quinta-feira, 23 de março de 2017

“A Volta ao Mundo em Oitenta Dias”, de Júlio Verne – da “Coleção eu Leio” – previsão de avanço rápido após deixarem as montanhas; estranho cortejo brâmane no meio da floresta; a apavorante deusa Kali; olhar ocidental, luxo, degradação, medo e mistério

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2017/03/a-volta-ao-mundo-em-oitenta-dias-de_20.html antes de ler esta postagem:

Passaram a noite no bangalô abandonado.
No dia seguinte deram prosseguimento à viagem. Às seis horas da manhã o parse estava otimista quanto à marcha que realizariam. Calculava que chegariam a Allahabad durante a noite. Fogg teria motivos para agradecê-lo porque no final das contas teria perdido pouco tempo.
(...)
Depois de deixar a cadeia de montanhas para trás, o elefante seguiu ainda mais rápido. O guia sabia que devia evitar os povoados e é por isso que ao saber que se aproximavam da aldeia de Kallenger conduziu Kiuni a certa distância do Cani, importante rio para os habitantes locais.
A segurança das campinas desertas enchia o parse de confiança. Estavam num ponto em que se notavam as depressões que levavam as águas de riachos a rios que abastecem o Ganges.
Uns vinte quilômetros em direção ao nordeste separavam os viajantes de seu destino. Pararam para descansar e aproveitaram para se alimentar das bananeiras que marcavam a paisagem.
Duas horas depois o guia anunciou a partida. Pelos motivos que já conhecemos, optou pela travessia de uma densa floresta.
A viagem seguiu tranquila até as quatro horas da tarde. Neste momento Kiuni parou. O experiente parse viu que o animal estava inquieto e o general Cromarty foi o primeiro a querer saber o que estava ocorrendo.
O parse respondeu que não sabia... Então procurou captar algum sinal da floresta... Ouviu um murmúrio que aos poucos tornou-se audível para todos. Era muito estranho! Dava para entender que uma multidão caminhava na direção em que eles se encontravam. Pelo visto vinham numa cantoria estranha embalada por instrumentos de cobre.
(...)
O jovem guia desceu do elefante e o amarrou numa árvore... Escondeu-se numa folhagem para conferir o que estava acontecendo. Voltou-se para seus três passageiros e explicou que avistara uma procissão brâmane. Pediu que eles se mantivessem acomodados sobre o elefante, que foi levado para um local mais escondido. De modo algum podiam ser vistos pelos fanáticos.
O rapaz se preparara para uma eventual fuga, mas não acreditava que isso seria necessário porque estavam bem camuflados. Aos poucos o vozerio aumentou e os cânticos encheram todo o ambiente. Tambores e instrumentos de metal ditavam um ritmo monótono. Fogg, Passepartout e o general puderam ver a tudo bem detalhadamente porque estavam a apenas cinquenta passos do cenário principal.
(...)
À frente estavam sacerdotes com indumentária específica e cheia de ornamentos (usavam longas batas e mitras). Pessoas comuns faziam uma “reza fúnebre” que prosseguia de acordo com a sinalização dos instrumentos sonoros (tantãs e címbalos).
Na sequência da procissão, uma plataforma de madeira era puxada por zebus. Sobre esses animais, os fiéis haviam colocado ricas capas. A carroça tinha rodas imensas, cujos raios e eixos lembravam “serpentes entrelaçadas”.
O carro levava a estátua de uma deusa de imagem assustadora. Além dos quatro braços, ela apresentava “olhos arregalados, cabelos revoltos, língua pendente e lábios exageradamente tingidos”.
Para completar a visão apavorante, o pescoço do ídolo estava “ornado” com um “colar de cabeças mortas”, e seu cinturão exibia “mãos decepadas”. Abaixo de seus pés havia a imagem de um gigante sem cabeça.
Cromarty reconheceu no mesmo instante e explicou que aquela era a deusa Kali... Emendou que ela era reconhecida como “deusa do amor e da morte”. Passepartout comentou que fazia sentido ela ser adorada como deusa da morte, mas não admitia que ela pudesse representar o amor porque era simplesmente horrorosa.
O parse sinalizou para que parassem de falar no mesmo instante, pois era evidente que corriam risco. Silenciaram e viram que ao redor do carro que conduzia a estátua de Kali seguiam faquires.
Aqueles tipos eram velhos de aspecto medonho. Traziam o corpo coberto por uma tinta ocre e por perfurações de onde saíam gotas de sangue. Sabia-se que nas maiores cerimônias eles se atiravam sob as rodas dos carros.
Mais atrás apareceram outros brâmanes que portavam vistosos trajes orientais. Eles conduziam uma jovem que sequer conseguia manter-se de pé. Verne destaca que sua pele era branca como a das europeias. Os fanáticos a enfeitaram com várias joias distribuídas pelas mãos, braços, orelhas e pescoço. A mulher trajava rico vestido coberto por uma túnica em que se notavam filetes de ouro.
Apesar da condição degradante em que era puxada pelos fanáticos, seu aspecto era encantador. Logo mais vinham brutamontes armados com sabres e pistolas. Esses guardas escoltavam um fenomenal palanquim que transportava o cadáver de um rajá. O turbante e os finos trajes (ornados com pérolas, ouro e diamantes) denunciavam a condição do velho, que tinha as “armas de príncipe indiano” acomodadas junto ao cinto de cachemira.
O cortejo era encerrado por músicos e inúmeros fanáticos que soltavam gritos estridentes.
Leia: A Volta ao Mundo em Oitenta Dias – Coleção “Eu Leio”. Editora Ática.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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