A quarta parte do livro é dedicada às considerações sobre “O que fere os Direitos Humanos”.
Na abertura lemos um recorte de texto de René Cassin*:
“Se confrontarmos as realidades presentes com o ideal, veremos que ele está longe. Nenhum país, mesmo o mais desenvolvido, pode gabar-se de satisfazer todas as exigências da Declaração dos Direitos do Homem. Há violações repetidas do direito à vida, massacres impunes, duras condições para a mulher, fome que tortura milhões de seres, sobrevivências da escravidão, ausência ou insuficiência de instrução, atentados à liberdade de consciência, ou de opinião e de expressão, atos graves de discriminação racial, arbitrariedades de administrações; de nada serviria ocultar esses fatos”.
* 1887-1976; jurista francês, um dos principais relatores da Declaração dos Direitos Humanos; Prêmio Nobel da Paz – 1968.
(...)
Até
aqui vimos que as reflexões sobre os Direitos Humanos escancaram o quanto eles
são desrespeitados pelas sociedades. E é bem como René Cassin afirmou: mesmo
nos países mais desenvolvidos os direitos fundamentais sofrem violações.
Num trecho “quase poético”, Ari Herculano de Souza
destaca que:
“O olhar perdido do
indigente na calçada não é outro senão o da descrença de que algum dia ele
venha a ser olhado como ser humano. O olhar esperto e vivo do menino de rua – o
“menor abandonado” – não é outra coisa senão a certeza de que a vida para ele
tem que se fundar na artimanha, no jeito, na malandragem, na esperteza e não na
realização de seus direitos básicos. Ele já descobriu que a sociedade está lhe
negando esses direitos... E ele provavelmente vai ter que passar boa parte de
sua vida – senão toda ela – sem ter que exigir e satisfazer de modo digno seus
direitos de pessoa”.
A
reflexão sobre a temática dos Direitos Humanos nos leva a perguntarmos sobre
quais são os principais obstáculos para a realização dos direitos mais básicos...
É mesmo o propósito da quarta parte do livro apresentar
algumas respostas para essa questão: O que fere os Direitos Humanos?
* As desigualdades que se baseiam “no
individualismo, na ganância e no egoísmo”. Isso faz com que as pessoas deixem
de enxergar aos demais como “irmãos e parceiros do mesmo ato de existir, filhos
da mesma sociedade”. Disso resulta que alguns poucos possuem muito enquanto que
boa parte da sociedade nada tem... Muitos são os que não conseguem “enxergar
além de seus umbigos, não conseguem estender as mãos além dos seus bolsos, não
são capazes de fazerem seus pensamentos penetrarem na solidão alheia”;
* As discriminações, que
classificam e dividem as pessoas levando em conta “o sexo, a raça, a
nacionalidade, a cor, o credo, a convicção política, o gosto, etc”. Em nossa
sociedade, o mesmo racismo que justificou “a escravidão negra, a segregação do
índio e a matança de povos”, ainda provoca crimes horrendos;
* O
autoritarismo político
e machista,
que sufoca as liberdades individuais. Direitos são sufocados por regimes arbitrários
e patrocinadores da tortura. Evidentemente, num contexto autoritário não há a
menor possibilidade de crítica aos dirigentes. As leis vigentes passam a legitimar
essa condição! As relações trabalhistas se tornam amplamente desfavoráveis aos
assalariados, além disso, onde o machismo impera não há a menor possibilidade
do exercício de igualdade... O autoritarismo passa a ser visto com naturalidade
e nas famílias as relações são de dominação. Por extensão aceita-se que a
formação escolar se fundamente nos mesmos critérios;
* A violência característica da
competividade exacerbada incentivada na sociedade e que afeta todos os setores:
desde as relações econômicas às disputas esportivas; dos menores infratores
(trombadinhas) aos ricos patrões “que espoliam os funcionários”; desde os
assaltantes até os policiais, às vezes vistos como protetores da sociedade, e
outras como agentes da violência;
* A corrupção que desvia
os recursos que deviam ser revertidos para obras e benefícios que contemplem o
bem-estar dos menos favorecidos;
* A
impunidade, resultado de uma
sociedade injusta, que permite que os mais ricos se tornem ainda mais poderosos
às custas da exploração da gente pobre. Assassinos e ladrões comuns deixam de
ser julgados, e o mesmo ocorre com “os que roubam do povo, aqueles que tomam
atitudes irresponsáveis de governar para a miséria, aqueles que nada fazem para
administrar visando o bem-estar da população”... Ninguém é julgado “pelas
crianças que morrem de fome ou pelos indigentes que morrem de frio nas
madrugadas das grandes cidades”;
* A indiferença e a passividade de todos os que se acomodam em sua condição satisfatória sem
se importarem com as agressões diárias aos direitos fundamentais e se alienam “da
luta alheia” sem perceber que a defesa dos direitos humanos é “luta coletiva”.
Continua em https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2019/07/os-direitos-humanos-de-ari-herculano-de_2.html
Leia: Os
Direitos Humanos. Editora Do Brasil.
Um abraço,
Prof.Gilberto