Nadir, o Jovem Khouri, era um moço sustentado pelo pai... Sua vida era a mais pura diversão... Possuía carros em Paris, Roma e Londres. Viajava constantemente, e foi num voo em que retornava para Gana que acabou conhecendo o jornalista polonês.
Kapuscinski o considerava um bobalhão... Certa vez, no Metropol, o tipo propôs que o acompanhasse à Austrália. Kapuscinski explicou que não tinha a menor condição, pois estava trabalhando e não tinha dinheiro para extravagâncias... O rapaz sugeriu que ele “escrevesse ao pai pedindo-lhe dinheiro”.
(...)
O Jovem Khouri tinha
realmente tudo... Seu pai o amava e não media esforços para proporcionar-lhe o
necessário para curtir a vida.
O Velho Khouri vivia numa casa precária em Nsawam,
lugarejo perto de Acra. Kapuscinski se impressionava com a história daquele
homem que, provavelmente, devia ser o habitante “mais rico de toda a África
Ocidental”...
Em Beirute, onde começou a construir seu capital desde a época em que
fora camelô, possuía uma rua inteira. Era certo que seus parentes tocavam os
negócios, porém ele mesmo jamais conheceria as lojas que possuía no Líbano.
Quando Kapuscinski escreveu a respeito do pai de
Nadir, o homem já era idoso em avançada idade... O autor não arriscava dizer
que o Grande Khouri estaria vivo ao final daquele ano. Mas era certo que o velho
possuía uma disciplina severa e nunca sustentou exacerbados desejos de consumo...
O Grande Khouri era analfabeto e por isso mesmo confiava em certo “tipo intelectual”
por quem o jovem Nadir nutria grande respeito. Kapuscinski o conhecera porque
ele também era hóspede no Metropol.
(...)
Além de ser um bebedor de respeito, o “tipo intelectual” gostava de
dizer piadas. Sempre mostrava uma fotografia em que se via uma senhora
acomodada sob um guarda-sol... Dizia que ela vivia na Califórnia e que era sua
namorada... Não se encontravam há quinze anos e, se dependesse dele, ela
ficaria a esperá-lo por mais quinze, se cansaria e morreria.
Falava essas bobagens e gargalhava. Sua bebedeira se dava às escondidas,
em seu quarto, pois considerava “falta de cultura” e deselegância embriagar-se
em público... Normalmente se retirava e, depois de esvaziar a garrafa, caía e
dormia no chão mesmo porque nunca alcançava a cama.
(...)
Outra figura conhecida do hotel era Napoleão, um tipo pequeno e
barrigudo que sempre discutia com o intelectual quando este não estava ocupado
com as cartas comerciais do Velho Khouri... Napoleão falava de sua saudade de
casa...
Esse hóspede não deixava a
balsa-hotel. Gostava de perambular pela varanda a gabar-se de sua “aparência
jovem” apesar de contar sessenta anos... Papa brincava e dizia que ele
aparentava ter apenas “vinte anos”... Napoleão encolhia a barriga e disfarçava
rugas e as veias da têmpora para se exibir.
Mas um belo dia Napoleão
despareceu... Todos sentiram falta dele... A varanda tornou-se mais silenciosa.
(...)
O Metropol era essa
espelunca incrustrada no Kokompe, o bairro negro e pobre... Para os habitantes
locais aqueles hóspedes todos pertenciam ao “mundo dos brancos”... Mas os
brancos ricos do Cantonments desprezavam a balsa, verdadeira vergonha que devia
ser ignorada por eles.
Kapuscinski faz referência às sombras que pareciam flutuar pela balsa...
Aquilo não assustava os hóspedes... Aquilo não tinha a menor importância! Wally
perguntava o que poderia ter importância, afinal...
Ninguém lhe respondia coisa
alguma.
(...)
Depois de apresentar a
precariedade do Metropol e um pouco de seus personagens, Kapuscinski explica
como foi parar ali.
Ele conta que em 1958 voava de Londres para Acra...
Sabemos que o seu ofício de repórter da agência estatal polonesa de informações
o colocara no “Super-Constellation, das
linhas aéreas britânicas”.
Sua condição era das mais precárias... Não conhecia Gana ou qualquer
pessoa no país africano... Contava com pouco dinheiro para se arranjar.
Mas aconteceu de acomodar-se numa poltrona próxima à
de um árabe e à de uma “loira escandinava”... Em síntese, pode-se dizer que o rapaz
era o Jovem Khouri, Nadir, que insistia em insinuar-se à garota... Ele afirmava
que possuía muito dinheiro e que estava disposto a casar-se com ela...
A loira deixou claro que estava indo ao encontro do namorado, que era um
técnico a serviço do governo. Enfurecida, retirou-se para posicionar-se em
outro lugar.
(...)
Nadir apresentou-se para Kapuscinski, que teve de explicar que era um
repórter polonês a caminho de Gana, onde andaria pelo país, faria perguntas,
escreveria...
O Jovem Khouri indicou-lhe
o Metropol... Um hotel “talvez não excelente, mas bom”.
Ao aterrissarem, o rapaz conduziu o jornalista
até o hotel administrado por Habib Zacca.
Leia: A
Guerra do Futebol. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto