quinta-feira, 23 de abril de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – o suicídio de Santos Dumont; a patroa segue com Maria para a Chácara do Carvalho, onde se alistarão; recordações dos eventos sociais na mansão dos Prado; modernistas também em campanha; ouro para a revolução

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/04/a-legiao-negra-luta-dos-afro_22.html antes de ler esta postagem:

Santos Dumont se suicidou em 1932...
O “pai da aviação” estava mesmo muito deprimido... Os tempos gloriosos haviam passado para ele. Ele padecia também de esclerose múltipla...
Residia no Grande Hotel de la Plage, no Guarujá...
Conta-se que “ao ouvir o ronco das aeronaves das forças federais”, que seguiam para bombardear São Paulo, ele soltou gritos de pavor... Não suportou o fato de ter sido o inventor da “desgraça do mundo”... No dia 23 de julho trancou-se no quarto e se enforcou com duas gravatas.
(...)
Pelo rádio, Maria ouviu os comentários sobre a tragédia que marcou o fim do ilustre brasileiro... Os locutores concluíam que o lamentável episódio só podia ser creditado ao governo federal.
Por aqueles dias a patroa resolveu seguir para o alistamento... Ela acomodou a sua cozinheira no automóvel dirigido por Otacílio, chofer da família, que há muitos anos trabalhava para a mansão...
A madame daria a sua contribuição à revolução, e era com satisfação que também encaminhava a empregada... Sem dúvida, contribuir para a vitória de São Paulo era uma honra.
A mulher solicitou ao motorista que fizesse um caminho mais longo... Passaria em alguns estabelecimentos para comprar pães finos para o chá da tarde...
Maria estava no banco da frente e era com admiração que contemplava as ruas do centro... Ficou encantada com os postes e os lampiões a gás... Pensava sobre a trágica morte de Santos Dumont...
(...)
Largo do Café, Largo São Bento, convento dos beneditinos, Viaduto Santa Efigênia, Estação da Luz, Estação da Sorocabana, Campos Elíseos...
Logo divisaram a Chácara do Carvalho, sede da 2ª Região Militar... A madame não pôde se conter de emoção ao recordar dos tempos em que, junto ao marido, frequentava as festas promovidas pela família Prado... Eram encontros fabulosos e a gente rica não dispensava aquelas oportunidades.
A patroa destampou a falar sobre certas particularidades dos dourados tempos de outrora... Disse que o marido praticara hóquei a cavalo naquela chácara com o doutor Veríssimo e o doutor Martinho Silva Prado... Sobre este último, disse que era marido de dona Veridiana; que ele era tio dela e que era 14 anos mais velho do que ela; e que (diziam), na mansão de Higienópolis, viviam separados...
A patroa parecia se divertir com seu conhecimento sobre as particularidades da gente granfina... Mas ela mesma nem podia ter tanta certeza de suas recordações, já que em 1910, quando o velho Martinho Prado morreu aos 83 anos, era apenas uma garotinha.
(...)
Ela ordenou que o motorista Otacílio parasse o carro próximo de uma banca de jornal... A banca do português Quincas... A mulher quis ler a primeira página de um jornal que estava exposto. O texto versava sobre o civismo das mulheres de São Paulo e sua dedicação à guerra...
O jornal comparava o esforço das paulistas de 1932 ao brio das esposas dos bandeirantes dos tempos coloniais, que se negavam receber os maridos se esses regressavam derrotados de suas empreitadas pelo interior...
Cozinheiras, enfermeiras, coletoras de donativos, costureiras... Cerca de 50 mil mulheres eram aguardadas para o alistamento que certamente resultaria em reforço do “caixa do estado”. Algumas delas seriam encaminhadas para o setor de “produção de material bélico leve”...
A patroa quis saber de Maria para qual departamento ela pretendia se encaminhar... A empregada não sabia dizer, e respondeu que iria para onde estivessem precisando mais... Para onde a mandassem...
(...)
A madame sentiu firmeza nas palavras da outra... Lamentou que Quintiliana não pudesse se alistar, já que tivera de viajar para participar do sepultamento do pai...
(...)
Numa outra folha de jornal, a patroa entendeu que a indústria do estado estava se adaptando aos esforços de guerra, e que as mulheres ficaram com a missão de arrecadar “ouro para o bem de São Paulo”...
Uma reprodução fotográfica mostrava ao leitor que os modernistas (Tarsila do Amaral, Anita Malfati, Mário de Andrade e Menotti Del Picchia) “marchavam com a classe média na campanha cívico-revolucionária”.
O ouro arrecadado servia a diversas finalidades... Um dos jornais informava que foram construídas Casas do Soldado e postos para prestação de socorro e outros serviços aos que se feriam em combate... Também fundaram uma “Casa da Formiga”, que ampararia os filhos dos combatentes...
(...)
A patroa de Maria tocou por um instante os próprios anéis e aliança... Parecia certo que teria de se desfazer deles...
Ela nada disse, mas a empregada em seu silencia podia imaginar o que ela pensava naquele instante...
A cidade estava mobilizada... E era isso o que se podia depreender dos jornais:

igrejas, conventos, clubes, asilos, orfanatos, hospitais, associações, bazares e alguma mansões das famílias tradicionais transformaram-se em base de apoio logístico para o exército constitucionalista. Os batalhões em traslado, muitas vezes, se abrigam nas escolas, cujas aulas foram suspensas.

Sem perder mais tempo diante da banca, a patroa locomoveu-se a passos largos em direção à chácara... Maria a acompanhou com decisão.
Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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