quarta-feira, 19 de julho de 2017

“Minha Vida de Menina”, de Helena Morley – registros de 14 de dezembro de 1895; rara reunião na chácara por ocasião do aniversário de Dindinha; impossibilidade de estudar os pontos de Corografia; sobre o retorno de João Antônio à cidade e as dificuldades dos jovens para “tocar a vida” sem terem formação concluída; opinião de seu Alexandre a respeito do distanciamento dos moços da família em relação ao trabalho; início das férias de Sérgio e seu discurso em homenagem à madrinha

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/07/minha-vida-de-menina-de-helena-morley_19.html antes de ler esta postagem:

Em seus registros de 14 de dezembro de 1895, Helena comenta sobre o aniversário da tia Didinha no dia anterior. Houve comemoração e foi por isso que ela chegou tarde em casa, sem tempo para estudar os pontos de “Corografia” (uma matéria vinculada aos estudos da Geografia).
Quem marcou presença na reunião de família foi João Antônio, moço criado pela Dindinha e que vivia no Rio de Janeiro, onde estudava. A morte de dona Teodora inviabilizara a continuidade de seus estudos, por isso ele resolveu retornar para Diamantina.
Helena dá a entender que o rapaz era inteligente e que poderia arrumar um emprego na capital do país para terminar a formação... Mas não foi isso o que decidiu.
Aquele era um típico exemplo que levava a menina a pensar sobre como mudara de opinião sobre as condições existenciais dos homens e das mulheres... Quando era mais nova, Helena invejava os meninos, e até imaginava que se daria melhor na vida se fosse homem. Mas ao perceber que os rapazes enfrentavam grandes dificuldades quando chegavam à vida adulta, passou a considerar que o melhor era ser mulher.
A grande dúvida era sobre como os rapazes se virariam em Diamantina... Se completassem os estudos podiam tentar a vida nas cidades mais promissoras, como era o caso de São Paulo. Mas sem estudos...
(...)
Lucas era outro primo que passava pela mesma situação...
Seu Alexandre sempre comentava com a filha que em Diamantina e na região as famílias não tinham o hábito de colocar os filhos para trabalhar... Naquela localidade a tradição era pensar que o trabalho é desonroso... Isso era uma herança dos tempos de escravidão. Dessa forma, onde havia escravos eram eles que trabalhavam.
O pai explicava-lhe que (certamente) onde não havia escravos o trabalho era considerado honroso... Ele costumava dizer que os mais velhos da família não permitiam que seus filhos carregassem embrulhos pelas ruas porque tinham a “intenção de fazê-los doutores”.
Essas considerações levaram Helena a concluir que os primos ainda enfrentariam muitos problemas.
(...)
O retorno de João Antônio deixou Dindinha feliz... As preocupações que incomodavam a pequena Helena não faziam parte de suas reflexões.
Toda família se reuniu na chácara para jantar e comemorar o aniversário de Dindinha... Esse tipo de encontro tornara-se cada vez mais rara, mas, de certo modo, a oportunidade era festiva.
Um de seus afilhados era Sérgio, que acabara de chegar de Ouro Preto... O moço estava de férias e exibia “ares de doutor”... Talvez por isso tivesse achado que devia propor um brinde e um discurso em homenagem à aniversariante.
O rapaz levantou-se e logo todos bateram palmas... Alguém anunciou que “Sérgio vai falar!” e assim o silêncio dominou o ambiente. Helena e as primas aguardaram ansiosas as palavras.
Sérgio começou com um “Meus amigos! Levanto meu copo para brindar minha boa e digna madrinha, que está preparando...”
Mas de repente pareceu faltaram-lhes palavras...
Ele repetiu o final da frase outras duas vezes. Todos notaram que o discurso travou no “está preparando...” Antes que dissesse a mesma coisa novamente, João Antônio emendou um “Para ir para o Céu!”
Todos acharam graça... A gargalhada foi geral. O discurso se encerrou no mesmo instante.
Leia: Minha Vida de Menina. Companhia das Letras.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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