terça-feira, 9 de julho de 2019

“Os Direitos Humanos”, de Ari Herculano de Souza – depoimentos de dois trabalhadores sem-terra engajados no movimento pela Reforma Agrária ao jornal “Mundo Jovem” de julho de 1986; críticas ao sistema e defesa de um modelo coletivo e solidário; ponderações do autor a respeito do direito à propriedade; dados sobre a distribuição das propriedades rurais durante a década de 1980

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/07/os-direitos-humanos-de-ari-herculano-de_8.html antes de ler esta postagem:

O fragmento do jornal “Mundo Jovem” do mês de julho de 1986 selecionado para “Os Direitos Humanos” apresenta trechos de depoimentos de dois militantes do MST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra). O periódico de Porto Alegre destacava matéria intitulada “Colonos acampados dizem por que querem terra”.
Essa nossa postagem apresenta os dois registros e as considerações do autor a respeito do “Direito à Propriedade”.

Depoimento de A. J. Weber, de Sarandi, RS:

                   “Os donos da terra somos nós, só que os grandes não reconhecem isso. Estes, além de roubar a terra matando posseiros, ainda fazem as leis para proteger o seu latifúndio e dificultar que a gente consiga um pedaço de terra. A situação nos obriga a ocupar a terra, já que os grandes não reconhecem a terra como direito de todos. Reforma agrária não é somente acesso a um pedaço de terra, mas também condições para recuperar e plantar a terra, como sementes, adubos, armazéns, preço justo, como também condições de saúde, educação, transporte. Nós queremos uma área coletiva para manter a união e a força do grupo na luta por uma sociedade diferente desta que está aí”.

Depoimento de V. Vedovato, de Ronda Alta, RS:

                   “Antes de acampar, eu analisei a fundo a minha vida, o meu futuro e cheguei à conclusão de que não tinha perspectivas senão continuar sendo explorado trabalhando para os outros. Entrei para o movimento dos sem-terra e o acampamento não por brincadeira. Foi o sistema capitalista, a exploração dos latifundiários, a política agrícola mentirosa e o descaso do governo para com os agricultores que me trouxe para cá. Aqui estou para lutar por uma terra coletiva, pois entendo ser o único jeito de combater esta estrutura suja que está aí”.


(...)
Os depoimentos destacam e apoiam a ocupação de terras por um movimento organizado como instrumento de luta pela Reforma Agrária. Os dois trabalhadores se mostram convencidos dos ideais coletivos dos sem-terra, entendem que, por causa do sistema vigente, os mais ricos acumulam posses de grandes extensões, as legitimam e oprimem os que desejam a partilha.
As falas atacam o capitalismo, a exploração dos latifundiários e a falta de políticas agrárias de socorro aos pequenos produtores. Os ativistas entendem também que o seu movimento é legítimo e que se baseia num modelo solidário. Por isso desejam a coletivização da terra para “combater esta estrutura suja que está aí”.
(...)
Ari Herculano de Souza ressalta que o direito à propriedade sempre foi dos mais polêmicos. Destaca que há os que sempre defenderam o direito aos grandes latifúndios para satisfazer seu desmedido desejo de posses e “ganância sem limites”, daí resultando a exploração dos pequenos camponeses. Em oposição, muitos teóricos propuseram “o fim da propriedade privada dos meios de produção, como única forma de acabar com a exploração do trabalho alheio”. Como vimos, os depoimentos dos ativistas se apoiam nessa visão.
O autor lembra que as leis e a mentalidade vigentes “defendem a propriedade como um direito do indivíduo”. Todavia sugere que o direito à propriedade:

                   * deve ser limitado pela Lei e pela Justiça, possibilitando certa igualdade;
                   * supõe o respeito aos interesses coletivos;
                   * deve visar o bem social; e
                   * tem que se fundamentar numa política de uso do solo rural e urbano.

Justificando o anteriormente exposto, o texto traz alguns dados da década de 1980 referentes à distribuição de terras em nosso país mostrando que ela não era justa e tampouco equitativa:

                   “42% da área total das propriedades rurais são latifúndios (com mais de 1000 ha) e pertencem a apenas 1% dos proprietários rurais, enquanto 3% da área total das propriedades rurais são minifúndios (com menos de 10 ha) e pertencem a 52% dos proprietários rurais”.

Ari Herculano de Souza destaca ainda que, má distribuição da propriedade à parte, havia questões sociais que mereciam ser avaliadas e solucionadas: a das inúmeras famílias que não possuíam nenhuma terra e ansiavam por um pequeno lote para retirarem dele o seu sustento, e a dos que trabalhavam na terra “em condições desumanas”, os boias-frias”.
Leia: Os Direitos Humanos. Editora Do Brasil.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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