Nos dizeres do próprio autor, é como se a floresta tivesse parido a guerrilha.
Logo no começo da segunda parte temos uma descrição da área onde estava localizada a Base guerrilheira no Mayombe.
Percebemos que o relato só pode ser resultado da vivência de homens (tipos como o Comissário, o Chefe de Operações, Sem Medo, Pepetela ou qualquer outro com um mínimo de embasamento teórico) decididos a se misturarem à mata para nela se camuflar e, a partir dela, organizar missões com o objetivo de transformar a sociedade.
As palavras definem um panorama que em momento algum sugere desvinculação entre floresta e o que é obra dos rebeldes. Assim, o Mayombe parece ter aceitado (e incorporado) os guerrilheiros e sua agressividade desde que estes derrubaram parte das árvores para abrir a clareira onde estruturaram os alojamentos e outros componentes da Base.
A vasta floresta os protegeu... Nenhum tuga em sobrevoo conseguia visualizar a Base porque os mais altos ramos e folhagens formaram a espessa abóboda que a mantinha escondida.
(...)
As paredes dos
alojamentos erguidos com essa vegetação criaram raízes... Até o forno moldado
para assar o pão passou a integrar naturalmente a paisagem.
Os guerrilheiros
também se sentiam parte do Mayombe e podiam entender que sua relação com a
floresta se explicava a partir de conceitos da “doutrina”. Dessa maneira, ao
notar que estavam sem alimentos, ela forneceu-lhes as “comunas”, que eram
“frutas secas, grandes amêndoas, cujo caroço era partido à faca e se comia
natural ou assado”.
As “comunas” eram
ricas em óleo e proteína e exatamente por proporcionarem energia é que os
guerrilheiros lhes davam esse nome. O local onde as guardavam e assavam passou
a ser chamado de “Casa do Partido”.
A floresta gerou as
“comunas”, mas o grupamento guerrilheiro só chegou a elas porque o “grupamento
de gorilas” reunia-se nas proximidades da Base para se alimentar e abandonavam
os caroços partidos...
Para
não fugir dos conceitos da “doutrina”, não estaria aí a indicação do
“Comunismo” na selva?
O Mayombe parecia “socorrer” os homens “agrilhoados” (como o Prometeu da
Mitologia Grega). No caso, os guerrilheiros estavam como que “agrilhoados” à
mata. A ração obtida com as “comunas” era “o seu tributo à coragem dos que a
desafiavam”. O “Comunismo” os nutria.
(...)
Os homens se sentiam presos ao Mayombe como se fossem também eles seus
elementos naturais.
As feras e as montanhas impenetráveis provocavam
medo... A cada jornada, novas ameaças, lodaçais, quedas de árvores e
escuridão...
Os sons da noite e os
acidentes escondidos pelas folhagens dos caminhos eram ameaçadores, todavia os
rebeldes insistiam em seus avanços e operações militares.
Se os guerrilheiros eram os homens “agrilhoados” à floresta, o Mayombe
era Zeus que os havia punido. Dia após dia deviam cumprir a sina do recomeço,
do avanço e do fracasso.
Mas
era para isso que eles estavam ali...
Sentiam que deviam
levar o “fogo” aos demais homens e para isso teriam de passar por todas as
atribulações da missão guerrilheira.
O
papel do “Prometeu africano” era o do herói africano: Ogum.
Leia: Mayombe. Editora Leya.
Um abraço,
Prof.Gilberto