quinta-feira, 7 de setembro de 2017

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – Maria do Patrocínio, a Titi de aspecto carrancudo e lúgubre; Vincência, a criada; padres Casimiro e Pinheiro, doutor Margaride, frequentadores da casa; conselhos a respeito da obediência à tia

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/09/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_82.html antes de ler esta postagem:

No pátio do casarão, o seu Matias recolocou o pequeno Teodorico no chão. O menino notou uma moça gorda tratando com um tipo que trazia uma capa escarlate às costas... Ele estava ali para recolher a oferta da casa para a “missa das almas”.
(...)
A propriedade pertencia à tia Maria do Patrocínio, que acolheria o sobrinho órfão. A moça gorda era a criada Vicência, que subiu a escada conversando com o seu Matias. O menino foi conduzido pela mão até a sala onde a tia o aguardava.
A mulher se destacava pela secura e alta estatura. Ela tinha ares severos, usava um vestido preto e ostentava uma grossa corrente de ouro... Sua figura chamava ainda mais atenção devido ao aspecto lúgubre da sala com paredes revestidas com papéis escuros... No queixo da tia via-se um lenço roxo e sua fisionomia de enlutada se completava com o véu negro que pendia de sua testa. Também os seus “óculos de lentes defumadas” chamavam a atenção.
(...)
Respirava-se um catolicismo severo e penitente naquela sala. O acanhado Teodorico sentiu-se ainda mais diminuído ao contemplar o quadro em que se via Nossa Senhora das Dores com as espadas espetadas em seu peito.
Matias apresentou a tia Maria do Patrocínio ao garoto... Disse que aquela era a “Titi”... Emendou que era “necessário gostar muito da Titi” e sempre dizer-lhe sim. A magra senhora baixou-se para beijar o sobrinho... Um beijo frio, vago e seguido de repúdio.
Ela protestou com um “credo!” e dirigiu-se à Vicência observando que, ao que tudo indicava, haviam embatumado o cabelo do menino com azeite... O pequeno Teodorico tremeu-se todo e afirmou à Titi que era verdade o que ela dizia.
Seu Matias quis remediar a situação dizendo que o menino se comportara bem durante a viagem, que era limpo e que manteve compostura durante as refeições nas estalagens do caminho.
A senhora Patrocínio mostrou-se indiferente e disse que só faltava o menino não saber como se comportar... Principalmente na condição em que se encontrava! Tão novo e dependente da benevolência dela! Na sequência ordenou que Vincência o levasse para o asseio... Acrescentou que era preciso conferir se ele sabia “fazer o sinal da cruz”.
(...)
O seu Matias se despediu... Vicência tratou de cuidar de suas obrigações para com o menino.
Naquela mesma noite, a criada providenciou roupas limpas para ele, que passou a usar um fato de veludo... Depois foi levado para uma sala que chamava a atenção pelas muitas cortinas instaladas. Havia mesas que tinham os pés dourados que lembravam as colunas dos altares.
A tia Maria do Patrocínio estava no centro do amplo cômodo. Trajava indumentária escura e tinha os dedos magros cheios de anéis... Dois padres estavam acomodados em cadeiras e conversavam... O mais velho, Padre Casimiro, era risonho e tinha os cabelos brancos e encaracolados... Ele desviou os olhos para Teodorico com certa ternura... O outro, Padre Pinheiro, era moreno e tinha uma feição triste... Este apenas o saudou com as “boas-noites”.
Além dos dois religiosos, havia um homem miúdo e bem escanhoado, o senhor José Justino, que era secretário da confraria de São José, e “tabelião de Maria do Patrocínio”. Este ostentava grandes colarinhos e observava com atenção as estampas de um livro. Ao cumprimentar o menino, sua luneta escorregou-lhe do nariz.
Os três tipos beijaram o pequeno Teodorico. O padre triste perguntou-lhe o nome... Ele disse que se chamava “Tedrico”. O Padre Casimiro ensinou-lhe a pronunciar o nome separando as sílabas para não errar mais.
(...)
Por algum tempo os adultos conversaram a respeito da aparência do garoto e chegaram à conclusão de que ele se parecia com a mãe, Dona Rosa, irmã de Maria do Patrocínio... Essa agradeceu a Deus e disse com alívio que não havia nada do Raposo no pequeno.
O senhor José Justino perguntou a Teodorico se ele já estava sentindo saudade de Viana... Sua resposta foi afirmativa.
Nesse momento, o Padre Casimiro se aproximou para recomendar que ele “fosse temente a Deus, quietinho em casa, sempre obediente à Titi”... Então devia “dizer sempre que sim à Titi”.
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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