Mesmo a ideia de Henri sobre a “decepção” anunciada pela cartomante (de que se algo de errado ocorresse poderia ser com o vestido encomendado por ela) a entristecia... O que vestiria para o jantar? Henri achava graça daquela frustração burguesa por algo tão pequeno...
Josette se mostrou encantada com o “modo gentil de arranjar as coisas” de Henri... Para ela, era uma pena que Deus não lhe cedesse o dom de “determinar as coisas”. Ficaram bem próximos um do outro e Henri tomou-a nos braços.
(...)
No parágrafo seguinte vemos
Perron despertando ao lado de sua pequena Josette... Estava feliz... Não queria
interromper o sono dela, mas logo ela também despertou e o impediu de seguir
para o bar, onde esperava tomar café.
Josette fez questão de fazer-lhe um chá...
Abraçaram-se e trocaram palavras descompromissadas... Ela a chamava de “meu
pequeno fauno” e ela protestava dizendo que, então, era uma “fauna”. O estado
de graça era tal que Henri poderia chamar à sua parceira de “princesa persa,
pequena índia, raposa, trepadeira”...
Enquanto tomavam chá, ele se perguntava como é que a moça que se vestia
tão bem poderia viver num ambiente de decoração tão sem harmonia... Ficou
sabendo que Lulu “havia ajudado na instalação". Gostaria de fazer-lhe
perguntas sobre o seu modo de vida, mas disse apenas que tudo era bem bonito
ali...
Depois Perron sugeriu que passeassem a pé pelas ruas... Por algum tempo
Josette se dedicou a abrir gavetas e a remexer em roupas para definir o que
vestiria... Caminhar pelas ruas a passeio (às nove da manhã) não era programa
habitual para ela.
A moça se vestia e se exibia para Henri com ares de
preocupada, sem saber se estava agradando ou não. De sua parte, Henri pensava
apenas em como ela se sentia internamente e se a noite havia sido satisfatória
para ela... Ele significava algo para ela?
(...)
Henri apontou para o seu romance que estava a um canto e perguntou-lhe
se havia lido. Ela respondeu que não, pois tinha dificuldades para ler e logo a
sua mente a conduzia a devaneios, perdendo completamente o sentido da
leitura...
Ele quis detalhes a esse respeito, mas ela mesma não sabia definir o que
ocorria... Então a pergunta seguinte foi sobre se ela já havia se apaixonado
muitas vezes... Josette deu de ombros, enquanto ele insistia que muitos
deveriam ter se apaixonado por ela, que era tão linda.
Josette inspirava compaixão em Henri... Uma moça delicada, que não
trabalhava e “tinha mãos de senhorita”... Tão vulnerável... Ela estranhando
andar pelas ruas àquela hora do dia; ele estranhando tê-la como companhia... A
moça tinha certa dificuldade de caminhar com sapatos altos e tropeçava várias
vezes... Henri quis saber a sua idade e ela disse que tinha 21... Ele insistiu
para que dissesse a idade verdadeira. Então Josette confessou que contava 26
anos, mas pediu que não falasse nada a respeito daquela revelação à sua mãe.
Henri deixou-a tranquila, disse que já havia esquecido aquela conversa.
Emendou que a aparência dela era de muito jovem... Josette esclareceu que se
cuidava muito, porém isso a fatigava...
Os dois caminhavam de
braços dela e ela apertava.
(...)
Henri se sentia muito bem em poder caminhar com a bela Josette... Pediu
a ela que não se fatigasse, e perguntou se o seu desejo de representar era
antigo... A moça respondeu que nunca quis ser manequim e que não gostava de
homens mais velhos.
Então concluía que Lulu devia escolher os
amantes da filha... Podia ser mesmo que nunca tivesse se apaixonado... Pensava
nessas coisas e também no significado que ele poderia ter para ela... A noite
havia sido bem significativa, então esses escrúpulos o acompanhavam.
Continua em http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2013/11/os-mandarins-de-simone-de-beauvoir_30.html
Leia: Os Mandarins. Editora Nova Fronteira.
Um abraço,
Prof.Gilberto