terça-feira, 12 de setembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – voltando à Rua da Fé, uma profunda amargura; trombando no companheiro Silvério, de Coimbra; arriscando-se a uma aventura na casa de Ernestina, da Rua do Salitre

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/09/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_89.html antes de ler esta postagem:

Na semana seguinte o Teodorico não quis saber de retornar ao casebre do Xavier... Só na outra é que decidiu que precisava conferir a condição do “parente afastado” e o da pobre família.
A noite de domingo se iniciava quando o Raposo se aproximou do local. Caía um leve chuvisco. Manteve certa distância enquanto se protegia (também dos olhares) debaixo do guarda-chuva. Mesmo assim foi notado por um senhor que foi logo lhe advertindo que o senhor Godinho havia sido levado de maca para um hospital... Isso explicava o motivo de o casebre estar totalmente fechado.


(...)

Teodorico retirou-se e desceu a rua... Sentiu-se sinceramente triste... De repente, seu guarda-chuva tocou no de outro tipo que também caminhava. Para sua surpresa o transeunte o chamou alegremente e tratou-o por “Raposão”. No mesmo instante ele concluiu que só podia ser alguém que o conhecia de Coimbra.
Então reconheceu um de seus colegas de hospedagem da casa das Pimentas. Era o Silvério, a quem os mais chegados chamavam de Rinchão. Este tipo estava passando o mês junto ao tio, o muito rico barão de Alconchel, grande proprietário no Alentejo...
Silvério seguia para a casa de certa Ernestina, jovenzinha loira que vivia na rua do Salitre. Ele convidou o amigo Raposão, pois com a Ernestina vivia a Adélia, “um mulherão!”
(...)
O problema de Teodorico era que devia se recolher às oito horas... Tia Patrocínio não perdoaria atrasos... Mas o Silvério falava como se o estivesse tentando... O tipo contou sobre a “brancura dos braços da Adélia”, e isso deixou o rapaz abalado.
Os dois compraram pastéis e uma garrafa de vinho da Madeira... Logo chegaram à casa da garota. Adélia estava acomodada no sofá, vestia saia branca e tinha os pés descalços. A moça fumava “um cigarro lânguido”... Ernestina costurava o elástico de suas botinas.
Teodorico não demorou a se sentar do lado da Adélia. Permaneceu em silêncio, com o guarda-chuva entre as pernas... Notava-se seu acanhamento. Mas aconteceu que Ernestina e Silvério se retiraram abraçados para a cozinha em busca de copos. Ele resolveu trocar umas palavras com a beldade.
Ela contou que era de Lamego, bem mais ao norte do país... Teodorico estava mesmo sem jeito e disse qualquer coisa a respeito da tristeza que o tempo chuvoso trazia. Adélia chamou-o “cavalheiro” e pediu-lhe novo cigarro... Os movimentos dela faziam escorregar as mangas de seu roupão, e isso revelava-lhe os braços brancos e macios. Ele pôde certificar que o Silvério tinha razão, Adélia era mesmo “um mulherão”.
(...)
Aos poucos, Teodorico sentiu-se mais à vontade... Ela quis saber como se chamava e ele disse-lhe o nome no instante mesmo em que oferecia dos pastéis que estavam no prato preparado pela Ernestina. Na sequência, Adélia revelou que tinha um sobrinho que também se chamava Teodorico.
A garota sorriu e sugeriu-lhe que se apartasse do guarda-chuva. Por que ele não o deixava a um canto da sala? Teodorico arranjou uma desculpa espirituosa e disse que era porque não pretendia se afastar dela por “nem um instantinho”.
Ela fez uma cócega lenta em seu pescoço... Teodorico se inspirou e tomou o resto de vinho que ela deixou no copo... Ernestina acomodou-se nos joelhos de Silvério e cantou um fado... A noite prometia...
Adélia aproximou o rosto junto ao de Teodorico e ofereceu-lhe um beijo que o abalou profundamente.
Mas a hora avançara... Foi quase que por acidente que Teodorico notou que os ponteiros do relógio da casa acusavam as dez da noite.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/09/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_14.html
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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