaborada, e de insatisfação e repúdio contra os interventores impostos pelo presidente.
A gota que faltava para “encher o copo” deflagrador da Revolução “pingou” na noite de 23 de maio, quando manifestantes mais exaltados se dirigiram às sedes das organizações que apoiavam o presidente Vargas (Partido Popular Paulista, liderado por Miguel Costa, “braço do Partido Liberal”, e também a Legião Revolucionária). Muitos jovens estavam entre os que tentaram invadir o prédio localizado “na esquina da Alameda Barão de Itapetininga com a Praça da República”... Houve resistência e tiros foram disparados para tudo quanto era lado.
Quatro manifestantes morreram durante o confronto: Mário Martins de Almeida, 32 anos, que era fazendeiro na cidade de Sertãozinho; o auxiliar de escritório Euclydes Bueno Miragaia, de 21 anos; Dráusio Marcondes de Sousa, 14 anos, estudante; Antônio Américo Camargo de Andrade, comerciante de 31 anos... Orlando de Oliveira Alvarenga, escrivão de 32 anos, foi ferido durante a manifestação e faleceu em agosto.
(...)
Sobre aquela noite que entrou para a história dos paulistas, o poeta Guilherme de Almeida escreveu em 1943: (...) e houve uma noite de heroísmo/ que marcou o teu batismo/ de glória: e por isso é que/ tens quatro letras gravadas/ nas quatro estrelas douradas/ do topo MMDC.
(...)
Disparos durante o protesto...
Na sequência a multidão se enfureceu... A sigla MMDC passou a identificar o movimento constitucionalista dos paulistas. Todos reconheceram nela a homenagem aos mártires Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo.
(...)
Maria foi contagiada pelos sentimentos de revolta dos paulistas... Seus pensamentos não abandonavam aqueles fatos e os discursos a favor da revolução.
A patroa a chamou... Via-se que também ela parecia consternada com os últimos episódios na cidade... Ela não tinha nenhuma ordem de serviço ou recomendação para o jantar... A madame pretendia desabafar.
Ela pediu a Maria que caminhasse ao seu lado no passeio pela alameda do grande terreno onde se localizava a mansão... Chamou-a de amiga! Como diz Faustino, “a guerra provoca fenômenos estranhos que podem até solapar as estratificações sociais”...
A patroa revelou que se apresentaria à Junta de Alistamento... Contou também que as mulheres tinham tarefas a cumprir e que suas amigas estavam se apresentando voluntariamente... Elas colocavam os empregados à disposição da causa do MMDC...
A dona seguiu falando que o marido doutor estava muito chateado porque entendia que bem poucos se engajavam com sinceridade e devoção à revolução... Segundo ela, o patrão entendia que os alistamentos se deviam muito mais aos tempos de crise... Não havia idealismo sincero... Apesar de baixo, era do soldo que os alistados estavam atrás. Muitos eram os que entendiam que o alistamento os tirava da condição de desemprego e miséria...
A patroa dizia essas coisas sem ter a menor ideia de que a sua empregada era bem mais informada do que ela.
Evidentemente, Maria caminhou (por um bom tempo) sem nada dizer.
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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