sábado, 12 de janeiro de 2019

“Mayombe”, de Pepetela – início do capítulo II; a base guerrilheira enraizou-se no Mayombe; as adversidades e a doutrina; de Prometeu e Ogum

Talvez seja interessante retomar https://aulasprofgilberto.blogspot.com/2018/07/mayombe-de-pepetela-sem-medo-faz-relato.html antes de ler esta postagem:

Nos dizeres do próprio autor, é como se a floresta tivesse parido a guerrilha.

Logo no começo da segunda parte temos uma descrição da área onde estava localizada a Base guerrilheira no Mayombe.
Percebemos que o relato só pode ser resultado da vivência de homens (tipos como o Comissário, o Chefe de Operações, Sem Medo, Pepetela ou qualquer outro com um mínimo de embasamento teórico) decididos a se misturarem à mata para nela se camuflar e, a partir dela, organizar missões com o objetivo de transformar a sociedade.
As palavras definem um panorama que em momento algum sugere desvinculação entre floresta e o que é obra dos rebeldes. Assim, o Mayombe parece ter aceitado (e incorporado) os guerrilheiros e sua agressividade desde que estes derrubaram parte das árvores para abrir a clareira onde estruturaram os alojamentos e outros componentes da Base.
A vasta floresta os protegeu... Nenhum tuga em sobrevoo conseguia visualizar a Base porque os mais altos ramos e folhagens formaram a espessa abóboda que a mantinha escondida.
(...)
Toras, cipós e capim da floresta incorporaram-se às cabanas...
As paredes dos alojamentos erguidos com essa vegetação criaram raízes... Até o forno moldado para assar o pão passou a integrar naturalmente a paisagem.
Os guerrilheiros também se sentiam parte do Mayombe e podiam entender que sua relação com a floresta se explicava a partir de conceitos da “doutrina”. Dessa maneira, ao notar que estavam sem alimentos, ela forneceu-lhes as “comunas”, que eram “frutas secas, grandes amêndoas, cujo caroço era partido à faca e se comia natural ou assado”.
As “comunas” eram ricas em óleo e proteína e exatamente por proporcionarem energia é que os guerrilheiros lhes davam esse nome. O local onde as guardavam e assavam passou a ser chamado de “Casa do Partido”.
A floresta gerou as “comunas”, mas o grupamento guerrilheiro só chegou a elas porque o “grupamento de gorilas” reunia-se nas proximidades da Base para se alimentar e abandonavam os caroços partidos...
Para não fugir dos conceitos da “doutrina”, não estaria aí a indicação do “Comunismo” na selva?
O Mayombe parecia “socorrer” os homens “agrilhoados” (como o Prometeu da Mitologia Grega). No caso, os guerrilheiros estavam como que “agrilhoados” à mata. A ração obtida com as “comunas” era “o seu tributo à coragem dos que a desafiavam”. O “Comunismo” os nutria.
(...)
Os homens se sentiam presos ao Mayombe como se fossem também eles seus elementos naturais.
As feras e as montanhas impenetráveis provocavam medo... A cada jornada, novas ameaças, lodaçais, quedas de árvores e escuridão...
Os sons da noite e os acidentes escondidos pelas folhagens dos caminhos eram ameaçadores, todavia os rebeldes insistiam em seus avanços e operações militares.
Se os guerrilheiros eram os homens “agrilhoados” à floresta, o Mayombe era Zeus que os havia punido. Dia após dia deviam cumprir a sina do recomeço, do avanço e do fracasso.
Mas era para isso que eles estavam ali...
Sentiam que deviam levar o “fogo” aos demais homens e para isso teriam de passar por todas as atribulações da missão guerrilheira.
O papel do “Prometeu africano” era o do herói africano: Ogum.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto

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