sexta-feira, 16 de setembro de 2016

“O Homem Duplicado”, de José Saramago – Maria quer discutir a relação; longo e sufocante beijo; Tertuliano se enrola ao tentar evitar magoá-la e que ela conheça o seu “laboratório”; um “trabalho sociológico” que precisa ser explicado; a relação deve ser discutida

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2016/09/o-homem-duplicado-de-jose-saramago-tres.html antes de ler esta postagem:

A ofegante Maria da Paz tentou dizer algo manifestando a sua convicção sobre o que acabavam de fazer... Tertuliano a interrompeu garantindo que não deviam sentir vergonha de nada, pois não havia motivo para isso... Simplesmente ela havia entrado e o casal pôs-se a se beijar... Isso não era natural?
Maria queria dizer que a iniciativa fora dela... Ela achava que talvez o namorado a entendesse como ousada demais. Tertuliano quis tranquilizá-la ao afirmar que ele também a beijou... Mas para a moça a questão se resumia ao fato de Tertuliano não ter tido chance de escapar da iniciativa dela.
(...)
Depois ela concordou que estava sendo um pouco exagerada... Também porque decidira visitá-lo sem prévio aviso... Isso não era certo... Além do mais ter abraçado e beijado a quem não mais a amava... Só mesmo “por caridade” ele não a repulsara e estava a minimizar a situação.
Tertuliano ouviu as palavras de Maria... Estava pensando sobre a necessidade de se livrar dela por causa das fitas e também porque já fazia algum tempo que pretendia colocar um fim na relação... Mas em vez de dar esse tipo de encaminhamento, disse que não sabia de onde a moça havia tirado aquela conclusão... Dizer-lhe que não mais a amava!
A moça respondeu que no último encontro ele havia sido claro a este respeito... Tertuliano redarguiu com firmeza garantindo que nunca dissera que não gostava dela... Ela explicou que certas coisas não precisam ser ditas para que se entenda o essencial.
É claro... Tudo o que dissera só podia dar a entender que gostava dela...
(...)
Talvez Tertuliano estivesse preparando o terreno para suavizar o impacto do rompimento... Talvez pretendesse ganhar tempo para livrar-se momentaneamente dela para dar um jeito nas fitas.
A verdade é que ele não parecia administrar bem os pensamentos e as tomadas de decisão sobre os passos que daria até concluir o que pretendia... Temos a impressão de que, em vez de resolver-se logo com Maria, o rapaz afundava-se a cada minuto num beco sem saída.
(...)
Então aconteceu que Maria deu alguns passos para o interior da sala...
As palavras do amado mudaram o seu humor... Sorriu e virou-se para ele como quem está pronta para atirar-se aos seus braços. Definitivamente não era a mesma pessoa que havia chegado com inúmeras dúvidas a respeito da relação...
Todavia o aparelho de televisão estava ligado... Isso lhe chamou a atenção... Desviando um pouco mais o olhar constatou as fitas enfileiradas no chão...
Maria da Paz disparou o seu espanto ao notar a grande quantidade de vídeos... Ela conhecia bem os hábitos de Tertuliano... Não tinha o costume de deixar os aparelhos funcionando à toa... Tampouco era cinéfilo!
Mas o que será que o namorado pretendia com todas aquelas fitas? A pergunta foi inevitável...
Tertuliano respondeu que se tratava de um material com o qual vinha trabalhando ultimamente... Maria não se convenceu... Devolveu-lhe que sempre soube que o seu ofício era o de ministrar aulas de História... Leu a identificação do filme e emendou que “Paralelo do Terror” não tinha muito a ver com a “especialidade” dele.
Ele explicou que não significa que, porque era professor, tinha de se dedicar apenas às aulas... Maria disse que só podia ter se espantado todas aquelas fitas... Será que repentinamente o rapaz fora contagiado por desmedida paixão pelo cinema? Desde que se conheciam manifestara pouco ou nenhum interesse!
(...)
O professor disse que desenvolvia um “trabalho sociológico”... Maria o interrompeu dizendo que não passava de simples funcionária bancária, mas tinha entendimento suficiente para saber que o namorado não estava sendo sincero.
Tertuliano não gostou do que ouviu e mostrou sua indignação... Então ela dizia que ele não era sincero? Isso significava obviamente que, no entendimento dela, ele devia estar escondendo algo ou mentindo...
O rapaz admitiu que não fosse perfeito... Mas ela devia saber que ele não faltava com a sinceridade... Esse defeito ele não tinha!
Maria pediu desculpa... Ele aceitou, mas deixou claro que não falariam mais do assunto...
(...)
Talvez fosse melhor prosseguir aquela conversa... Assim evitaria voltar a tratar do outro assunto (o rompimento da relação), do qual parecia fugir também...
Maria acomodou-se em frente da televisão...
Disse que o que a levava ali era outra coisa...
Aqueles vídeos todos não a interessavam.
Leia: O Homem Duplicado. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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