segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018

“A Relíquia”, de Eça de Queiroz – da “Biblioteca Universal” – outra fracassada investida amorosa; últimos passeios com Topsius; despedindo-se das mulheres da rua suspeita e da loja da Maricocas; os dois companheiros se apartam e Teodorico segue confiante de que a falsa relíquia convencerá a tia carola; cruzando o caminho da jovem religiosa uma última vez antes de embarcar no Cid Campeador

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2018/02/a-reliquia-de-eca-de-queiroz-da_11.html antes de ler esta postagem:

Mas não é que Teodorico achou que devia se aproximar da jovem religiosa?
A sorte parecia favorecê-lo... Ele viu que a madre rechonchuda, que parecia ser a superiora, não a acompanhava. De repente, Teodorico achou que não tinha por que não arriscar uma conquista amorosa ali mesmo... Seria a oportunidade de ter entre os braços a monja indefesa. Foi por isso que ele decidiu se acercar-se dela para dizer-lhe algo.
Teodorico diria que estava enamorado pela “irmãzinha”... Todo empolgado e a torcer os bigodes, caminhou em sua direção. A jovem instalara-se num banco para rezar o rosário.
Tudo parecia se encaminhar para o encontro... Mas de repente as ondas do Mar de Tiro agitaram  fortemente a embarcação e trouxeram enjoo ao estômago do valente enamorado, que não teve outra reação a não ser a de correr para a borda e despejar a imundície de seu vômito nas águas azuis.
(...)
Depois de passar pela vexatória situação, Teodorico dirigiu-se à cabine e atirou-se no beliche... Permaneceu estirado até que sentiu que a embarcação passava por águas mais calmas.
Ao voltar ao tombadilho, reconheceu as terras egípcias e suas areias quentes e da cor de leão... Avistou os longos minaretes visitados por pombos e o palácio entre palmeiras...
O farol continuava imponente e em sua posição... À maravilhosa construção, o doutor Topsius dispensava umas palavras de grande sabedoria. Enquanto isso, a jovem e pálida religiosa deixava a embarcação...
Teodorico pensou que a pequena pomba escapara porque o grande milhafre “havia fechado a asa no instante em que partia para o ataque e caia enjoado”.
(...)
Instalaram-se novamente no Hotel das Pirâmides...
À tarde, Teodorico ficou sabendo que o vapor El Cid Campeador partiria nas primeiras horas do dia seguinte para Portugal carregado de gado.
Deu tempo para um último passeio de carruagem ao lado do companheiro alemão às margens do canal do Mamudiê... Depois, por umas poucas horas prazerosas, caminhou por uma rua iluminada parcamente por bicos de gás desprotegidos de globo...
Ali, as casas eram baixas e de madeira... A maioria delas era fechada apenas por uma cortina branca. A atmosfera estava impregnada pelo cheiro de alho e de sândalo... Em frente às casinhas, mulheres estavam vestidas “em camisa” e se acomodavam sobre esteiras exibindo as flores que traziam nas tranças. Havia sempre as que se esforçavam num sofrível inglês ou francês e arriscavam convidá-los.
Os registros não deixam claro se Teodorico e Topsius aventuraram-se com as oferecidas alexandrinas... Apontam simplesmente que o rapaz recolheu-se “exausto e já bem tarde”... No caminho para o Hotel, passou pela Rua das Duas Irmãs e, ao avistar a loja onde conhecera Mary, resolveu desferir um golpe de bengala na porta.
(...)
Bem cedo, Teodorico seguiu para a alfândega...
Topsius o acompanhou para se despedir. Os dois trocaram um longo abraço e logo que se apartaram, o Raposo ditou seu endereço, “Campo de Santana, 47”... O alemão deu a entender que em breve lhe escreveria e enviaria os trinta mil-réis que ficara lhe devendo.
Como que a colocar fim aos “assuntos de pecúnia”, Teodorico abraçou o companheiro uma última vez. Depois ingressou no bote que o levou ao Cid Campeador... Enquanto fazia isso, consultou o amigo mais uma vez a respeito da preciosa relíquia que levava para a tia... Podia mesmo dizer a ela que se tratava da “verdadeira coroa”?
O alemão levantou os braços e garantiu que ele podia dizer que “foi a mesmíssima, espinho por espinho”... Podia dizer isso em nome do cientista que conhecera durante a viagem...
(...)
Os companheiros beijaram-se nas faces...
Os remadores levaram o bote para junto do vapor.
Com todo o cuidado, o rapaz depositou a relíquia sobre os joelhos... Graças a uma pequena vela, a travessia estava sendo vencida com rapidez. E foi assim que o bote que o levava passou por outro que conduzia a jovem religiosa para os lados do palácio cercado de palmeiras. Teodorico encheu-se de coragem, levantou-se e gritou chamando-a “filhinha e namoradeira”...
Mas ficou nisso... Cada um foi para o seu lado...
Talvez os dois formassem um belo casal... Mas o mundo leva consigo muitas imperfeições...
A jovem rumaria para o convento de sua congregação... Ele voltaria para a tia.
Leia: A Relíquia – Coleção “Biblioteca Universal”. Editora Três.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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