sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Ron Mueck – exposição na Pinacoteca do Estado de São Paulo – considerações II; interpretação livre

Talvez seja interessante retomar http://aulasprofgilberto.blogspot.com.br/2015/02/ron-mueck-exposicao-na-pinacoteca-do.html antes de ler esta postagem:

Cada um faz a própria “viagem”... Permitam-me a proposta que segue:

Você pode percorrer a exposição como se ela representasse a “trajetória de um sonho”.
A primeira peça é o autorretrato adormecido (Mask II)... Ali está o “artista num profundo sono”... De certo modo isso reforça a proposta.
(...)
As peças seguintes poderiam ser entendidas como “cenas do sonho” (ou de uma série de fragmentos de sonhos).
Escrever sobre cada uma delas é tentador...
Há sempre os riscos de cometermos equívocos gritantes... Você entende, eles fazem parte.
(...)
Tudo é possível num sonho...
Vemos um tipo acomodado numa boia de piscina (À deriva)...
Por qual razão a peça é a única que está afixada na parede?
Um colega a definiu como um “crucifixo moderno”... E não é que pode ser isso mesmo?
Essa interpretação (somada ao título) nos leva a tantas outras reflexões...

O garoto (a peça de pouco mais de 60 centímetros é chamada de Juventude) observa o machucado grave (um corte produzido por facada?)... Sua roupa tem marca do sangue... Isso nos leva a imaginar um trauma recente, mas a sua fisionomia não é a de quem se mostra preocupado com o ferimento, a perda de sangue e suas consequências.
(...)
Há dois casais – o jovem (Jovem casal) e o “veterano” (Casal sob um guarda-sol)... Será por acaso que o “veterano” (acomodado sob o guarda-sol) tenha sido instalado exatamente no último ambiente da exposição?
O “casal jovem”, representado em escala menor, poderia significar o “passado” do “casal veterano”, representado em escala bem maior?
(...)
O que dizer da velha camponesa (bem pode ser a representação de uma camponesa de tempos antigos) que carrega gravetos, ou do homem no barco (Homem num barco)?
Os dois estão nus...
Não é algo bem típico de sonhos?
(...)
Vemos a camponesa e podemos pensar na condição da mulher e sua labuta pela sobrevivência dela e a de seus agregados... Seria muita pretensão afirmar que a imagem nos remete à figura da mãe? Aqueles gravetos trarão calor, possibilitarão luminosidade ao lar, e servirão para preparar a alimentação dos filhos...
A frágil e imensa embarcação não é conduzida pelo homem. Ele não tem controle sobre ela e não demonstra condições de controlá-la.
Talvez pudéssemos pensar o barco como uma metáfora da própria vida...
(...)
Há uma “mãe moderna” que carrega junto ao peito (que ampara e alimenta) o filho recém-nascido. Sob o casaco ela o aquece... Suas mãos estão ocupadas com as compras (o título da obra é Mulher com compras)... Seu olhar se dirige ao que está à frente.
Podemos dizer, a partir da proposta e da ilação anterior – sobre os casais -, que aqui haveria uma inversão... É que o elemento “do passado” (Mulher com galhos) está representado em escala muito maior do que a “mãe moderna”.
(...)
Os entendidos dizem que a escultura do imenso frango “abatido e limpo” é referência à “gripe aviária” que ressurge com certa constância nos noticiários...
O que dizer desta Natureza morta?
Em primeiro lugar, que é perfeita em todos os seus detalhes... “Ultrarrealista”, como os entendidos também dizem...
Como ela se “encaixaria” nesta maluca interpretação?
Algo tão antigo... No mínimo poderíamos sustentar que as epidemias assustam. É sempre chocante (um pesadelo mesmo) saber que alguém morreu vitimado pelo contágio de uma variação da gripe...
As pessoas custam a admitir que o frango (delicada ave há tanto tempo domesticada pelos humanos) pode transmitir a doença...
O frango “abatido e limpo” de Mueck está pendurado para a apreciação de todos... Talvez o seu tamanho gigantesco e “ultra desproporcional” (perfeitinho até no corte da lâmina que atingiu o seu pescoço) tenha a ver com a grandiosidade do “perigo invisível” que ele representa.

P.S: O último dia para visitação é 22/fevereiro...
Um abraço,
Prof.Gilberto

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