terça-feira, 17 de março de 2015

“A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932”, de Oswaldo Faustino – o orador Vicente Ferreira, também fundador da Legião; “negro” em vez de “homem de cor”; fragmentos de “A Folha da Noite” de 13 de maio de 1932; considerações do professor Arlindo Veiga dos Santos (em 1934) sobre o envolvimento da gente humilde na Revolução de 1932

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/03/a-legiao-negra-luta-dos-afro_14.html antes de ler esta postagem:

Da represália ao jornal A Chibata até processo no qual o doutor Joaquim Guaraná Santana se destacou na defesa dos irmãos Veiga passaram-se poucos meses...
Como sabemos, em meados de julho de 1932 o advogado retirou-se da FNB e junto com o também dissidente Vicente Ferreira (brilhante orador), fundou a Legião Negra.
Graças à capacidade de convencimento de Vicente Ferreira, muitos outros frente-negrinos deixaram a agremiação e engrossaram as fileiras da Legião Negra.
Sobre o orador, o velho Tião garantia que ele também era motivo de orgulho para a gente negra... Não saía de sua memória a ocasião em que Ferreira lhe dirigiu a palavra no salão das Classes Laboriosas... Foi ele quem o aconselhou a não aceitar ser chamado de “homem de cor”... Em vez disso, “negro” era o apropriado... Foi o próprio Ferreira quem garantiu que essa palavra era entendida como xingamento, “mas virou bandeira da garra e da força dos descendentes de africanos”.
(...)
As histórias que contavam sobre Vicente Ferreira eram interessantíssimas... Tião se divertia ao lembrar-se de um episódio de 1918 que ficou muito conhecido... Dizia-se que por ocasião do sepultamento do poeta Olavo Bilac no Cemitério São João Batista, o então desconhecido Vicente Ferreira se aproximou dos que fariam discursos... Ele estava com o seu inseparável terno marrom e parecia bem à vontade para também deixar a sua mensagem... Aconteceu que Coelho Netto, personalidade conhecida dos meios literatos e muito próxima do finado, quis impedi-lo... No mesmo instante, e sem pestanejar, Ferreira retrucou: “Larga o meu casaco, mão profana”!
Foi assim, à força, que Teixeira fez o seu discurso, o mais aclamado de todos... Um verdadeiro “banho na granfinada”.
(...)
A Folha da Noite de 13 de maio de 1932 reproduziu discurso de Vicente Ferreira sobre os 44 anos da Abolição. Era com orgulho que Tião mantinha um recorte do periódico... A seleção de Faustino evidencia trecho do documento:

Sob o patrocínio da Frente Negra, na grande data de hoje foram reservadas essas homenagens: Missa, na Igreja de Nossa Senhora dos Remédios, às 7 horas, em ação de graças pela aleluia, pela ressurreição triunfal da raça. Após a missa, concentração geral na sede central da Frente Negra Brasileira, à Rua da Liberdade, n. 196, até as 9 horas. Visita tradicional ao túmulo de Luiz Gama, José Bonifácio, o Moço, Antônio Bento, na necrópole da Consolação. Canto do Hino da Gente Negra. À noite no salão nobre, a Frente Negra inaugurará solene e festivamente um retrato de José do Patrocínio, trabalho valioso em crayon do artista negro Olavo Xavier. – O jogo que anualmente faz parte das comemorações, entre os quadros Branco e Preto, fica adiado para o dia 25.

(...)
O pensamento de Tião foi invadido pelos nomes daquelas lideranças destemidas (“Ferreira, Correia, Santana, Lucrécio, Amaral, Veiga, Gama, Patrocínio, Mahim, Rebouças, Sampaio, Assis, Barbosa, Cunha, Penteado, Nascimento, Oliveira, Cardoso...”).
Com tanta gente boa é de se admirar que o movimento não obtivesse conquistas ainda maiores... Discussões e desentendimentos impediam a unidade...
(...)
Mais uma vez Tião pensou no professor Arlindo... Estava ali um homem que merecia o seu voto para “presidir o país”... Mas é claro que aí não havia a menor possibilidade... Tião sorri uma boca sem dentes ao se lembrar de que Arlindo Veiga dos Santos abominava a República... Quem sabe não aceitaria ser aclamado imperador?
Faustino encaixa na lembrança de seu personagem o fragmento de um boletim de 1934, assinado pelo líder da FNB...
Como sabemos, a agremiação não defendeu o engajamento da gente negra na Revolução Constitucionalista, que havia terminado dois anos antes:

A gente de São Paulo que, por mal dos seus pecados e por injunções secretas, entrou sinceramente na aventura da constitucionalização (falo da gente humilde e não politiqueira, a qual não obedece aos estrangeiros e aos patrões ocultos judeu-maçônicos que sabem o quanto lhes rendem as “constituições”) está descrente daquela brincadeira. Faliu a República. Ela matará o Brasil, se nós não a matarmos antes!

Leia: A Legião Negra. Selo Negro Edições.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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