domingo, 8 de novembro de 2015

“A Guerra do Futebol”, de Ryszard Kapuscinski – um dia no hotel Metropol – Parte III; Nadir Khouri, um play boy libanês; o Grande Khouri, velho de grande fortuna no Líbano e em Gana; o “intelectual” beberrão e escritor de cartas; o pequeno, barrigudo sexagenário Napoleão considerava-se jovem; de como Kapuscinski foi parar no Metropol

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/11/a-guerra-do-futebol-de-ryszard_29.html antes de ler esta postagem:

Nadir, o Jovem Khouri, era um moço sustentado pelo pai... Sua vida era a mais pura diversão... Possuía carros em Paris, Roma e Londres. Viajava constantemente, e foi num voo em que retornava para Gana que acabou conhecendo o jornalista polonês.
Kapuscinski o considerava um bobalhão... Certa vez, no Metropol, o tipo propôs que o acompanhasse à Austrália. Kapuscinski explicou que não tinha a menor condição, pois estava trabalhando e não tinha dinheiro para extravagâncias... O rapaz sugeriu que ele “escrevesse ao pai pedindo-lhe dinheiro”.
(...)
O Jovem Khouri tinha realmente tudo... Seu pai o amava e não media esforços para proporcionar-lhe o necessário para curtir a vida.
O Velho Khouri vivia numa casa precária em Nsawam, lugarejo perto de Acra. Kapuscinski se impressionava com a história daquele homem que, provavelmente, devia ser o habitante “mais rico de toda a África Ocidental”...
Em Beirute, onde começou a construir seu capital desde a época em que fora camelô, possuía uma rua inteira. Era certo que seus parentes tocavam os negócios, porém ele mesmo jamais conheceria as lojas que possuía no Líbano.
Quando Kapuscinski escreveu a respeito do pai de Nadir, o homem já era idoso em avançada idade... O autor não arriscava dizer que o Grande Khouri estaria vivo ao final daquele ano. Mas era certo que o velho possuía uma disciplina severa e nunca sustentou exacerbados desejos de consumo...
O Grande Khouri era analfabeto e por isso mesmo confiava em certo “tipo intelectual” por quem o jovem Nadir nutria grande respeito. Kapuscinski o conhecera porque ele também era hóspede no Metropol. 
(...)
Além de ser um bebedor de respeito, o “tipo intelectual” gostava de dizer piadas. Sempre mostrava uma fotografia em que se via uma senhora acomodada sob um guarda-sol... Dizia que ela vivia na Califórnia e que era sua namorada... Não se encontravam há quinze anos e, se dependesse dele, ela ficaria a esperá-lo por mais quinze, se cansaria e morreria.
Falava essas bobagens e gargalhava. Sua bebedeira se dava às escondidas, em seu quarto, pois considerava “falta de cultura” e deselegância embriagar-se em público... Normalmente se retirava e, depois de esvaziar a garrafa, caía e dormia no chão mesmo porque nunca alcançava a cama.
(...)
Outra figura conhecida do hotel era Napoleão, um tipo pequeno e barrigudo que sempre discutia com o intelectual quando este não estava ocupado com as cartas comerciais do Velho Khouri... Napoleão falava de sua saudade de casa...
Esse hóspede não deixava a balsa-hotel. Gostava de perambular pela varanda a gabar-se de sua “aparência jovem” apesar de contar sessenta anos... Papa brincava e dizia que ele aparentava ter apenas “vinte anos”... Napoleão encolhia a barriga e disfarçava rugas e as veias da têmpora para se exibir.
Mas um belo dia Napoleão despareceu... Todos sentiram falta dele... A varanda tornou-se mais silenciosa.
(...)
O Metropol era essa espelunca incrustrada no Kokompe, o bairro negro e pobre... Para os habitantes locais aqueles hóspedes todos pertenciam ao “mundo dos brancos”... Mas os brancos ricos do Cantonments desprezavam a balsa, verdadeira vergonha que devia ser ignorada por eles.
Kapuscinski faz referência às sombras que pareciam flutuar pela balsa... Aquilo não assustava os hóspedes... Aquilo não tinha a menor importância! Wally perguntava o que poderia ter importância, afinal...
Ninguém lhe respondia coisa alguma.
(...)
Depois de apresentar a precariedade do Metropol e um pouco de seus personagens, Kapuscinski explica como foi parar ali.
Ele conta que em 1958 voava de Londres para Acra... Sabemos que o seu ofício de repórter da agência estatal polonesa de informações o colocara no “Super-Constellation, das linhas aéreas britânicas”.
Sua condição era das mais precárias... Não conhecia Gana ou qualquer pessoa no país africano... Contava com pouco dinheiro para se arranjar.
Mas aconteceu de acomodar-se numa poltrona próxima à de um árabe e à de uma “loira escandinava”... Em síntese, pode-se dizer que o rapaz era o Jovem Khouri, Nadir, que insistia em insinuar-se à garota... Ele afirmava que possuía muito dinheiro e que estava disposto a casar-se com ela...
A loira deixou claro que estava indo ao encontro do namorado, que era um técnico a serviço do governo. Enfurecida, retirou-se para posicionar-se em outro lugar.
(...)
Nadir apresentou-se para Kapuscinski, que teve de explicar que era um repórter polonês a caminho de Gana, onde andaria pelo país, faria perguntas, escreveria...
O Jovem Khouri indicou-lhe o Metropol... Um hotel “talvez não excelente, mas bom”.
Ao aterrissarem, o rapaz conduziu o jornalista até o hotel administrado por Habib Zacca.
Leia: A Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

Páginas