sexta-feira, 8 de novembro de 2019

“A Invenção dos Direitos Humanos – uma história”, de Lynn Hunt – sobre “Procissão para Tyburn”, de Willian Hogarth, e o costumeiro tumulto durante as execuções; indignações de ingleses esclarecidos sobre o espetáculo do horror em Tyburn; fragmentos de “Morning Post” a respeito de uma execução durante o inverno de 1776; fragmentos de relatos ingleses acerca de execuções em Paris

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/11/a-invencao-dos-direitos-humanos-uma_6.html antes de ler esta postagem:

Como já se destacou anteriormente, Tyburn era o vilarejo inglês para onde acorriam centenas de pessoas sempre que ocorria uma execução... Em “A Invenção dos Direitos Humanos” há uma reprodução de “Procissão para Tyburn”, gravura 11 de uma série (“Atividade e Ociosidade”) elaborada por Willian Hogarth (1747). A ilustração apresenta uma cena que antecede o enforcamento do jovem Thomas Idle, o “aprendiz ocioso”.
Os detalhes destacados pelo artista nos dão uma ideia do que acontecia nessas ocasiões. Notamos uma grande multidão ansiosa pelo momento fatal... A movimentação do populacho se evidencia em primeiro plano, enquanto a forca está localizada mais ao fundo e à direita. Notamos uma tribuna utilizada para os que desejavam uma visão melhor do acontecimento... O condenado segue numa carroça e lê a Bíblia enquanto o veículo avança com dificuldade em meio às pessoas... O seu caixão segue na mesma carroça. Há um religioso metodista que o acompanha proferindo discursos de ordem moral. Vemos um vendedor de bolos que se esforça para oferecer seu produto aos que conseguiram bons lugares... Quatro velas dispostas junto ao cesto indicam que ele chegou antes do alvorecer. Ocupado com sua tarefa, nem percebe que um menino lhe tira a carteira... Uma mulher vende gim de uma garrafa que traz num cestinho amarrado na cintura. Num canto está um tipo que segura um cachorro pelo rabo e dá a entender que o lançará sobre o pregador que acompanha Thomas Idle. A miséria salta aos olhos, há uma atmosfera de potencial distúrbio, mas os soldados que acompanham o cortejo parecem não ter condições de manter a ordem.
A reprodução exposta nesta página foi extraída de britishmuseum.org (nesta data, às 18:44).
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Destacamos na postagem anterior que as ocasiões em que se processavam as execuções eram vistas como festivas por muita gente... Todavia, vários documentos destacam que as grandes concentrações eram imprevisíveis e não raro resultavam em bebedeiras e devassidão.
As pessoas mais esclarecidas da Inglaterra mostravam-se chocadas com as constantes demonstrações de barbárie a cada “procissão a Tyburn”... Cartas relatam a desaprovação de pouco caso da gente comum aos clérigos. Sem o menor respeito, ridicularizavam os religiosos que acompanhavam os condenados! Também não podiam aceitar que os aprendizes vinculados a cirurgiões se envolvessem em brigas com os amigos e familiares dos executados na disputa pelos cadáveres.
Era de se esperar que as pessoas lamentassem o sofrimento e que sentissem compaixão pelos executados, mas em vez disso pareciam vibrar de prazer. O livro destaca um trecho do “Morning Post”, de Londres, a respeito da postura da multidão durante um enforcamento que ocorreu no inverno de 1776:

                   “A multidão impiedosa se comportava com uma indecência extremamente desumana – gritando, rindo, atirando bolas de neve uns nos outros, principalmente naqueles poucos que manifestavam uma compaixão apropriada pelas desgraças de seus semelhantes”.

A concentração de pessoas dispostas a acompanhar as execuções penais era sempre muito grande. Mesmo quando acontecia de ser mais moderada no tocante às manifestações violentas e ultrajantes, a grande quantidade era sempre motivo de preocupações. “A Invenção dos Direitos Humanos” destaca as impressões de um britânico que teve oportunidade de assistir a uma execução em Paris (1787) pelo suplício da roda. Segue um fragmento de seu relato:

                   “O barulho da multidão era como o murmúrio rouco causado pelas ondas do mar quebrando ao longo de uma costa rochosa: por um momento amainava; e num silêncio terrível a multidão contemplava o carrasco pegar uma barra de ferro e dar início à tragédia, golpeando o antebraço da vítima”.

Entre os espectadores sempre havia muitas mulheres... E isso também era motivo de espanto para os observadores ingleses:

                   “É espantoso que a parte mais delicada da criação, cujos sentimentos são tão requintadamente ternos e refinados, venha em grandes números para ver um espetáculo tão sangrento; mas, sem dúvida, é a piedade, a compaixão bondosa que sentem o que as torna tão ansiosas sobre as torturas infligidas a nossos semelhantes”.

As observações desse trecho final não sintetizam exatamente o sentimento das mulheres que se esforçavam para presenciar as execuções.
Leia: A Invenção dos Direitos Humanos. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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