sexta-feira, 13 de setembro de 2019

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – empatia não é monopólio de uma cultura específica; leitura dos romances epistolares e ideia de que pessoas fora das “fronteiras sociais tradicionais” sejam nossos semelhantes; rompendo a mentalidade de que a igualdade só seria experimentada após a morte; crescimento do número de publicações às vésperas das discussões políticas sobre os direitos humanos; roteiros e a evidência de protagonismo de novos tipos sociais

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/09/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma.html antes de ler esta postagem:

A empatia é própria dos seres humanos...
Já na primeira infância vivenciamos várias situações de empatia. Certamente isso ocorre nas mais diversas culturas, pois é a interação social que propicia a experiência. Como vimos, para a autora a leitura dos romances epistolares durante o século XVIII permitiu ultrapassar as “fronteiras sociais tradicionais”. Dessa maneira, passou-se a refletir sobre as implicações psicológicas resultantes de relações entre senhores e criados, nobres e plebeus, homens e mulheres...
A leitura propiciou um primeiro contato com os sentimentos de indivíduos até então “invisíveis”... Personagens que eram tidos como meros subalternos, pelos quais nutria-se indiferença, passaram a ter seus dramas existenciais escancarados pelos livros... A partir disso passavam a ser reconhecidos como semelhantes, pois suas “emoções internas” eram idênticas e, em muitos casos, as mesmas experimentadas pelos leitores.
Hunt destaca que “sem esse processo de aprendizado, a ‘igualdade’ talvez não tivesse um significado profundo e, em particular, nenhuma consequência política”.
Para os leitores de então, “igualdade” era condição que os seres humanos eventualmente alcançariam apenas após a morte... Entendia-se que, no céu, as almas de pessoas de diferentes condições sociais poderiam ser recebidas com isonomia pelo Altíssimo... Mas isso era o máximo que se podia imaginar porque não cogitavam igualdade de direitos na terra.
Hunt lembra que a “identificação através das linhas sociais” deve ter sido incorporada de diversas maneiras pelas pessoas, mas insiste que a leitura dos romances teve sua importância. E destaca que o tipo de romance epistolar, como os que foram citados em postagens anteriores, parece estar relacionado diretamente ao “nascimento dos direitos humanos”. Para reforçar essa premissa, salienta que o citado gênero literário teve o seu boom entre 1760 e 1780, sendo que na década seguinte praticamente se extinguiu. Evidentemente esse detalhe chama a atenção.
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Na sequência, a autora retoma a importância de “Pâmela”, de Richardson (1740), e apresenta dados sobre o constante crescimento da quantidade de publicações na França até 1789. O mesmo fenômeno se verificou na Inglaterra, onde houve um salto de trinta novos romances epistolares a cada ano da década de 1770 para setenta a cada ano da década de 1790.
Para isso contribuiu o fato de mais pessoas se tornarem habilitadas para a leitura... Então, cada vez mais, um número maior de pessoas das classes mais abastadas passou a ter acesso a enredos que apresentavam a gente comum, suas dificuldades do dia-a-dia, seus problemas amorosos e no matrimônio, além da labuta por um espaço na sociedade.
Por motivos que bem conhecemos, a leitura não era hábito entre os mais pobres... Na França, o campesinato constituía 80% da população e mesmo os poucos que sabiam ler não se interessavam por romances. Apesar disso certos personagens e heroínas das páginas clássicas (como Robinson Crusoé, Tom Jones, Clarissa Harlowe e Julie d’Étanges) se tornaram populares e conhecidos até pelos que não liam. Há que se destacar ainda que durante as décadas de maiores publicações no século XVIII, criados e criadas que serviam nos centros urbanos tiveram acesso aos livros e se tornaram aficionados.
Personagens que pertenciam aos setores mais abastados da sociedade ocuparam posições centrais nos romances do século anterior (o livro cita o Dom Quixote e a princesa de Clèves) foram substituídos por “criados, marinheiros e moças da classe média”.
Aliás, estudiosos do Capitalismo observaram com atenção esse fenômeno que pode ser perfeitamente relacionado “às ambições da classe média” que se formava, “ao crescimento da esfera pública, ao surgimento da família nuclear, a uma mudança das relações de gênero e até ao surgimento do nacionalismo”.
Como já foi salientado anteriormente, neste ponto, o interesse de “A Invenção dos Direitos Humanos” se concentra nos efeitos psicológicos provocados pelos romances epistolares e de que forma eles se relacionam ao “surgimento dos direitos humanos”.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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