Anne perguntou aos amigos se estavam contentes com o comício que havia se encerrado... Henri e Samazelle sentenciaram com aprovação, disseram que o meeting havia sido um sucesso, um triunfo. Dubreuilh, de sua parte, disse que o evento em si não provava nada... Anne pensou que aquilo também fosse um reflexo da idade do marido... Dez anos antes havia a convicção de que o fascismo seria derrotado, mas o pós-guerra era momento em que os sacrifícios eram “inventariados”, todos haviam envelhecido e Robert, particularmente, talvez tivesse a necessidade de “certezas em curto prazo”.
Charlier anunciou a sua adesão ao SRL. Ele era um dos quadros antigos da Resistência... Apresentava um aspecto de grande debilidade física... Se no passado havia sido um dos mais suaves e insistentes entre os idealistas, revelava-se embrutecido devido aos sofrimentos dos campos (golpes, bofetadas, torturas, fome...). O velho falava dos episódios insuportáveis também de serem ouvidos... Tratava-se de um tipo disputado e dizia que o retorno às gangues socialistas era algo impensável. Em relação aos comunistas, manifestava sem rodeios a sua aversão... Aprovou o SRL e certamente engrossaria suas fileiras com muitos outros que o seguiam.

Dubreuilh entendia que os mais jovens, além de se apresentarem com cinismo, tinham pretensões marcadas pela rudeza... Talvez por isso ele viesse se revelando mais sentimental. Isso à parte notava-se que a cada dia o SRL conseguia mais adeptos... É verdade também que L’Espoir vinha perdendo muitos leitores. Era bem provável que necessitassem recorrer a Trarieux e ao seu dinheiro.
Oito milhões, uma quantia bem significativa... Mas Robert não tinha dúvidas de que o burguês concederia o dinheiro. Sabia bem que, apesar dessa certeza, precisava fazer as vezes de adulador... Um jantar havia sido combinado... Anne não estava à vontade para participar e quis saber os motivos de tão grande quantia... Robert disse qualquer coisa a respeito da gestão de Luc, que Samazelle já havia investigado a situação crítica do jornal, e que era certo que precisariam de um socorro financeiro. Na verdade Anne considerou que o sacrifício de terem de se encontrar com Trarieux só tinha sentido porque a causa era L’Espoir.
Trarieux recebeu os seus convidados em seu salão-biblioteca... Quando Anne e Robert chegaram encontraram Samazelle e a esposa... O anfitrião não exibia esposa, mas todos podiam notar uma moça que fazia a vez de companhia do milionário. O jantar deu-se numa luxuosa sala ladrilhada de preto e branco... Depois foi o café com licores... Anne ficou a observar os tipos presentes enquanto bebericavam... Observou os gestos de Trarieux, um tipo suspeito, de banalidade calculada... Também a empregada que servia o café chamou-lhe a atenção. Anne concluiu que certamente teria muito a dizer-lhe se deitasse no divã em sua clínica. Enquanto refletia sobre isso, os demais falavam sobre a Resistência e o comício... Samazelle falou da adesão maciça ao SRL e que provavelmente em um ano contariam duzentos mil adeptos... “Ou perderiam a batalha”.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/04/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_8632.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto